Francisco Rossi mostra como viver a fé na política
Texto e fotos de Jorge Antonio Barros, de Jerusalém
Ex-prefeito de Osasco, Rossi revelou
que vai se candidatar à Prefeitura de São Paulo
FRANCISCO ROSSI sempre teve a fala mansa, mas o coração era mais duro do que pedra de tropeço.
Depois de ter feito sucesso em 1976, com a gravação de Segura na mão de Deus - um dos maiores hits evangélicos de todos os
tempos Rossi levou 17 anos para aceitar a Palavra de Deus e, enfim, se converter aos caminhos de Cristo.
Compositor, prefeito de Osasco (SP) duas vezes e deputado federal outras duas, Rossi admite que jamais havia sido eleito
com tamanha alegria para o cargo que lhe garante mandato eterno: cidadão do Reino de Deus.
A melhor eleição da vida dele ocorreu em 1993 e foi mais fácil do que eleger síndico:
"Angustiado, liguei para um missionário e perguntei: dá para aceitar Jesus pelo telefone?
Depois disso, minha vida mudou completamente", testemunha.
Em entrevista a VINDE, no saguão do Hyatt Hotel em Jerusalém, Francisco Rossi de Almeida, 55 anos,
revelou que pretende se candidatar este ano à prefeitura de São Paulo, pelo PDT.
Rossi viajou no mês passado - a Israel e à Turquia, no grupo liderado pelo reverendo Caio Fábio.
Para quem lhe acusa de oportunismo eleitoral, Rossi responde com um testemunho vibrante das maravilhas que Deus tem feito em sua vida.
Em setembro do ano passado, ele foi batizado com o Espírito Santo - a experiência de renovação espiritual -
num congresso latino-americano de políticos evangélicos, em Miami, nos Estados Unidos.
"Não acreditava no batismo com o Espírito Santo; tinha dúvidas sobre os dons de línguas (estranhas),
achava que poderia ser auto-sugestão; mas agora experimentei que é real", garante Rossi,
que se diz convicto de ter retomado a carreira política também com a finalidade de pregar o Evangelho.
O político paulista: "Não quero fazer da fé uma oportunidade de mais votos"
Seu retorno à política ocorreu na última eleição para o governo do Estado de São Paulo,
quando disputou no segundo turno com Mário Covas, o atual governador.
A performance eleitoral de Rossi significou um verdadeiro milagre para o PDT de Brizola que, em São Paulo, nunca havia ido tio longe numa eleição.
No segundo turno da eleição para o Palácio dos Bandeirantes, Rossi conquistou 7 milhões de votos, 44% dos votos válidos.
Foi, portanto, o quarto político mais votado do país, depois de Fernando Henrique, Lula e Mário Covas, seu adversário em São Paulo.
"Não estava preparado para ser eleito, mas hoje o PDT existe em São Paulo", orgulha-se Rossi,
que contraditoriamente esteve em lado oposto ao de Brizola, durante os idos de 64.
Na época do golpe militar, Rossi participava do movimento estudantil, mas em oposição aos partidos de esquerda.
Vinte e dois anos depois, curiosamente, acabou sendo apoiado pelos mesmos partidos de esquerda para ser eleito deputado federal constituinte, pelo PTB, em 1986.
Sua base eleitoral, formada por sindicalistas de Osasco - onde foi realizada a primeira greve de metalúrgicos do regime militar, em 1968 -
o levou a uma posição considerada progressista na Assembléia Constituinte.
Por isso, conquistou nota 10 na avaliação do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), entidade não
governamental que fiscalizou a atuação dos parlamentares em relação aos interesses dos trabalhadores.
Entre o pastor Ageu e o amigo Aymoré, Rossi se emocionou ao orar no Muro das Lamentações, em Jerusalém
Apesar da realização profissional, Rossi admite que, aos 52. anos, era um homem vazio e sem paz.
Tinha uma religião (participava de uma seita oriental cujo nome preferiu não revelar) que o levou até o Japão em busca de mais conhecimentos.
Apesar da bela família formada por três filhos, vivia um casamento de aparências, que estava prestes a chegar ao fim -depois de 28 anos.
Depois de escapar de morrer num envenenamento acidental, por arsênico, ele decidiu gravar o disco Segura na Mão de Deus,
que lhe garantiu o Disco de Ouro, com mais de 500 mil cópias 'vendidas.
O disco foi resultado de uma promessa, como gratidão à cura.
Quando convalescia no hospital, acordou certa madrugada com um grupo orando e louvando a Deus, ao pé de sua cama.
Depois de curado, se afastou dos crentes.
"Em 93, estava no fundo do poço, quando apareceu um empresário Dino Dibella, dizendo-se missionário; ele insistiu muito para falar comigo e, por fim, cedi", lembra Rossi.
Mas novamente fez ouvido de mercador. Precisou passar por mais uma moenda, até que ligasse, desesperado, para o mesmo missionário:
"Dá para aceitar a Jesus por telefone?" O missionário disse, chorando:
"É claro! É pra já!" Depois de sua conversão, Rossi conta que o primeiro sinal de Deus em sua vida foi o resgate de seu casamento.
"Estavámos a ponto de nos separar, mas Deus fez um milagre", conta Rossi, paulista de Caçapava, criado em Osasco, na Grande São Paulo.
Independentemente do partido, Rossi sempre deu duro na política.
Quando retornar de sua viagem ao exterior, no início deste mês, Rossi vai arregaçar as mangas e começar a trabalhar por sua candidatura à Prefeitura de São Paulo.
Na eleição para o governo do Estado, Rossi calcula ter recebido boa parte dos cerca de 3 milhões de votos dos evangélicos de São Paulo.
Mas garante não ter trabalhado espeficicamente para isso.
Membro da igreja de Vila Iara, Rossi conta ter sido procurado por líderes da Igreja Universal do Reino de Deus, em São Paulo, que lhe prometeram apoio político.
"Na hora H, apoiaram o Covas por causa do Fernando Henrique", diz Rossi, com uma ponta de ressentimento.
Prejuízos maiores têm lhe causado os escândalos nos quais aparecem envolvidos integrantes da cúpula da Universal.
"Como político e evangélico, me sinto muito prejudicado por esses escândalos; minha mãe,
D. Mercedes, católica praticante, estava prestes a se converter ao Evangelho quando ficou muito revoltada com o chute dado na imagem de Nossa Senhora, por um bispo da Universal", lembra Rossi.
A conversão restaurou o casamento com Ana Maria, que o acompanhou a Israel
Apesar dos contratempos, Rossi conta que tem se dedicado bastante à pregação do Evangelho e à oração por pessoas doentes.
Seu testemunho de vida tem servido para que outros colegas de partido sejam alcançados por Deus.
Um deles é seu primo, o deputado federal Fernando Zuppo (PDT-SP), recém-convertido.
O pai de Zuppo e tio de Rossi, Fernando, aceitou Jesus exatamente 15 minutos antes de morrer, num hospital em São Paulo.
Rossi foi especialmente ao hospital depois de jejuar por 24 horas, em intenção da conversão do tio, homem de dura cerviz.
Quando chegou ao hospital, o tio estava em coma. Rossi, então, clamou a Deus para que lhe desse mais uma chance.
Logo depois, o tio saiu de coma, ouviu a Palavra de Deus e entregou sua vida a Jesus.
Quinze minutos depois tio Fernando partiu dessa para melhor.
Assim como sua carreira política, Rossi tem aprendido a colocar seus planos diante de Deus.
Convidado pelo pastor de sua igreja, Ageu Silva, para fazer a viagem à Terra Santa, Rossi diz que pediu confirmação a Deus, antes de arrumar as malas.
Acompanhado da mulher, Ana Maria, Rossi se emocionou bastante em vários momentos de sua peregrinação pelos locais por onde Jesus passou.
Com fervor, participou da ceia (o sacramento da comunhão) no Jardim da Tumba.
No Muro das Lamentações, orou pela paz em Jerusalém, ao lado do amigo Aymoré de Mello Dias,
presidente do Instituto de Previdência do Município de Osasco, católico, que defendeu uma virtude do político Rossi:
"Com 28 anos de vida pública, ele tem experiência para não fazer carreira política em cima de religião."
De fato, Rossi demonstra estar consciente de que é melhor ser um político com uma experiência de conversão do que um convertido se aventurando na política.
"Não quero fazer da igreja ou da fé uma oportunidade de mais votos", afirma Rossi que prefere ser mais conhecido como político do que como evangélico.
Ele admite, porém, que durante a campanha para o governo de São Paulo enfrentou perseguições por causa de sua fé. "Era acusado apenas por exibir a Bíblia", lembra.
Extraído Opinião. Revista Vinde, Rio de Janeiro, ano 1996, a. 1, ed. 5, p. 56-58, mar. 1996.
A quebra do Banco Econômico resultou no escândalo da pasta cor-de-rosa
Tirar máscaras era a ordem no começo da década. A imprensa vendeu, o leitor comprou, o povo acreditou,
o Primeiro Mundo aplaudiu. Despencou o presidente e veio o efeito dominó: CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito)
para tudo - empreiteiras, anões do orçamento, bingo, só para lembrar algumas.
Mandatos caçados, renúncias, entra em cena o Ministério Público e a Polícia Federal.
Devassas, inquéritos e poucos julgamentos.
Tudo remexido, dá a sensação de que tudo mudou. Será? O processo de mudança foi apenas instalado.
A delação continua frenética, às vezes irresponsável. Primeiro a calúnia, depois a confirmação ou não dos fatos.
Sabe-se, não comprovar o crime nem sempre prova a inocência. Há um cheiro de hipocrisia no ar.
Quando o PC, do esquema que derrubou o Collor, jogou na cara de deputados e senadores que eles lhe faziam
uma cobrança hipócrita, muitos perderam o fôlego. O crime era doações e sobras de campanha.
PC pagou pelos restos milionários. No mérito, somos moralistas. E na prática? A lei eleitoral mudou.
Na eleição passada, o preço da campanha ficou menor, não podia ter efeitos especiais na TV, cenas de comícios,
de pobres e de consternação. As doações de campanha exigiam bônus - papéis com nome, endereço, CGC do doador e,
é claro, o valor. Para driblar o negócio, teve até a vista grossa dos observadores oficiais.
Muitos dos beneficiários eram os algozes dos corruptos do esquema PC. Agora é a pasta cor-de-rosa.
Ingênua como a cor é a pretensão de pensar que ali tenha alguma novidade. Empresários, banqueiros e até multinacionais
financiam campanhas. Quem nunca recebeu uma ajuda para a campanha? Mas ninguém cobrou uma CPI de doações.
A razão, rabo preso. Cada qual com uma trave maior que outro no olho, como levar adiante as acusações?!
A manobra foi desviar a atenção para o autor da denúncia. O bandido passa a ser quem vazou a notícia.
Todos erram, sejamos solidários. Esse é o raciocínio político. Mas, como tudo o que é feio exige castigo,
há de existir um bode espiatório que paga por todos. A lei, na época das doações documentadas na pasta rosa,
não proibia explicitamente as doações, por isso as atenções se concentraram na busca do responsável pelo
vazamento da informação. Das centenas de suspeitos do Banco Central, um só culpado, um só punido - não fez
nem recebeu doação, não é político: o malquisto interventor do Econômico (a pasta estava lá).
Responsável pelo banco, se a pasta estava no banco, o culpado. Caso encerrado.
Eleições municipais à vista. Na convocação extra do Congresso, o ensaio do que vai ser a batalha por espaço,
que se traduz em poder, melhor dizendo, dinheiro. Vem agora a fatura do apoio dado ao governo no ano passado:
verbas para o município. Todo mundo quer garantir uma obrazinha, para o eleitor pensar que o político que
ficou em Brasília luta pelo bem-estar da cidade que lhe deu votos. Se for para ajudar outro candidato, bem;
se o próprio parlamentar for o candidato a prefeito, melhor ainda. O jogo de cena continua.
Os aliados protestam, mas continuam fiéis. Querem FHC como cabo eleitoral.
Contatos despretensiosos escondem a maratona em busca de financiadores de campanha.
Passou a metade da década e a ordem de mudança foi esquecida.
Tudo igual, e os sepulcros estão cada vez mais caiados.
O embaixador Júlio César dos Santos e o comandante José Afonso Assunção: suspeitos de maracutaia no caso Sivam
Num desses vôos que o trabalho me obriga, a uns 10 mil metros do chão, fiquei entre a visão divina
e a pequenez humana sobre imagens de coisas como grampos telefônicos, tráfico de influência via satélite,
a ambiciosa empreitada de proteger a Amazônia, ditos e desmentidos políticos, enfim, histórias de
bastidores que, por questões de segurança nacional e garantias democráticas, ninguém revela.
Vista do alto, a rotina que ocupa os homens parece um ponto na visão global do universo.
A opinião pública não parece muito interessada na questão do Sivam. O tema não mexe no dia-a-dia do cidadão comum:
são um bilhão e meio de dólares, fortuna que vive na estratosfera da utopia.
As histórias que envolvem o Sivam não cabem na vida de detalhes de nossa gente.
No entanto, é prato cheio para a agitação política. Quem é inocente, mas não parece, luta para convencer.
Quem tem culpa faz malabarismos para posar de santo. E aí, tudo fica vulnerável. Até uma conversa fiada ao
telefone pode ser o estopim de um grande incêndio. Relatórios técnicos são manuseados e discutidos.
Todos tratam como feijão com arroz o que a Aeronáutica classifica tridimensional.
Se ninguém domina o assunto, qual é o parâmetro para julgar? O critério é aleatório. O que é pior:
comprar porcaria por um preço menor ou pagar mais caro por um equipamento moderno e eficiente?
E se for verdade que o mais caro é roubo? Desse jeito, o santuário ecológico a ser vigiado e sondado
vira um terreno minado. É o negócio da China, não só pelo valor, mas por tratar da biodiversidade dos
segredos que despertam o interesse do mundo inteiro. E aí? O Sivam é importante? Pode ser entregue para
estrangeiros? Quem, no Brasil, poderia fazer o serviço? O setor da alta tecnologia não tem muito mercado
no país. Quem arriscou anda mal das pernas.
Está aí um presidente com insônia, uma corrida insana da imprensa à cata de furos. Um monte de aliados,
ora em dúvida, ora enleados em nebulosas versões sobre a conversa bruta com a voz do presidente e seus auxiliares.
Ninguém mostrou a fita com a gravação inteira da escuta telefônica, mas os boatos de fontes fidedignas tratam,
entre outras coisas, de namoricos presidenciais com gente da própria corte. O fantasma que atravessou o fosso do
palácio e agora passeia pela Esplanada e pelo Congresso é a dúvida. Ninguém tem certeza de nada, nem o presidente.
O bom senso manda decepar cabeças, suspender processos, agir rápido para barrar as desconfianças e a obscuridade
amazônica de tratos e contratos. Só não se sabe ao certo como deter a espécie de ectoplasma político - o desconhecido.
Seja qual for o fim desse enredo, os responsáveis pela verdadeira história devem estar rindo das conjecturas.
Tem um detalhe: do alto, onde até a Amazônia parece um pingo no planeta, o radar de Deus capta a desordem,
a corrupção, a injustiça, seja lá o que for.
A maioria dos parlamentares evangélicos pertence a partidos que apóiam o governo
Jorge Antonio Barros
Dos 40 parlamentares evangélicos que atuam no Congresso Nacional, em Brasília,
apenas dois são de partidos de oposição
Durante o regime militar, a maioria deles estava na Arena, o partido que sustentava o regime.
Com a redemocratização, se dispersaram por partidos pequenos até se reunirem novamente em torno
dos mesmos ideais religiosos, na Assembléia Geral Constituinte, em 1986. Depois do escândalo da
concessão de rádios em troca de apoio aos cinco anos de mandato do presidente Sarney, houve uma
renovação dos parlamentares evangélicos no Congresso, mas a grande maioria deles continua onde
sempre esteve: ao lado do Poder Executivo.
Do total de 40 parlamentares evangélicos no Congresso Nacional, apenas dois não pertencem a partidos
que dão sustentação ao governo de Fernando Henrique Cardoso: a senadora Benedita da Silva (PT-RJ) e
o deputado Beto Lélis (PSB-BA). Entre os 34 deputados, 19 deles inauguraram mandato na Câmara.
Isto representa uma renovação de mais de 50% dos evangélicos em relação à última legislatura.
Subvertendo a fama de despolitizados, os pentecostais têm mais representantes no Congresso do que
os protestantes históricos. Doze deles têm origem na Assembléia de Deus, enquanto a Igreja Universal
do Reino de Deus dobrou seu número de deputados em apenas uma legislatura.
A posição de sustentação ao governo da maioria dos evangélicos no Congresso é geralmente consequência
do fundamentalismo religioso, que recorre ao versículo primeiro do capítulo 13 de Romanos: "Todo homem
esteja sujeito às autoridades superiores; porque não há autoridade que não proceda de Deus (...)"
Só que, na política, tudo é muito relativo. A proximidade com o poder, porém, garante elogios de políticos
como o deputado Inocêncio de Oliveira, líder do PFL na Câmara, o principal partido aliado do governo.
"Os evangélicos são atuantes nas questões sociais e nos interesses da nação", disse Inocêncio a VINDE.
Político habituado aos holofotes do poder (já foi acusado de ter-se beneficiado do extinto DNOCS para
abrir poços artesianos em suas terras em Pernambuco), Inocêncio desmistifica a ideia de que os evangélicos
formam uma espécie de bancada religiosa: "Eles votam sempre unidos em torno de questões que dizem respeito
a suas crenças, mas estão dispersos em vários partidos". Os congressistas evangélicos estão em boa parte
no PPB (13), no PFL (8) e no PMDB (8).
A reportagem de VINDE passou dois dias em Brasília para traçar um perfil dos 34 deputados federais e
seis senadores de origem evangélica eleitos para a 50. legislatura (1995/1999), a última antes da virada
do século. Para que o editor de fotografia Frederico Mendes fizesse a foto de capa desta edição, a revista
solicitou a 38 parlamentares que estivessem numa tarde de quarta-feira no Salão Verde da Câmara. Apenas
nove deles - incluindo um deputado da Câmara do Distrito Federal - puderam atender ao apelo.
A colaboração dos parlamentares ficou mais difícil ainda quando lhes foi enviada uma ficha com perguntas
padronizadas sobre sua atuação política. Apenas três deputados — um deles distrital — responderam o fax
da revista: Philemon Rodrigues (PTB-MG), Salatiel Carvalho (PPB-PE) e Peniel Pacheco (PTB-DF), todos da
Assembléia de Deus (ver matéria na página 17).
Uma pesquisa sobre parlamentares evangélicos já tem como obstáculo inicial o número exato deles num
congresso com 513 deputados e 81 senadores. Ninguém pode exigir atestado religioso. VINDE descobriu,
por exemplo, que pelo menos dois ficaram de fora da lista fornecida por parlamentares evangélicos:
o senador Roberto Requião (PMDB-PR), que é presbiteriano, e o deputado Carlos da Carbrás (PFL-AM),
empresário da construção civil, da Igreja Batista da Chapada, em Manaus.
Arolde de Oliveira (E], com Laprovita Vieira, é o mais antigo congressista evangélico
Benedita: "Os políticos não podem
esquecer que representam uma sociedade plural"
Representando cerca de 8% do Congresso Nacional, os 40 parlamentares evangélicos estão distribuídos
entre as seguintes denominações: Assembléia de Deus (12), Batista (6), Presbiteriana (6), Universal
do Reino de Deus (6), Luterana (4), Congregacional (1), Evangelho Quadrangular (1). Dois deles
não têm denominação declarada: Francisco Silva, do Rio, e Elton da Luz Rohnelt (RS), o único
representante do Partido Socialista Cristão.
Participação na política sempre foi uma questão mal resolvida para os evangélicos do ramo pentecostal.
A Assembléia de Deus do Maranhão, por exemplo, ainda hoje proíbe que seus pastores sejam candidatos a
cargos eletivos. "Como ser pastor e não ser político? Ninguém foi tão político quanto Jesus", sentencia
o deputado federal Paulo de Velasco, pastor da Igreja Universal e um dos seis representantes daquela
igreja no Congresso.
Classificada como neopentecostal, a Universal tem uma orientação clara para o Congresso: a cada eleição
apresenta ao povo sua lista de candidatos, com número e tudo. Com essa estratégia, a Universal passou de
três para seis o número de deputados federais em apenas uma legislatura. "Enquanto esse Congresso não
for predominantemente evangélico, as coisas vão continuar como estão", afirma o deputado Jorge Wilson,
da Universal. As práticas político-partidárias da Universal raramente são questionadas entre os evangélicos.
Enquanto o deputado Salatiel Carvalho (PPB-PE) discorda que pastores levem candidaturas para o púlpito,
o deputado Carlos Apolinário (PMDB-SP) defende a estratégia da Universal: "O PT e a CUT não levam seus
candidatos aos sindicatos? Por que a Universal não pode levar os seus à igreja?", questiona Apolinário,
da Assembléia de Deus.
Costa Ferreira é presidente da União Parlamentar Cristã
Carlos Apolinário defende a campanha dos candidatos evangélicos nas igrejas
Irmão votar em irmão continua sendo uma questão bastante polêmica nas igrejas. "Os políticos não podem
esquecer que representam uma sociedade plural; por isso seria difícil um evangélico governar", avalia a
senadora Benedita da Silva, que já foi candidata à prefeitura do Rio e teve 40% nas pesquisas de intenção
de votos para a próxima eleição. "A esquerda precisa aprender a conviver com os problemas religiosos",
rebate o deputado Carlos Apolinário, que deverá candidatar-se este ano à prefeitura de São Paulo. Famoso
por ter liderado uma campanha moralizadora na Assembléia Legislativa paulista, quando presidiu a casa,
Apolinário também atira nos pastores: "O questionamento dos líderes da igreja é puramente fisiológico;
queria ser questionado por minha atuação política, não porque deixei de favorecer a igreja A ou B", denuncia.
Entre os evangélicos, Apolinário é um dos poucos lembrados por jornalistas como sendo boa fonte de informações.
"Os evangélicos não circulam pelos grandes temas de interesse nacional", observa o jornalista Ilímar Franco,
que cobre o Congresso para o Jornal do Brasil.
Apolinário é evangelista, nascido e criado na Assembléia de Deus. No grupo evangélico, há de tudo um pouco.
Empresários, advogados, funcionários públicos e políticos profissionais. Quatro são pastores - Laprovita
Vieira, Paulo de Velasco, Philemon Rodrigues e Elias Abrahão (PMDB-PR). Este último é uma espécie de ovelha
negra no rebanho do Congresso. Fichado no Dops, na época do Regime Militar, Elias segue uma trajetória
política na contramão da maioria dos políticos evangélicos.
Mas nem todo deputado que diz "Senhor, Senhor" herdará o reino dos céus. Entre os congressistas evangélicos,
há até quem tenha sido suspeito de liderar pistoleiros no Maranhão. Ignora o sexto mandamento. O mais
experiente do grupo é o deputado Arolde de Oliveira (PFL-RJ), em seu quarto mandato. Ex-articulador evangélico
durante a Constituinte, Arolde ressalta que os evangélicos não cogitam de formar nenhum grupo político:
"Não queremos reduzir o Evangelho a um partido", explica. Ele admite que os evangélicos se uniram na
Constituinte para preservar os valores cristãos na Constituição Federal.
Se o Evangelho não foi reduzido a um partido, durante a Constituinte seus representantes no Congresso
mergulharam num mar de lama que respingou nas igrejas. O escândalo ganhou os jornais e, em 1993,
virou até tese de doutorado do cientista social e evangélico Paul Freston, na Universidade de Campinas -
Protestantes e Política no Brasil, da Constituinte ao Impeachment. Entre os parlamentares que jogaram
lama no Evangelho, um deles não poderia tomar mais em vão o nome do Criador: João de Deus. Com outro
evangélico, Manoel Moreira (PMDB-SP), João foi denunciado na CPI do Orçamento, em 1993. Mais do que os
incrédulos, eles sabiam o que significa "é dando que se recebe", o lema do fisiologismo. "Sou mesmo
fisiologista. Mas quem não é?", dizia, na época, João, nada divino.
Hoje, as únicas questões que mobilizam os parlamentares evangélicos, enquanto cristãos, são aquelas que
dizem respeito à moral. A grande maioria deles vota junto e contra quando o assunto é aborto, casamento
entre homossexuais, liberação do jogo, descriminalização das drogas e pena de morte. Este último tema
deve ser, na verdade, a única unanimidade entre todos os parlamentares e evangélicos. Quanto aos outros
assuntos, a senadora Benedita da Silva (PT-RJ) admite ser uma das poucas a divergir de seus irmãos na fé.
"A patrulha religiosa é muito grande, mas os direitos civis de quem quer que seja devem ser respeitados",
afirma Benedita, acrescentando que sua base eleitoral é mais plural do que a maioria dos evangélicos no
Congresso.
Benedita é batizada na igreja da Assembléia de Deus, mas sua ação política é questionada dentro de sua
própria denominação. O deputado Costa Ferreira, evangelista da Assembléia de Deus no Maranhão, está
convencido que o partido ao qual Benedita é filiada - o PT - é comunista e, portanto, anticristão.
O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) não é evangélico nem do mesmo partido que Benedita, mas comunga
com ela de algumas idéias que dizem respeito à moral. "Por isso, eu sou o diabo para os parlamentares
evangélicos", conclui Gabeira, com uma ponta de ironia. "Quem pode dizer que o seu partido está com
Deus ou o meu está com o demônio? Então, o Espírito está nos enganando a todos os evangélicos, que
fomos eleitos por diversos partidos", rebate Benedita.
Os três parlamentares mais acessíveis
Salatiel Carvalho admite ter recebido uma rádio do ex-presidente José Sarney
Apenas três dos 38 parlamentares evangélicos responderam ao fax enviado pela VINDE,
solicitando informações sobre sua atuação política - os deputados federais Salatiel
Carvalho (PP-PE), Philemon Rodrigues (PTB-MG) e o deputado Peniel Pacheco (PTB), da
Câmara Legislativa do Distrito Federal.
Eleito pelo PP com 36.430 votos - 60% dados por evangélicos -, Salatiel Carvalho é
engenheiro civil, casado e pai de quatro filhos. Em entrevista à VINDE, Salatiel é
um dos raros parlamentares que admite ter ganho do presidente Sarney uma concessão
de rádio, mas afirma que não foi por isso que votou no mandato de cinco do presidente.
Ele se considera um político progressista, integra a base de sustentação política do
governo e sempre vota de acordo com sua bancada. É favorável ao fim dos monopólios e
da estabilidade dos servidores públicos e afirma que é um parlamentar assíduo: segundo
ele, seu índice de comparecimento às sessões da Câmara é de 100%.
Philemon Rodrigues da Silva teve um percentual de votos alto entre os evangélicos: 90%
dos 40.378 sufrágios que recebeu. Philemon, do PTB de Minas Gerais, pertence à Assembléia
de Deus desde criança, é casado e tem cinco filhos. Integra a Frente Parlamentar da Agricultura
e a base de sustentação do Planalto. Para ele, representar a igreja no Congresso é uma grande
responsabilidade. O deputado distrital Peniel Pacheco também é do PTB e da Assembléia de Deus,
e acha que um parlamentar não pode ser representante de um único segmento social, e sim, da
comunidade como um todo. Recebeu cerca de 9,5 mil votos, tem 37 anos, é casado e tem três filhos.
Peniel defende a liberdade com justiça social e o equilíbrio entre capital e trabalho.
'Santos' projetos para todos os gostos
Por Carlos Fernandes
De Velasco: projeto contra feriado
Legislar é a principal função dos Carlos Fernandes Integrantes do Congresso Nacional - afinai,
para isso eles foram eleitos. Os parlamentares evangélicos, que percorrem as igrejas em época
de eleições pedindo votos, prometem, muitas vezes, representar o povo evangélico nas duas casas do Legislativo.
Coda um, dentro das suas convicções e denominações, procuro fazer o máximo para agradar seu rebanho eleitoral.
O deputado De Velasco, por exemplo, apresentou um projeto de lei revogando o lei 6802, que declarou o dia
12 de outubro como feriado nacional consagrado a Nossa Senhora Aparecida - a mesma cuja imagem foi chutada
pelo bispo Von Helde. Os integrantes da Igreja Universal do Reino de Deus parecem mesmo ter declarado guerra
à "padroeira do Brasil". Em uma provável consequência do efeito Decadência, o deputado mineiro Philemon
Rodrigues sugeriu ao Poder Executivo providências relativas ao episódio atentatório contra um templo da IURD,
envolvendo a TV Globo. Já o deputado Arolde Oliveira quis santificar o real e propôs que a inscrição da
frase "Deus seja louvado" fosse obrigatória no papel moeda e nos moedas metálicas.
Já o cruzada antitabagista e antialcoólico - velhas bandeiras dos crentes - motivo a apresentação de inúmeros
projetos de lei por parte dos parlamentares evangélicos. São mensagens propondo a restrição ao uso do cigarro
em meios de transporte e lugares públicos, bem como medidas proibindo o consumo de bebidas alcoólicas em várias
situações. A veiculação de filmes pornográficos também é um alvo constante dos congressistas cristãos.
Projetos inusitados não faltam. O deputado Elias Abrahão (PMDB-PR) apresentou uma proposta proibindo o importação
de lápis de cera com altos teores de metais pesados, enquanto o deputado Costa Ferreira (PPB-MA) propôs a inclusão
do suco de laranja na merenda escolar. Costa Ferreira, aliás, é o autor de dezenas de projetos de criação de escolas
federais técnicos e agrícolas no seu estado - o Maranhão -, em municípios como Bacabal, Açoilândia, Turiaçu e Zé Doca.
Mas, numa demonstração de que não tem apenas preocupações regionais, ele também propôs a criação do Dia Nacional do Fé Cristã.
Há também as idéias polêmicas. Numa aparente contradição ao princípio bíblico do Não matarás, o deputado
Luiz Moreira (PFL-BA) elaborou um projeto de lei que autoriza o interrupção da gravidez até 24 semanas, no caso de o
feto ser portador de graves e irreversíveis anomalias físicas ou mentais. A instituição do dia nacional do perdão foi
sugerida pelo deputado Francisco Silva, o mesmo que apresentou projeto de lei determinando a doação compulsória de
órgãos pelos condenados por crimes hediondos. Será que os criminosos perdoariam o deputado?
Preocupado com o que pode vir por aí, o deputado Herculano Anghinetti (PSDB-MG) fez um projeto de resolução estabelecendo
a impenhorabilidade dos templos religiosos - afinal, cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém. E o deputado
Salatiel Carvalho, além de considerar, em projeto de sua autoria, que os templos religiosos devem pagar tarifa de energio
elétrica como se fossem consumidores residenciais, quis vedar a realização de eleições gerais, concursos públicos e
exames vestibulares em dias ou datas coincidentes com os consagrados a eventos religiosos e ao exercício de culto.
Como o projeto abrange qualquer crença, fica a dúvida: haveria data disponível para se votar, concorrer a um cargo público
ou a uma vaga no faculdade?
Garotinho conta como escapou da morte e aceitou o Evangelho
Por Carlos Fernandes
Fotos de Frederico Mendes
O que poderia ter sido uma tragédia acabou trazendo salvação. Anthony Garotinho encontrou-se com Cristo
após ver a morte de perto e, no leito do hospital, elegeu-o como Senhor de sua vida.
No auge da campanha eleitoral para o governo do Estado do Rio, Garotinho dirigia-se para Volta Redonda (RJ),
onde faria um importante comício, quando o Tempra em que viajava foi fechado na via Dutra, saiu da estrada e
capotou três vezes. A violência do impacto foi tão grande que o arremessou pelo vidro traseiro do carro.
O acidente não poderia ter vindo em pior hora, pois precisamente naqueles dias - corria o mês de setembro de 1994 -
o Ibope anunciava o empate técnico entre Garotinho, que concorria pelo PDT, e o candidato do PSDB, Marcello Alencar.
No hospital da Companhia Siderúrgica Nacional - para onde foi removido pelos Anjos do Asfalto,
um grupo de paramédicos do Rio - foi constatada fratura múltipla do braço direito.
Durante a cirurgia, que durou cinco horas, Garotinho recebeu uma placa de platina,
dez parafusos e enxerto ósseo. A intervenção foi bem-sucedida, mas a situação parecia
representar o fim de suas pretensões eleitoriais: "O médico me disse que eu ficaria
impossibilitado de fazer campanha naquele primeiro turno, e estávamos a poucos dias da eleição.
Além do braço imobilizado, eu não poderia caminhar direito pelo menos por 15 dias,
porque me tiraram uma lasca do osso ilíaco para recompor o osso do braço", lembra Garotinho.
"Embora entendesse que eu vivia um momento importante da minha vida, o doutor foi sincero e
falou que eu deveria dar graças a Deus por estar vivo pois, pelo estado do carro,
a tragédia deveria ter sido bem pior".
O calvário de Garotinho começou numa sexta-feira. Internado no hospital da CSN,
ele estava completamente incapacitado. Não andava e nem tomava banho sozinho, justamente no momento
mais crucial de sua vida política, com grandes chances de tornar-se governador do Rio de Janeiro.
"Naqueles dias, eu estava muito feliz com o resultado das pesquisas, que me colocavam junto ao
primeiro colocado", lembra. Na época, chegou-se a suspeitar de um atentado político,
mas a hipótese não foi investigada. Seguiu-se um sábado angustiante, que de passou, sob efeito de
analgésicos, acompanhado da mulher, Rosinha. noite, fez uma refeição leve, e dormiu.
O programa Show do Garotinho, na Rádio Tupi, é campeão de audiência
DEUS FALOU COMIGO - Foi então que aconteceu o inesperado. Por volta das três horas
da madrugada de domingo, Garotinho acordou e, naquele momento, começou a ver o acidente
passar na sua frente, como num filme colorido. Desperto do sono, viu todo o acidente acontecer
novamente. Na hora em que ocorreu a capotagem, ele estava dando uma entrevista pelo celular,
fato de que não se lembrava. "Aquela visão não era uma lembrança, pois eu não tinha percebido
o acidente", afirma. A experiência foi tão intensa que Garotinho começou a chorar:
"Sem que ninguém me falasse nada, caí num choro compulsivo. Chorava, chorava, chorava, e aí
comecei a dizer para minha esposa que Deus estava falando comigo". Diante do espanto da companheira,
relatou que estava sentindo uma coisa quente dentro de si, e sabia que era Deus falando ao seu coração.
Garotinho relembra aqueles instantes com eloquência: "Eu estava sentindo uma alegria, uma coisa
dentro de mim, me tocando, não sabia explicar, e continuava chorando muito".
O barulho atraiu a enfermeira, e, diante dela, Garotinho continuou afirmando que Deus falava com ele.
Para espanto das duas, levantou-se do leito e caminhou sozinho até o banheiro, apoiando-se normalmente
sobre a perna operada. Só então elas perceberam que não era um delírio. Totalmente lúcido e alegre,
não parava de afirmar que Deus falava com ele, quando uma outra enfermeira disse que o pai dela era
evangélico. "Ele é pastor? Preciso falar com um pastor", interrompeu Garotinho. Esse senhor,
membro da Assembléia de Deus, foi chamado ao quarto e disse que aquilo era uma providência de Deus que,
através do Espírito Santo, estava lhe mostrando que deveria lembrar-se dele, e colocá-lo acima de tudo
em sua vida, até mesmo seus desejos e realizações. Ecoas palavras foram ratificadas pelo pastor
Nilson Dimarzio, da Igreja Batista Central de Volta Redonda, que soube da experiência de Garotinho
e foi ao hospital dizer-lhe que ele deveria ser batizado.
Garotinho recebe 30 mil cartas por mês
Nesse instante, de começou a viver um dilema: muito embora soubesse que sua experiência
era real e diferente de tudo que já sentira — materialista, fora integrante do PCB e
não praticava nenhuma religião —, ficou com medo de que a atitude de aceitar o batismo
pudesse ser interpretada como uma tentativa de obter votos dos evangélicos.
Dessa forma, resolveu esperar um momento mais apropriado para tornar pública sua fé.
Depois das eleições, em que foi derrotado por uma margem de apenas 3% dos votos,
passou algum tempo lendo, se preparando e procurando um ambiente para si.
Conheceu o reverendo Caio Fábio que, após um período de preparação, batizou-o em 30 de
julho deste ano.
O político Anthony. Garotinho acha que sua conversão deu-lhe uma visão diferente
das questões que sempre o acompanharam. O fato de ter se tornado crente mostrou-lhe
uma face nova da vida: "Eu sempre fui um cara combativo, envolvendo-me com lutas sociais,
com vontade de fazer as coisas. Ficava angustiado porque não encontrava respostas
definitivas para as lutas políticas. Continuo produtivo e atuando politicamente,
mas perdi aquela angústia". Na sua opinião, os lados material e espiritual caminham em
direções opostas, pois "quanto mais se avança espiritualmente, mais a gente se desprende
das coisas materiais". O ex-materialista encontrou em Deus esse despojamenro.
COMPREENSIVO E HUMANO Garotinho passou a ler a Bíblia com outros olhos.
Embora já conhecesse o Evangelho através das leituras diárias que fez durante anos
para seu avô que não podia ler, foi somente após sua experiência com Deus que
começou realmente a entendê-la "com o coração, e não somente pela leitura".
Nas Escrituras, começou a descobrir a luta de um povo com o qual se identificou:
"Desde o início, esse povo buscava a terra prometida, a justiça.
Era um povo que queria respeito à lei e lutava pela liberdade; um povo que queria
o fim da opressão e clamava por pão. A partir desse conhecimento, eu passei a
ver a minha luta política como uma missão dentro de um caráter evangélico e social".
A mulher de Garotinho, Rosinha, afirma que,
depois de convertido, seu marido ficou mais humano,
compreensivo e confiante de que vale a pena viver
Aos 35 anos de idade e tendo em seu currículo um mandato de deputado estadual e a
prefeitura de Campos, município do norte fluminense onde nasceu, Garotinho iniciou-se
no rádio ainda bastante novo (daí a alcunha Garotinho, que incorporou ao nome).
Aos 15 anos, já participava do movimento estudantil e foi eleito para a Assembléia
Legislativa com 25 anos. Iniciou sua administração em Campos aos 27, e depois foi
secretário de estado no governo Brizola. Segundo diz, sua trajetória foi como um meteoro,
"fazia 300 mil coisas ao mesmo tempo". Sua esposa confirma que ele era muito agitado
e "se atirava nas coisas de qualquer jeito", mas que depois que se converteu passou
a ter um objetivo maior em sua vida, que o faz pensar e agir com mais equilíbrio.
Rosinha acrescenta que Garotinho continua tendo as mesmas atividades de antes.
"mas acreditando mais, com mais certeza de que a vida vai dar certo e de que vale
a pena viver". Casada há 14 anos, ela diz que agora tem um marido mais compreensivo
e humano. Garotinho está freqüentando a Comunidade Evangélica da Zona Sul, e,
sempre que pode. realiza cultos domésticos.
O quase governador Anthony Garotinho vive em uma ampla casa numa sossegada rua do
bairro do Cosme Velho, zona sul do Rio, cercada de verde por todos os lados.
No térreo da Casa funcionam suas empresas, que fazem distribuição de produtos,
edição de livros, jornais e publicidade, além de cuidar do seu programa Show do Garotinho,
que vai ao ar pela Rádio Tupi. O programa é campeão de audiência no seu horário, atingindo,
de acordo com as pesquisas, cerca de 400 mil ouvintes por minuto. Segundo Garotinho, o
programa recebe cerca de 30 mil canas por mês. Os números elevados também estão presentes
em sua vida pessoal: São sete filhos, sendo três adotivos. Garotinho está sempre cercado
de pessoas, sejam empregados ou colaboradores. No entanto, apesar do espaço. não tem
animais de estimação: "Só crio gente", diz, rindo.
E como ele avalia o governo de Marcello Alencar. que o derrotou no segundo turno?
"Segundo penso, é muito mais fácil destruir do que construir. Ele venceu a eleição
com o discurso de destruir o que havia sido feito no governo anteriorm como os Cieps e a
Universidade do Norte Fluminense", dispara. Embora ressalte que torce, como cidadão do
Rio de Janeiro, para que o atual governo acerte. E afirma, convicto: "Eu não preciso
do fracasso dele para ser governador amanhã", sinalizando claramente que pretende
ocupar o Palácio Guanabara a partir de 1999.
Para quem começou tão cedo na política, esperar mais três anos não deve ser tão difícil.