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sexta-feira, 1 de dezembro de 1995

O Brasil da vitrine

Por Délis Ortiz


"EL MANGO! EL MANGO!", gritavam algumas senhoras. Elas se acotovelavam entre os curiosos em busca de um bom ângulo para ver passar a recordação viva, também grisalha, dos tempos de estudante. Era o presidente Fernando Henrique Cardoso nas ruas de Caracas. Quase 30 anos separam o professor galã do que hoje os castelhanos chamam de Líder latino-americano. Lido e relido, nos idos de 68, na revolta dos estudantes, o sociólogo inebria também as platéias na Europa. Em Berlim, arranca lágrimas dos velhos companheiros de teses e deixa boquiaberta a juventude com a postulação de que a sociedade, fragmentada nos interesses, precisa de um líder sensível à real necessidade coletiva, capaz de aglutinar forças em busca do objetivo comum. Alemães, franceses, ingleses, todos aplaudem. O presidente conquista, pelo menos, um bom espaço na mídia internacional. Arranca manchetes como "o mais importante presidente da história do Brasil". O País visto lá de fora, por onde passa o presidente, não tem a mesma cara do Nordeste, da periferia, dos sem-terra, da violência. É a economia emergente, o terreno fértil para investimentos, o campo aberto para bons negócios. Para cada bilhão de dólares que os estrangeiros apostarem no Brasil, pelo menos cinco bilhões voltarão para os seus bolsos.

Neste ou noutro hemisfério, o tratamento é o mesmo dispensado aos mais importantes chefes de Estado do planeta. Charmoso, poliglota, diplomata nato. Com certeza, porém, não são pelos belos olhos do tucano que o mundo lhe estende o tapete vermelho. A pompa cinco estrelas ostentada em Frankfurt para o visitante era, na verdade, para a Amazônia, para o fim dos monopólios, para o mercado que ele representa. Mas de que adianta ser bem representado lá fora? Qual o retorno para o cidadão que ficou na corda bamba do emprego, equilibrando o orçamento apertado? Parece um país de duas caras. A do paraíso para investidores estrangeiros e purgatório para os nativos.

São, na verdade, dois mundos. O econômico, sem fronteiras, e o social, absolutamente compartimentado. No primeiro, apenas um elo une qualquer um a qualquer parte - o dinheiro. No segundo, o do perdido é exatamente o responsável pelo distanciamento nas relações - a miséria. E na balança humana, que falta numa bandeja é justo o que sobeja noutra. Para um pretendente a líder, a guerra é essa: a busca do equilíbrio.

Fernando Henrique conquistou o cenário internacional
frequentado por lideres como o presidente Bóris Yeltsin

Nada do que FHC acenou lá fora teve efeito imediato aqui dentro. Isto leva tempo. É coisa para Fazer diferença só a partir do ano 2000. Nossa miséria con-tinua nossa. Bilhões de dólares vão entrar, milhões de brasileiros vão morrer, doentes, famintos, mal-educados. É a velha história da água que corre para o mar. Outro dia, no proselitismo capitalista, um grande empresário me perguntou: "Você sabia que um lingote de alumínio custa 40% mais barato que o pãozinho de 50 gramas? É um absurdo", reclamou. Não resisti e retruquei: "O senhor sabia que ninguém come lingote de alumínio?" Não vi reação. Os dois mundos, do dinheiro e da miséria, ignoram um ao outro. Cegos, não percebem o risco de serem engolidos um pelo outro.

A esperança nos faz apostar que há de fazer diferença, sim, a entrada de capitais. Pelo menos empregos, salários, progresso e competitividade hão de vir juntos. Os exemplos vizinhos nos fazem temer a modernidade. É o grande dilema do século - a alta tecnologia versus recursos humanos. Os impérios econômicos se lançam em busca da eficiência, qualidade e baixo custo. Substituem seus homens por computadores e robôs. Os imperadores políticos se descabelam, ou pelo menos deveriam, em busca de solução para os desempregados da modernidade.

Cada viagem de FHC ao primeiro mundo é como uma volta ao futuro. FHC é um privilegiado. Pode ver o direito e o avesso das questões. Se não resumir os encontros diplomáticos e comerciais a sessões de exibicionismo. Se não perder de vista a realidade além dos tapetes. Se insistir na equação social. Os giros de FHC pelos continentes hão de ser uma bênção, para de e para nós. Se para cada decolagem houver uma aterrisagem consciente. Que FHC dê vôos ainda mais altos, mas que carregue o Brasil real nas asas desse Boeing. Os candidatos a passageiros dessa esperança só precisam embarcar pela fé.

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Délis Ortiz é jornalista, repórter de Política da Rede Globo de Televisão e membro da Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasília.

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