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segunda-feira, 18 de março de 1996

Exército de solidariedade

Fábrica de Esperança 'invade' favelas com projeto social e espiritual

Por Danielle Franco

Fotos de Frederico Mendes

Voluntários de diversos estados do Brasil dedicaram o período de férias à participação no projeto Exército da Esperança

Nem bem começou o ano e duas favelas da cidade do Rio de Janeiro, as de Parada de Lucas e do Morro Santa Marta, em Botafogo, já foram invadidas por uma nova operação do Exército. Mas desta vez não é uma nova mobilização das Forças Armadas. O contingente que entrou em ação foi de voluntários que participaram do novo 'projeto desenvolvido pela Vinde - Visão Nacional de Evangelização - em parceria com a Fábrica de Esperança. A tropa do Exército da Esperança - 22 homens e mulheres - foi dividida em duas turmas, em janeiro e fevereiro, com o objetivo de formar missionários para o desenvolvimento de trabalhos evangelísticos em comunidades carentes, principalmente nas favelas.

O projeto, coordenado por André Fernandes, surgiu numa conversa com o reverendo Caio Fábio D'Araújo Filho, presidente da Vinde, sobre a possibilidade de se formar um exército de cristãos que, no período de férias, visitasse favelas não só para pregar, mas também para praticar os ensinamentos deixados por Jesus Cristo no que diz respeito à ação social. Os pioneiros vieram de vários estados do Brasil: São Paulo, Bahia, Ceará, Santa Catarina, Paraná, Goiás, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Eles se inscreveram usando os folders distribuidos nos congressos da Vinde e através do programa Pare & Pense. Todos os que preencheram os requisitos necessários - eram maiores de idade, evangélicos, receberam carta de recomendação de suas lideranças e tinham muita disposição - foram selecionados.

O trabalho social abriu
espaço para a evangelização
Dentistas fizeram aplicação de
flúor e orientaram as crianças

Depois de participar de palestras e aulas teóricas, os voluntários se hospedaram na casa de Angelita e José Carlos Aleixo, membros da Igreja Obra em Restauração, localizada na entrada da favela de Parada de Lucas. "A comunidade acolhe muito bem essas iniciativas porque os moradores não recebem nenhum tipo de assistência", explicou Angelica. "Com a convivência, acabam pedindo oração e muitos se convertem." Feliz por ter participado do projeto, o dentista cearense Antônio Sérgio Teixeira de Menezes, 28 anos, falou com empolgação sobre a experiência. "Nós abordamos as pessoas na ruas, visitamos as casas e, através da amizade, levamos a Palavra de Deus. Foi muito edificante", acrescentou.

O pastor Reginaldo Torquato Brandão, que dividiu a coordenação do projeto com André, contou que o trabalho recebeu apoio da associação das igrejas evangélicas locais, que cedeu dois horários diários na rádio comunitária. "O espaço foi utilizado para pregar a Palavra e prestar serviços de utilidade pública", disse. O pastor Aser Fernandes, que liderou um dos grupos, considerou a experiência inesquecível. "Depois do Exército da Esperança, nossas vidas nunca mais serão as mesmas", afirmou.

O projeto foi tão bem-sucedido que os coordenadores pretendem repetir a experiência em julho deste ano e no início de 1997. Se depender desses soldados de Cristo, o Exército da Esperança veio para mudar para melhor a paisagem das favelas do Rio.


Extraído Atitude. Revista Vinde, Rio de Janeiro, ano 1996, a. 1, ed. 5, p. 29, mar. 1996.

sexta-feira, 1 de março de 1996

Os anjos de Fortaleza

Grupo distribui alimentos e prega para desassistidos da capital cearense

Todas as segundas-feiras, o Sopão do Amor sai pelas ruas de Fortaleza

Num ato de fé, Norma Disney Soares Freitas, 60 anos, desafiou o pastor Helnir Cortez, da Igreja Presbiteriana de Aldeota, e as circunstâncias. Ela é a coordenadora do projeto Sopão do Amor que, todas as segundas-feiras, alimenta os "irmãos caídos" em Fortaleza (CE) com dois caldeirões de feijão, macarrão, batata e carne. Esta senhora alegre e bem-disposta não se intimidou com o sombrio diagnóstico de câncer no seio e, na ânsia de servir ao próximo, instou com Deus para que a curasse. Hoje, Norma e os outros integrantes do Sopão distribuem um pouco de solidariedade a desabrigados da cidade.

Há quase três anos, quando assistiu a uma reportagem sobre o projeto Atitude e Solidariedade, que distribui sopa aos mendigos de Niterói (RJ), no programa Pare & Pense, Norma decidiu fazer algo parecido em Fortaleza. Comunicou a idéia ao seu pastor, mas, na ocasião, descobriu que tinha um quisto no seio esquerdo. Na mesa de cirurgia, soube que câncer maligno, felizmente extirpado a tempo. Impossibilitada de se movimentar - ela é canhota -, teve que adiar o sonho, mas seu coração ardia. "A miséria no Nordeste é muito grande. Você anda pelas ruas quase chutando as pessoas, de tantas que há espalhadas pelas calçadas. São famílias inteiras, com crianças muito pequenas, dormindo em cima de papelões", diz.

Muitas famílias sem lugar para morar recebem alimento e oração

A lenta recuperação da cirurgia impacientou Norma, que apelou ao pastor que lhe cedesse a cozinha industrial da igreja. Ele alegou que ela deveria primeiro voltar a movimentar o braço. "Orei a Deus e falei que, se eu conseguisse mexer o braço, dedicaria a minha vida ao Sopáo do Amor. Imediatamente levantei o braço em atitude de louvor a Deus e recuperei toda a mobilidade", relata. Exultante, comunicou a intercenção de Deus ao pastor, que levou o assunto à executiva da igreja. Os voluntários começaram a surgir. "Primeiro uma senhora da igreja veio cozinhar. Em seguida, meu filho Bruno, 25, também quis colaborar na distribuição. O Luís Armando, da cantina, cedeu a caminhonete. Os mercadinhos doavam os legumes", relembra. Depois de nove meses, os donos dos mercadinhos descobriram que o trabalho era realizado por evangélicos e pararam de doar os legumes. Já envolvidos, os membros da igreja assumiram o ministério. As bênçãos, conta Norma, começaram a transbordar. "Uma jovem muito problemática teve um encontro com Cristo e mudou seu comportamento com a família depois que participou da distribuição da sopa", comemora.

O ponto alto do Sopão do Amor, no entanto, não é a comida. A equipe, hoje composta de 15 pessoas, primeiro fala sobre Jesus e ou com os mendigos. Só depois faz pequenos curativos, distribui cobertores, roupas, medicamentos e, claro, o alimento: a sopa, um pão e um copo de água gelada. "O meu sonho é ter um albergue para dar banho, colocar redes para eles dormirem e levá-los sara a igreja", confessa Norma, que já. exporta know-how. "Depois que o programa Aqui Agora, do SBT, nos filmou, uma irmã batista se interessou e está levando o projeto para a igreja dela", orgulha-se.


Extraído Crente que faz. Revista Vinde, Rio de Janeiro, ano 1996, a. 1, ed. 5, p. 51, mar. 1996.

terça-feira, 13 de fevereiro de 1996

De pão também vive o homem

Os cristãos que praticam boas obras por conta própria. Eles não aspiram à fama, tampouco querem reconhecimento público. Suas realizações nao têm apoio oficial e, não raro, são feitas com recursos próprios

Por Carlos Fernandes

Carlos Fernandes

Em todo o Brasil, inúmeros evangélicos têm sido despertados para a necessidade de fazer algo diante da realidade de milhões de pessoas cuja existência o poder público finge ignorar: os chamados excluídos, eufemismo que designa os necessitados, indigentes e abandonados. Nas cidades grandes e do interior inúmeros movimentos são tocados por pessoas cuja motivação é oferecer condições de vida dignas para que a mensagem do Evangelho possa ser recebida. Para essas pessoas, a pregação só se torna legítima quando a mão que leva a Bíblia também serve para amparar.

A solidariedade se manifesta na assistência social, no sustento de pessoas e comunidades, na cooperação com as atividades das igrejas, realização de eventos beneficentes, manutenção de escolas e em várias maneiras em que a fé é expressa na prática de obras e de simples atos de amor. Eles são os discretos que atuam, os anônimos que participam, os heróis do nosso tempo. Ou, simplesmente, são os crentes que fazem.

Carlos Fernandes
Altair instalou uma escola para
crianças faveladas de Duque de Caxias

FORA DO UXO - O engenheiro Altair Cavalcanti Ribeiro, de 38 anos, acredita que a igreja tem sobre si a responsabilidade de intervir nos problemas sociais do nosso país. "Não adianta ficar culpando o governo e não agir", afirma. Com esta motivação, formou um pool de 12 empresas, entre as quais a sua marmoraria. O grupo implantou e sustenta o Jardim Escola Cordeirinho, uma escola maternal e de alfabetização numa das regiões mais miseráveis do estado do Rio de Janeiro: a favela do Lixão, no município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, local onde diariamente centenas de pessoas revolvem montanhas de detritos em busca de restos de comida. A escola funciona na Igreja Presbiteriana Independente, da qual Altair é membro, próxima à favela, e atende 80 crianças, oferecendo ensino básico, educação religiosa, três refeições por dia e uniformes. Também promove passeios e festas para os meninos e meninas que, em sua maioria, só contam com as merendas para se alimentar. Altair acredita que, através das crianças, pode alcançar suas famílias com a mensagem do Evangelho: "Procuramos seguir o que diz a Palavra sobre ensinar às crianças o caminho no qual devem andar, mas, além disso, precisamos dar-lhes condições dignas de vida". Todas as semanas cestas básicas são distribuídas entre os moradores da comunidade. Recentemente, a dona de um centro espírita na favela se converteu ao Evangelho e o transformou no Centro do Espírito Santo, onde atualmente são realizados cultos. Brevemente vai abrigar uma creche. O próximo projeto dessa parceria de empresários é a instalação de um consultório médico-odontológico dentro da favela.

Carlos Fernandes
Carlos Fernandes
O engenheiro José Luiz orienta a
construção de igrejas em Bauru

IGREJAS BOAS E BARATAS -"Qual de vós, pretendendo construir uma torre, não se assenta primeiro para calcular a despesa e verificar se tem meios para a concluir? Para não suceder que, tendo lançado os alicerces e não a podendo acabar, todos os que a virem zombem dele, dizendo: este homem começou a construir e não pôde acabar." Este conselho da Bíblia tem sido seguido pelo engenheiro civil José Luiz Toledo Martins, de 34 anos, casado e pai de dois filhos. Proprietário de uma construtora e de uma empresa de consultoria e assessoria para construção em Bauru, SP, ele observou que as igrejas evangélicas em geral não têm nenhuma noção quando o assunto é construção e obras, e resolveu colocar seus conhecimentos técnicos à disposição dos pastores de sua cidade. José Luiz acha que os evangélicos são mal orientados e acabam desperdiçando dinheiro em obras intermináveis e problemáticas. Ele oferece serviços gratuitos de consultoria, envolvendo projeto, elaboração da planta, cálculos estruturais, relação de material e toda a orientação necessária para a construção ou reforma de templos. Assim, sob a sua direção, várias igrejas têm sido erguidas de maneira rápida e a preço reduzido. Convertido há um ano e meio, José Luiz é membro da Igreja Cristã Renovada e também colaborou na construção de um alojamento para 84 pessoas no centro de recuperação de viciados em drogas Esquadrão da Vida. "Temos que prestar assistência a essas pessoas. Este deve ser nosso propósito", declara o construtor de igrejas.

Carlos Fernandes
Carlos Fernandes
Carentes encontram abrigo e
ouvem a Palavra com o irmã Aracy

CASA, COMIDA E PALAVRA - Uma revelação de Deus lançou Maria Araci da Rosa Paulo no trabalho de assistência a mendigos, desabrigados e pessoas abandonadas. A irmã Araci, como é chamada pelos seus assistidos, conta que teve uma visão em que se encontrava caminhando por uma longa estrada quando surgiu à sua frente uma pessoa maltrapilha que lhe suplicava ajuda. A partir de então, a senhora de 67 anos, Assembléia de Deus e evangélica desde criança, entendeu que sua missão era dar amparo aos miseráveis. Há 17 anos ela começou a construir uma casa de dois andares, onde hoje mora com a família e mais 96 pessoas, que ali encontraram abrigo. "Ser cristão não é só sentar no banco da igreja, não", diz com convicção. O espaço, chamado Casa de Oração, fica no bairro de Beltrão, no município fluminense de Niterói, e tem uma sala onde são realizados três cultos por dia, que contam com a participação dos hóspedes. Entre eles, há desempregados e pessoas que viviam na mais completa indigência. Eles chegam e vão ficando. O andar de cima é repleto de beliches onde dormem os homens - as mulheres ficam em outra parte. Todos tomam café da manhã, almoçam e jantam no local.

Sendo uma mulher pobre, a irmã Araci só encontra uma explicação para o fato de conseguir manter a casa funcionando: "É tudo na base do milagre. Às vezes, aparecem pessoas que fazem doações, Deus multiplica o pouco que temos e dá para todo mundo." Ela não se incomoda em dividir o espaço com desconhecidos: "Deus me mandou fazer isso." Muitos deles se tornaram crentes e ajudam nos trabalhos da casa e na assistência aos outros. "Dentro destes corpos maltratados", diz irmã Araci, "existe uma alma que Jesus quer salvar". Cercada das pessoas.que ali encontraram ajuda, ela tem a satisfação de constatar que sua visão tornou-se realidade.

sexta-feira, 1 de dezembro de 1995

O clarão de fé que incomoda o poder

A Fábrica de Esperança completa seu primeiro aniversário sob as trevas da difamação

Por Marcelo Dutra

Carlos Fernandes
A Fábrica de Esperança foi idealizado pelo Rev. Caio Fábio

No meio do quadro sombrio de violência e miséria que vem sendo pintado da cidade do Rio de Janeiro, um facho de luz se sobressai, acenando com a perspectiva de recuperação dos princípios de dignidade, tal como as cidades-refúgios dos tempos do Velho Testamento. Um dos mais ousados projetos sociais da América Latina passou a significar uma expressiva diferença na qualidade de vida de 180 mil habitantes do complexo de Acari, Zona Oeste do Rio de Janeiro, que está entre os cinco maiores bolsões de violência e miséria do mundo. Debaixo de calúnias dos governantes do Rio, a Fábrica de Esperança festeja seu primeiro aniversário no dia 17 de dezembro, prestando serviços através de 17 projetos comunitários que beneficiam cerca de 200 pessoas por mês com atendimento médico, odontológico e jurídico, sem falar nos diversos cursos profissionalizantes. O sonho de cidadania, que parecia impossível, vira realidade, levando ao pé da letra a afirmação do apóstolo Paulo de que "agora permanecem a fé, a esperança e o amor" (1 Coríntios 13:13).

Para o idealizador da Fábrica de Esperança, reverendo Caio Fábio D'Araújo Filho, 40 anos, que sempre bifurcou seu ministério em evangelização e ação social, é difícil falar de Deus a quem não tem acesso a coisas básicas, como três refeições diárias. "Como pregar o Evangelho para um sujeito que não consegue raciocinar direito e está no limite da resistência humana? É preciso que esta pessoa veja o amor de Deus na prática; só então vamos poder falar de graça e misericórdia", argumenta. Com este propósito, o reverendo fundou a organização não-governamental Vinde (Visão Nacional de Evangelização) que, após 15 anos de atividades, adquiriu maturidade para encarar o desafio de aceitar a oferta dos empresários paulistas Alípio Gusmão e Salo Seibel, proprietários da antiga Formiplac. Os sócios - um presbiteriano e outro judeu - consideraram inviável a retomada das atividades da fábrica após um incêndio que destruiu a quase totalidade das instalações, em 1992.

Carlos Fernandes
A Fábrica de Esperança recebe investimentos
de Viviane Senna (acima) para escola de
informática (abaixo)

PARCERIAS - Foi então que surgiu a idéia de transformar os 55 mil metros quadrados da Formiplac num manancial de bênçãos para os habitantes das 16 favelas que formam o complexo de Acari, região geograficamente exduída dos benefícios sociais, na definição do jornalista Zuenir Ventura em seu livro Cidade Partida. O primeiro obstáculo a nublar o sonho do reverendo Caio Fábio foi a falta de dinheiro. A Vinde, que é mantida por doações voluntárias, não poderia bancar sozinha um projeto daquelas proporções. A solução foi partir para o sistema de parcerias.

Carlos Fernandes

A Xerox do Brasil foi a primeira empresa privada a assinar contratos com a Fábrica, investindo em escolas de treinamento técnico e oficinas profissionalizantes. Recentemente, inaugurou um projeto orçado em 60 mil dólares para treinar e capacitar adolescentes e adultos no desmonte e recuperação de máquinas copiadoras. O Instituto Ayrton Senna investirá, nos próximos três anos, cerca de 210 mil dólares na escola de informática. Atualmente funcionam três laboratórios de informática com cerca de 560 alunos. Para Viviane Senna, presidente do Instituto Ayrton Senna e irmã do piloto brasileiro morto em maio do ano passado, estes cursos são importantes porque dão oportunidade de trabalho aos adolescentes que só seriam engraxates, catadores de papel, camelôs ou até mesmo aviões do tráfico.

Outra parceira de expressão é a indústria de refrigerantes Pepsi. A idéia é simples: a Vinde fica responsável pela venda dos refrigerantes desta marca em igrejas evangélicas cadastradas e parte do lucro é repassada à Fábrica de Esperança. Dezenas de outras parcerias oferecem uma série de oficinas que vão desde cursos de sapateiro e cabeleireiro até o de teatro. Uma creche abriga 50 crianças da comunidade, que tem a terça parte de seus habitantes formada por meninos e meninas de zero a 14 anos.

Carlos Fernandes
Adolescentes trocam a ociosidade na favela por
treinamento nas oficinas profissionalizantes da Xerox

Vários segmentos do setor empresarial estão atentos aos progressos do empreendimento social da Vinde e mostram-se interessados em participar. Em reunião da Câmara de Comércio Americana para o Brasil, no Rio, em outubro, o empresário Sérgio Andrade de Carvalho, construtor de shopping centers do porte do Nova América Factory Shopping, no Rio, manifestou seu contentamento com o trabalho feito pela Fábrica de Esperança. "O mais difícil para um empresário é ter o equilíbrio entre o sonho e o poder de realização, e o reverendo Caio Fábio tem isto 'na medida cerca", elogiou o empresário engajado em obras sociais no Rio.

Motivos para comemorar o primeiro aniversário não faltam. A meta é de que 70 serviços estejam na linha de montagem da Fábrica dentro dos próximos três anos. "Se é para concretizar a esperança, as parcerias são bem-vindas", sinaliza a supervisora geral da Fábrica, Cristina Christiano. No dia 18 de dezembro, um culto em ação de graças reunirá pastores, empresários, funcionários e jornalistas nas dependências da Fábrica de Esperança. Mas a festa mesmo é dos cidadãos de Acari.

Os telefones da esperança A partir de agora todas as doações à Fábrica poderão ser abatidas no Imposto de Renda. As doações podem ser feitas através do sistema automático Disque-Esperança.

  • Disque 0900-7850-05 para doar RS 5
  • Disque 0900-7850-10 para doar RS 10
  • Disque 0900-7850-20 para doar R$ 20
Carlos Fernandes
Fernando Henrique assinou decreto
transformando a Fábrica de Esperança
em empresa de utilidade pública federal

Utilidade pública federal e estadual Júlio Cézar de Souza tem 13 anos e mora com o pai, a madrasta e mais quatro irmãos na favela Parque União, próxima a Acari. Trabalhava como ajudante de pedreiro para reforçar o orçamento doméstico, mas agora é um dos alunos do curso de informática da Fábrica de Esperança e sonha em ser digitador. "Estou tentando melhorar de vida, talvez consiga arrumar um bom emprego no futuro", diz.

A Fábrica de Esperança é um oásis na vida de milhares de famílias, sobretudo por levar a mensagem do Evangelho àqueles desfavorecidos pela sociedade. Tem feito isto seguindo um antigo, mas atualíssimo conselho de Jesus no sermão do Monte das Oliveiras: "Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Deus que está nos céus." Na área social, a Fábrica vem se tornando uma referência na batalha pela recuperação do conceito de cidadania. Além de um tribunal de pequenas causas, que já está em funcionamento, ela conta com o Centro Comunitário de Defesa da Cidadania. Só no mês de setembro, o CCDC contabilizou 6 mil atendimentos, providenciando documentos como certidões de nascimento, carteiras de identidade e certificados de óbito.

Recentemente, a Fábrica de Esperança recebeu um grande incentivo para seu sustento. No dia 23 de agosto, o presidente Fernando Henrique assinou um decreto considerando-a de utilidade pública federal. Em seguida foi a vez do governador do Rio, Marcello Alencar, sancionar projeto de lei dedarando-a entidade de utilidade pública estadual. Os atos permitem à Fábrica receber incentivos financeiros dos governos federal e estadual, além da concessão de subvenções para cobrir despesas de custeio.

Extraído Solidariedade. Revista Vinde, Rio de Janeiro, ano 1995, a. 1, ed. 2, p. 53-54, dez. 1995.

As doze 'marcelladas'

Ao atacar a Fábrica de Esperança e seus organizadores, antes mesmo da conclusão de qualquer investigação, o governador Marcello Alencar cometeu 12 falhas:

Carlos Fernandes
Marcello enganou o reverendo Caio, dizendo que não tinha nada contra a Fábrica
  1. Diz ter recebido informações sobre o uso ilícito da Fábrica de Esperança, em janeiro deste ano, mas não tomou providencias durante mais de 11 meses, acompanhando inclusive o presidente da República em visita às suas instalações;
  2. Disse ao prefeito César Maia que as crianças levam e trazem drogas desde janeiro, mas as primeiras crianças entraram na Fábrica apenas no final de maio;
  3. Disse que os titulares da Fábrica estavam construindo um projeto de milhões de dólares, usado como fachada para guardar apenas dois quilos de cocaína;
  4. Cobrou dos responsáveis pela Fábrica que dessem total garantia de que não haveria mais invasões furtivas de bandidos que vivem na favela vizinha à Fábrica, esquecendo-se que o Estado, com todo seu aparato, não tem sido capaz de coibir com eficácia as ações dos criminosos;
  5. Afirmou que os vigilantes da Fábrica obstruíram a entrada dos policiais, mas os portões da Fábrica estavam abertos e o vigilante apenas disse que iria informar o fato à administração;
  6. Declarou que os policiais invadiram a Fábrica porque sistematicamente os administradores impediam a entrada da polícia, esquecendo-se de que uma das sete entradas da Fábrica é guardada por dois policiais militares, 24 horas por dia, no Centro Comunitário de Defesa da Cidadania. A chave desse portão fica em poder do administrador daquele órgão do governo;
  7. Exigiu impecabilidade da vigilância da Fábrica de Esperança, quando os policiais do Centro de Defesa da Cidadania estavam mais próximos do local onde a droga foi encontrada, do que os vigilantes da Fábrica;
  8. Acusou os diretores da Fábrica de transigirem com os bandidos, esquecendo de que o muro construído pela Fábrica de Esperança - com 4 metros de altura por 3,50 de comprimento - é reto, ao contrário do muro construído em zigue zague pela Prefeitura do Rio, por conta de ação do tráfico de drogas. O próprio prefeito César Maia declarou em artigo publicado nos jornais que o poder público tem tido eventualmente que negociar com traficantes a construção de obras públicas;
  9. Acusou a administração da Fábrica de Esperança de tentar desvalorizar a investigação policial, ao criar uma comissão de sindicância interna, esquecendo-se de que tal iniciativa apenas denota o desconforto no qual os diretores do projeto se viram, antes as declarações precipitadas do governador de que o local era "depósito e ponto de distribuição de drogas". O governador sugeriu até que os diretores "arrumem seus culpados";
  10. Acreditou que a Fábrica de Esperança era um lugar de ilícito penal, mas ainda assim sancionou o projeto de lei transformando a Fábrica em entidade de utilidade pública estadual, em data posterior à sua conversa com o prefeito, que lhe teria feito denúncias sobre a Fábrica;
  11. Iludiu o reverendo Caio Fábio, em encontro no Palácio Guanabara, no dia 12 de julho deste ano, dizendo-lhe que não tinha nada contra o reverendo, exaltando as atividades da Fábrica, aceitando receber uma oração em seu favor e dizendo, ainda, que gostaria de visitar a entidade para conhecer seus projetos. Na verdade, já havia afumado diversas vezes, inclusive ao prefeito, que supunha haver atividades irregulares na Fábrica de Esperança;
  12. Acusou peremptoriamente a Fábrica de Esperança de ser depósito e centro de distribuição de drogas, sem saber que, no mesmo dia, durante as diligências policiais nas dependências da Fábrica, cerca de 15 policiais que participaram da operação pediram para almoçar no restaurante da instituição, comendo assim comida que pretensamente teria sido comprada com dinheiro ilícito.

Um chute na Fábrica de Esperança

Governador do Rio, Marcello Alencar, faz acusações aos responsáveis pelo maior projeto social do país

Por Carlos Fernandes


Carlos Fernandes
A passeata Reage Rio solidarizou-se com o drama vivido pela Fábrica de Esperança

Como se usasse uma boca com biqueira de metal, o governador do Estado do Rio, Marcelo Alencar chutou sem piedade a Fábrica de Esperança, o megaprojeto social da Vinde (Visão Nacional de Evangelização) e um dos símbolos do movimento Viva Rio, contra a violência e pela recuperação econômica e social do Rio. A apreensão de drogas numa área isolada da Fábrica, em Acari, no dia 23 de novembro, foi usada pelo governador, como um pretexto para atacar duramente os responsáveis pelo projeto social. Marcello lançou suspeitas sobre a idoneidade dos organizadores, afirmando estar convicto de que o local serve de fachada para depósito e distribuição de drogas. Irônico, chegou a chamar o projeto de "fábrica da desesperança".

A atitude do governador foi classificada dc "leviana, irresponsável e precipitada" pelo reverendo Caio Fábio D' Araújo Filho, idealizador do projeto, que se revelou perplexo com a reação de Marcelo Alencar. Em entrevista coletiva, no dia seguinte, Caio mostrou-se triste e afirmou que sua intenção nunca foi a de "bater de frente" com o governo do Estado. "O governador foi, no mínimo, precipitado, pois fez declarações antes de as investigações estarem conduídas", disse o reverendo. Ele desabafou, dizendo que o projeto é sério e lamentando que os traficantes possam ter escondido "essas porcarias" dentro da Fábrica. Ele admite que, por estar no meio de uma região perigosa ("aquilo é um barril de pólvora", afirmou), a Fábrica de Esperança está exposta a todos os tipos de riscos, inclusive a ação das quadrilhas da região. O fato de a apreensão ter ocorrido dias antes da passeata Reage Rio levou o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, a imaginar que tudo pode ter sido "uma armação" com a intenção de esvaziar o movimento.

Apoios - Ao contrário da imagem da santa que não pode reagir, a sociedade civil respondeu prontamente às acusações do governador. Representantes de todos os segmentos da sociedade - entre religiosos, sindicalistas, políticos e organizações não-governamentais - deram apoio ao reverendo Caio Fábio e aos diretores da Fábrica de Esperança. manifestando repúdio à intenção do governador de tentar vinculá-los ao tráfico de drogas. Quatro dias depois dos dardos do governador, mais de quinhentas pessoas participaram de ato público em apoio à Fábrica. O antropólogo Rubem César Fernandes, coordenador do movimento Viva Rio e um dos organizadores da passeata, disse que Caio Fábio "é um homem rigoroso e está acima de qualquer suspeita". A senadora Benedita da Silva (PT-RJ), acusou Marcelo Alencar de investir no caos num momento em que a sociedade se une para pedir mais segurança. Benedita considerou um absurdo suspeitar-se que o reverendo Caio Fábio, pastor evangélico há 22 anos - reconhecido internacionalmente como um sacerdote engajado em ações sociais - tenha qualquer envolvimento com o tráfico de drogas.

O sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, presidente do Ibase e símbolo nacional da luta contra a fome e a miséria, solidarizou-se com o trabalho desenvolvido pela Fábrica de Esperança, considerando que ele é realizado "em condições excepcionais e em meio à mais profunda miséria". O reverendo Caio Fábio começou a receber centenas de mensagens de apoio vindas de todo o país e os jornais publicaram cenas de solidariedade ao seu trabalho e de repúdio às declarações do governador. Numa delas. Marcelo afirmou que as organizações não-governamentais devem se livrar de "aventureiros com capa de generosidade". Os parceiros da Fábrica demonstraram total solidariedade e manifestaram claramente a intenção de manter seu apoio. Representantes da Xerox do Brasil, Golden Cross e Curso Yázigi reafirmaram sua confiança nos responsáveis pela Fábrica, e confirmaram que todos os convênios em andamento serão integralmente mantidos. Viviane Senna, que estava no Japão, telefonou para informar que vai manter seus projetos.

Boa parte da opinião pública está convencida de que o governador teve a intenção de dar o maior destaque possível ao caso, numa tentativa de enfraquecer a passeata Reage Rio que, entre outras coisas, colocaria em xeque a política de segurança do Estado, num momento em que se evidencia o recrudescimento da violência. Segundo estatísticas do Instituto Médico Legal - IML -, o número de assassinatos no Estado do Rio, de janeiro a novembro, chegou a 4.269, numa trágica média de 12 homicídios por dia. Até outubro, a Secretaria da Segurança Pública contabilizou 88 sequestros, ao mesmo tempo em que cerca de 160 crianças estão desaparecidas. Entre assaltos a bancos, roubos e furtos de carros e cargas, foram registrados mais de 33 mil, deixando clara a ineficiência do governo do Estado do Rio no controle da violência.

Providências - O reverendo Caio Fábio anunciou providências imediatas, como um levantamento completo sobre todos os funcionários da Fábrica, inclusive de seus antecedentes, na tentativa de descobrir qualquer envolvimento ou eventual conivência de algum deles com as atividades dos traficantes do complexo de favelas da região. Uma comissão de sindicância interna foi instalada. Além disso, a segurança vai ser terceirizada e ampliada. Até então, havia apenas 16 homens em três turnos, para vigiar uma área de 55 mil metros quadrados. Lembrando que é "o maior interessado em que tudo seja esclarecido", Caio Fábio recorreu ao Ministério Público para investigar minuciosamente o ocorrido. Com relação às acusações de Marcelo Alencar, o reverendo explicou que esperará a conclusão das investigações para decidir que providências tomará, mas a possibilidade de interpelar judicialmente o governador não está afastada. "Uma coisa é certa: eu não vou agir da mesma forma precipitada que o governador está agindo", afirmou. Caio Fábio estranhou ainda o fato de o governador e o prefeito terem afirmado que já tinham suspeitas a respeito das atividades da Fábrica. "Se era assim, por que eles não nos avisaram?"

Dizendo que sua função não é policialesca - "nós não perguntamos quem são os pais das crianças e jovens que se beneficiam do nosso trabalho" o reverendo criticou o governador por não controlar a entrada de drogas no Estado.

A ameaça de Marcelo Alencar, que dedarou que a Fábrica de Esperança poderia até ser fechada em consequência do episódio, foi desaprezada pelo reverendo, que lembrou que o projeto não é um órgão governamental e não pode ser desativada pela vontade do governador. Ele reafirmou sua expectativa de que o movimento Reage Rio atingiria plenamente seus objetivos. "Se alguém pensou que ia desmobilizar a manifestação, o tiro saiu pela culatra; caminhamos unidos pela paz nas ruas", disse o pastor após participar do Reage Rio, que parou a cidade no dia 28 de novembro.

Uma força de paz em território minado

Por Zuenir Ventura

Carlos Fernandes
Zuenir: apoio total à Fábrica

A experiência da Fábrica de Esperança é um projeto pioneiro. E uma força de paz no "front" da guerra. Equivale àquelas operações da Cruz Vermelha, no meio do fogo cruzado. Além de vidas, a Fábrica de Esperança também quer salvar almas. Não quer apenas retirar as pessoas da linha de frente, mas dar a elas condições de viver com o mínimo de dignidade. A fábrica combate o bom combate. Quer transformar futuros soldados dessa guerra suja em grandes cidadãos. Eu digo isso com tranquilidade e total isenção porque acompanhei o projeto da Fábrica desde o começo.

Devo ter sido um dos primeiros a descobrir que estava acontecendo ali em Acari, numa das regiões mais áridas do Rio, uma história de esforços reais em favor da paz. Sou testemunha também de que a Fábrica foi madrinha do belo casamento entre a economista Clarice Pechman, fundadora do movimento Viva Rio, e Salo Seibel, do PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais), um dos sócios da Formitec, que doou à antiga fábrica ao pastor Caio Fábio. A Fábrica é o maior monumento à paz, à reconstrução da cidade, que já foi feito. Não conheço no país outro projeto social com essas dimensões. Mas a Fábrica não é apenas um marco simbólico do Viva Rio. Se fosse só simbólico, já seria bom. Mas, melhor ainda, é uma ação concreta que supre a ausência do poder público, numa área conflagrada.

Outro dado interessante nesse projeto é a participação dos evangélicos, representados pelo pastor Caio Fábio. Antes de conhecer o trabalho dele, na Fábrica, eu tinha uma visão maniqueísta sobre os evangélicos. Para mim, os movimentos dirigidos por eles eram todos suspeitos. Ali tive uma grande revelação. Comecei a descobrir o conteúdo social do projeto. Ao escrever Cidade Partida, me desfiz de muitos estereótipos que são reproduzidos por nós mesmos da imprensa. Um deles era a participação dos evangélicos em obras sociais. A Fábrica me revela o que é uma força de paz num território minado, em pleno centro urbano do Rio de Janeiro.


Zuenir Ventura, 64 anos, é escritor e jornalista há 39 anos. Colunista e editor especial do Jornal do Brasil, contou uma parte da história da Fábrica de Esperança no livro Cidade Partida, da Companhia das Letras.



Revista Vinde - Edição 3

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