terça-feira, 13 de fevereiro de 1996

De pão também vive o homem

Os cristãos que praticam boas obras por conta própria. Eles não aspiram à fama, tampouco querem reconhecimento público. Suas realizações nao têm apoio oficial e, não raro, são feitas com recursos próprios

Por Carlos Fernandes

Carlos Fernandes

Em todo o Brasil, inúmeros evangélicos têm sido despertados para a necessidade de fazer algo diante da realidade de milhões de pessoas cuja existência o poder público finge ignorar: os chamados excluídos, eufemismo que designa os necessitados, indigentes e abandonados. Nas cidades grandes e do interior inúmeros movimentos são tocados por pessoas cuja motivação é oferecer condições de vida dignas para que a mensagem do Evangelho possa ser recebida. Para essas pessoas, a pregação só se torna legítima quando a mão que leva a Bíblia também serve para amparar.

A solidariedade se manifesta na assistência social, no sustento de pessoas e comunidades, na cooperação com as atividades das igrejas, realização de eventos beneficentes, manutenção de escolas e em várias maneiras em que a fé é expressa na prática de obras e de simples atos de amor. Eles são os discretos que atuam, os anônimos que participam, os heróis do nosso tempo. Ou, simplesmente, são os crentes que fazem.

Carlos Fernandes
Altair instalou uma escola para
crianças faveladas de Duque de Caxias

FORA DO UXO - O engenheiro Altair Cavalcanti Ribeiro, de 38 anos, acredita que a igreja tem sobre si a responsabilidade de intervir nos problemas sociais do nosso país. "Não adianta ficar culpando o governo e não agir", afirma. Com esta motivação, formou um pool de 12 empresas, entre as quais a sua marmoraria. O grupo implantou e sustenta o Jardim Escola Cordeirinho, uma escola maternal e de alfabetização numa das regiões mais miseráveis do estado do Rio de Janeiro: a favela do Lixão, no município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, local onde diariamente centenas de pessoas revolvem montanhas de detritos em busca de restos de comida. A escola funciona na Igreja Presbiteriana Independente, da qual Altair é membro, próxima à favela, e atende 80 crianças, oferecendo ensino básico, educação religiosa, três refeições por dia e uniformes. Também promove passeios e festas para os meninos e meninas que, em sua maioria, só contam com as merendas para se alimentar. Altair acredita que, através das crianças, pode alcançar suas famílias com a mensagem do Evangelho: "Procuramos seguir o que diz a Palavra sobre ensinar às crianças o caminho no qual devem andar, mas, além disso, precisamos dar-lhes condições dignas de vida". Todas as semanas cestas básicas são distribuídas entre os moradores da comunidade. Recentemente, a dona de um centro espírita na favela se converteu ao Evangelho e o transformou no Centro do Espírito Santo, onde atualmente são realizados cultos. Brevemente vai abrigar uma creche. O próximo projeto dessa parceria de empresários é a instalação de um consultório médico-odontológico dentro da favela.

Carlos Fernandes
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O engenheiro José Luiz orienta a
construção de igrejas em Bauru

IGREJAS BOAS E BARATAS -"Qual de vós, pretendendo construir uma torre, não se assenta primeiro para calcular a despesa e verificar se tem meios para a concluir? Para não suceder que, tendo lançado os alicerces e não a podendo acabar, todos os que a virem zombem dele, dizendo: este homem começou a construir e não pôde acabar." Este conselho da Bíblia tem sido seguido pelo engenheiro civil José Luiz Toledo Martins, de 34 anos, casado e pai de dois filhos. Proprietário de uma construtora e de uma empresa de consultoria e assessoria para construção em Bauru, SP, ele observou que as igrejas evangélicas em geral não têm nenhuma noção quando o assunto é construção e obras, e resolveu colocar seus conhecimentos técnicos à disposição dos pastores de sua cidade. José Luiz acha que os evangélicos são mal orientados e acabam desperdiçando dinheiro em obras intermináveis e problemáticas. Ele oferece serviços gratuitos de consultoria, envolvendo projeto, elaboração da planta, cálculos estruturais, relação de material e toda a orientação necessária para a construção ou reforma de templos. Assim, sob a sua direção, várias igrejas têm sido erguidas de maneira rápida e a preço reduzido. Convertido há um ano e meio, José Luiz é membro da Igreja Cristã Renovada e também colaborou na construção de um alojamento para 84 pessoas no centro de recuperação de viciados em drogas Esquadrão da Vida. "Temos que prestar assistência a essas pessoas. Este deve ser nosso propósito", declara o construtor de igrejas.

Carlos Fernandes
Carlos Fernandes
Carentes encontram abrigo e
ouvem a Palavra com o irmã Aracy

CASA, COMIDA E PALAVRA - Uma revelação de Deus lançou Maria Araci da Rosa Paulo no trabalho de assistência a mendigos, desabrigados e pessoas abandonadas. A irmã Araci, como é chamada pelos seus assistidos, conta que teve uma visão em que se encontrava caminhando por uma longa estrada quando surgiu à sua frente uma pessoa maltrapilha que lhe suplicava ajuda. A partir de então, a senhora de 67 anos, Assembléia de Deus e evangélica desde criança, entendeu que sua missão era dar amparo aos miseráveis. Há 17 anos ela começou a construir uma casa de dois andares, onde hoje mora com a família e mais 96 pessoas, que ali encontraram abrigo. "Ser cristão não é só sentar no banco da igreja, não", diz com convicção. O espaço, chamado Casa de Oração, fica no bairro de Beltrão, no município fluminense de Niterói, e tem uma sala onde são realizados três cultos por dia, que contam com a participação dos hóspedes. Entre eles, há desempregados e pessoas que viviam na mais completa indigência. Eles chegam e vão ficando. O andar de cima é repleto de beliches onde dormem os homens - as mulheres ficam em outra parte. Todos tomam café da manhã, almoçam e jantam no local.

Sendo uma mulher pobre, a irmã Araci só encontra uma explicação para o fato de conseguir manter a casa funcionando: "É tudo na base do milagre. Às vezes, aparecem pessoas que fazem doações, Deus multiplica o pouco que temos e dá para todo mundo." Ela não se incomoda em dividir o espaço com desconhecidos: "Deus me mandou fazer isso." Muitos deles se tornaram crentes e ajudam nos trabalhos da casa e na assistência aos outros. "Dentro destes corpos maltratados", diz irmã Araci, "existe uma alma que Jesus quer salvar". Cercada das pessoas.que ali encontraram ajuda, ela tem a satisfação de constatar que sua visão tornou-se realidade.

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