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sexta-feira, 1 de dezembro de 1995

Os caiuás entre a cruz e o suicídio

Missionários garantem fazer mais pelos índios do que se imagina

Por Danielle Franco, de Dourados (MS)

Maria Inês Noronha
Os índios recebem assistência médica e espiritual dos missionários

Um estranho fenômeno social verificado na reserva indígena caiuá, localizada na cidade de Dourados, distante 210 quilômetros de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, pôs em cheque a presença dos missionários na região. A informação sobre o crescimento no número de suicídios entre os jovens da tribo, dada em tom de alarme por alguns jornais, veio acompanhada de uma suspeita: a de que os evangélicos estariam aculturando os índios e provocando neles um enorme sentimento de culpa depois de suas conversões ao Evangelho de Jesus Cristo. A explicação sensacionalista serve como camuflagem para o problema real. Sem dinheiro e emprego, os índios não-convertidos mergulham no alcoolismo e na depressão suicida. De origem nômade, os caiuás, agora confinados na reserva, têm dificuldades para se adaptar a uma economia voltada para o plantio e a criação de animais. Até a Funai tem se manifestado contra a presença de missionários nas tribos, a ponto de criar instruções normativas que impedem a entrada de evangélicos nas comunidades mais isoladas. Para quem vive nas reservas a realidade é outra. De acordo com o vice-capitão Narciso Daniel, que é evangélico, todos os jovens que se mataram estavam envolvidos com alcoolismo e sem emprego fixo. Na opinião dele, essa desesperança é justamente a falta de intimidade com a Palavra de Deus. "Quando o índio se converte, ele pára de beber e de fumar, se volta para a família", defende. "O Evangelho não tira a cultura do índio. Ele sabe guardar o que é bom."

O professor de ensino religioso para crianças da aldeia, Isaque de Souza, compartilha da opinião. Ele conta que já passou por esse problema. "Eu também pensei em me matar quando era mais novo. Me sentia muito mal porque, além de pobre, era índio, e a gente se sente muito discriminado por isso. Quando me converti, entendi o quanto que eu era especial para Deus. Então, resolvi estudar e ser missionário. Os índios precisam, e muito, de ser evangelizados. A mensagem do Evangelho não leva o índio ao suicídio. A ideia surge justamente pela falta dele", conclui.

Na realidade: o maior desafio dos missionários tem sido acabar com a crescente onda de mortes, proporcionando a eles uma nova opção de vida. O trabalho da Missão Caiuá, que fica ao lado da reserva, não é novo. Ela foi fundada no início do século pelo missionário americano Albert Maxwel, e há 11 anos é dirigida pelo pastor Benjamim Bernardes, da Igreja Presbiteriana do Brasil, que mora na reserva com a mulher e duas filhas.

Maria Inês Noronha
A educação é uma das armas contra o desemprego na tribo

O pastor Benjamin explica que o atendimento à tribo nas áreas de saúde, educação, cultura e, principalmente, evangelização, fez com que os índios caiuás ficassem conhecidos como "a tribo que não morreu". Isso porque quando a missão iniciou seu trabalho na reserva, a tribo era formada por quatro mil pessoas. Hoje, devido a todos os trabalhos desenvolvidos pelos missionários, o número cresceu para nove mil. Mesmo diante desses resultados, os missionários têm sido impedidos pela Funai de entrar nas reservas mais isoladas. O argumento para o impedimento é sempre o mesmo: a destruição da cultura através da evangelização.

Um exemplo de que o evangelho não destrói a cultura indígena é o trabalho desenvolvido pelo caiuá Dorival da Silva. Formado pela escola bíblica da Missão Caiuá, ele dirige cultos evangelísticos dentro da aldeia. "Seria bom se mais pessoas viessem para me ajudar na evangelização. Esse trabalho é muito importante. A conversão afasta o índio da bebida, que provoca muitas brigas nas famílias. Outro dia, um índio chegou em casa bêbado, brigou com a mulher e tocou fogo na sua casa. O índio que é crente não faz isso, porque ele sabe que não pode beber", esclarece.

Maria Inês Noronha
Família do missionário caiuá Dorival da Silva: harmonia entre o Evangelho e a cultura indigena

Funai restringe trabalhos missionários nas reservas

As relações entre as missões evangélicas e a Funai sempre foram delicadas. Mas isso se tornou mais evidente a partir dc 1994, quando o órgão publicou no Diário Oficial do dia 8 de abril duas instruções normativas, onde vários artigos restringem ou vetam ações missionárias nas reservas. Uma das decisões que mais tem preocupado as missões está na norma de instrução número 2, artigo 7, capítulo IX, que diz: "O material didático produzido pela missão/instituição religiosa deverá ser submetido ao departamento de educação e a utilização dos materiais bilíngües para veiculação de textos bíblicos nas áreas indígenas, não serão autorizados".

Trabalhando na tradução do Novo Testamento para a língua caiuá desde 1969, a antropóloga cristã americana Loraine Irene Bridgman decidiu conhecer e estudar a cultura indígena por ter a convicção de que a mensagem do Evangelho deve ser levada a todos os povos. Atualmente sem licença da Funai para entrar nas reservas, ela está morando na Missão Caiuá e, com a ajuda do índio Xisto Sanches, está traduzindo o livro de Salmos. 'Eu sei que o mundo não quer que o Evangelho chegue a nenhum lugar. Então, se as pessoas não compreendem a importância desse ministério, elas não deveriam impedir o trabalho. Não é assegurado por lei a liberdade de religião?", questiona. Em relação às críticas de que o trabalho missionário acultura os índios, Loraine é categórica: "A conversão ao cristianismo gera transformação, mas para uma vida nova. Isso não significa que você vai deixar de ser você mesmo. Eu não deixei de ser americana, portanto, o índio não deixará de ser índio", argumenta.

Atualmente, a maior preocupação da antropóloga é dar continuidade ao trabalho de tradução da Bíblia. Com 69 anos, teme não ver seu projeto terminado, principalmente depois das normas impostas pela Funai. "Estou orando para que Deus levante pessoas comprometidas com o trabalho missionário. Os povos indígenas também precisam de salvação", alerta.

Surpreso também com essa iniciativa, Carlos Terena, que atualmente trabalha no Departamento de Comunicação da Funai, desabafa: "Quando me converti, passei a ter amor próprio e a me reconhecer como um povo diferente, como Terena. índios, como vocês nos chamam. Senti uma razão maior para viver até quando losko'oviti me chamar". Sua preocupação vai mais além. "Onde está o nosso direito universal como seres humanos, criados à imagem e semelhança de Deus, com a liberdade de conhecer a verdade em nossa língua? Aceitarmos ou não, é outra questão. Ninguém tem o direito de nos restringir, patrulhar ou decidir o que é melhor para nós através de normas de gabinete. Hoje, o governo oficializa essa situação conosco. Quem sabe não é um precedente para que se faça isso com os evangélicos não-índios amanhã? Até este momento, as missão que sempre tiveram um trabalho sério, respeitado e organizado são as que estão sendo atingidas", denuncia.

Procurado pela revista para esclarecer essa determinação, o presidente da Funai, Márcio Santilli, não respondeu ao fax que foi enviado.


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