sábado, 2 de dezembro de 1995

Bateu na trave

Chute na estátua da "santa" atinge evangélicos por tabela

Por Omar de Souza

Carlos Fernandes
A imagem da discórdia, reproduzida à exaustão pela mídia nacional

Um ato de intolerância religiosa foi suficiente para deflagrar uma guerra religiosa que nada tem de santa. Na madrugada do dia 12 de outubro, o bispo Sérgio Von Helde, da Igreja Universal do Reino de Deus, chutou a estátua de Maria Aparecida, padroeira católica, diante das câmeras da TV Record. Os golpes dados pelo bispo podem não ter sido suficientemente fortes para quebrar a imagem, mas produziram uma cadeia de efeitos indiretos que colocaram os evangélicos em situação constrangedora. Como, por exemplo, o bispo Renato Suhett, recém-saído da Igreja Universal, que tenta alugar um local para realizar os cultos da igreja que pretende abrir, e só encontra respostas negativas. E, mais: a Igreja Católica capitalizou as repercussões do episódio a seu favor na tentativa de recuperar o prestígio que vem perdendo no país.

Era tudo o que a mídia afinada com as lideranças católicas precisava. No mesmo dia 12 de outubro, o Jornal Nacional, da Globo, mostrou as cenas do programa em que o bispo Von Helde desafiava uma estátua da santa a mover-se enquanto dava leves golpes com o pé na base da imagem. No dia seguinte, vários jornais estamparam na capa a reprodução da imagem da TV. O teor das matérias era sempre o mesmo, sugerindo que a maioria católica brasileira teria se sentido agredida pelos ataques à figura de Aparecida. Diversos líderes religiosos foram consultados, mas o destaque invariavelmente ia para os bispos católicos. Todos falavam do "insulto à padroeira", porém nenhum deles questionava a imposição de um feriado nacional exclusivamente católico num país onde, pelo menos no texto da Constituição, não há religião oficial.

INQUÉRITO - Enquanto religiosos católicos, como dom Aloísio Lorsheider, cardeal-arcebispo de Aparecida, e dom Eugênio Sales, do RR, apontavam o "fanatismo" do pastor da Universal, a igreja comandada pelo bispo Edir Macedo enfrentava problemas em diversas frentes. O presidente Fernando Henrique Cardoso reprovou a "manifestação de intolerância", ainda que se tenha calado quanto ao apedrejamento de um templo da Universal no bairro de Olaria, subúrbio do Rio, e a invasão de outra igreja, em Brasília, por um grupo de manifestantes supostamente católicos, que agrediu os fiéis. Von Helde - que, comenta-se, vai publicar um livro sobre o episódio - foi convocado a depor em inquérito instaurado pelo delegado do 27° Distrito Policial, no bairro do Aeroporto, em São Paulo, acusado de vilipêndio a objeto de culto. A TV Record, comprada pela Igreja Universal; passou a perder anunciantes e profissionais, inclusive o jornalista Chico Pinheiro, editor-chefe do Jornal da Record. Os donos de cinemas e teatros no Rio se recusam a alugar as salas para a realização dos cultos da igreja do bispo Renato Suhett, alegando que os evangélicos são "incitadores à agressividade". A crise levou o bispo Edir Macedo a colocar sua voz no ar para desculpar-se com os católicos, a esta altura falando pretensiosamente sobre a possibilidade de "perdoar" seus detratores. O pastor Ronaldo Didini, que defendeu a atitude do colega no programa 25ª Hora, foi afastado e enviado para a África do Sul.

O chute do bispo prejudicou, por tabela, a comunidade evangélica brasileira que, mesmo compartilhando o repúdio à adoração de imagens de escultura, não concordou com o ato de intolerância. A cúpula católica, por sua vez, contabilizou os golpes do bispo Von Helde como lucro. Há muito tempo não se via tanto espaço dedicado à igreja romana, a mesma que nunca protestou contra um grupo musical paulista chamado Devotos de Nossa Senhora Aparecida, cujo repertório é pródigo em palavrões e baixarias. A Rede Vida de televisão, controlada pelo clero católico, enxergou na polêmica uma grande oportunidade de pleitear mais verbas e aumentar sua área de alcance, no sentido de "combater as seitas evangélicas".


Extraído Intolerância. Revista Vinde, Rio de Janeiro, ano 1995, a. 1, ed. 2, p. 48, abr. 1995.

sexta-feira, 1 de dezembro de 1995

O clarão de fé que incomoda o poder

A Fábrica de Esperança completa seu primeiro aniversário sob as trevas da difamação

Por Marcelo Dutra

Carlos Fernandes
A Fábrica de Esperança foi idealizado pelo Rev. Caio Fábio

No meio do quadro sombrio de violência e miséria que vem sendo pintado da cidade do Rio de Janeiro, um facho de luz se sobressai, acenando com a perspectiva de recuperação dos princípios de dignidade, tal como as cidades-refúgios dos tempos do Velho Testamento. Um dos mais ousados projetos sociais da América Latina passou a significar uma expressiva diferença na qualidade de vida de 180 mil habitantes do complexo de Acari, Zona Oeste do Rio de Janeiro, que está entre os cinco maiores bolsões de violência e miséria do mundo. Debaixo de calúnias dos governantes do Rio, a Fábrica de Esperança festeja seu primeiro aniversário no dia 17 de dezembro, prestando serviços através de 17 projetos comunitários que beneficiam cerca de 200 pessoas por mês com atendimento médico, odontológico e jurídico, sem falar nos diversos cursos profissionalizantes. O sonho de cidadania, que parecia impossível, vira realidade, levando ao pé da letra a afirmação do apóstolo Paulo de que "agora permanecem a fé, a esperança e o amor" (1 Coríntios 13:13).

Para o idealizador da Fábrica de Esperança, reverendo Caio Fábio D'Araújo Filho, 40 anos, que sempre bifurcou seu ministério em evangelização e ação social, é difícil falar de Deus a quem não tem acesso a coisas básicas, como três refeições diárias. "Como pregar o Evangelho para um sujeito que não consegue raciocinar direito e está no limite da resistência humana? É preciso que esta pessoa veja o amor de Deus na prática; só então vamos poder falar de graça e misericórdia", argumenta. Com este propósito, o reverendo fundou a organização não-governamental Vinde (Visão Nacional de Evangelização) que, após 15 anos de atividades, adquiriu maturidade para encarar o desafio de aceitar a oferta dos empresários paulistas Alípio Gusmão e Salo Seibel, proprietários da antiga Formiplac. Os sócios - um presbiteriano e outro judeu - consideraram inviável a retomada das atividades da fábrica após um incêndio que destruiu a quase totalidade das instalações, em 1992.

Carlos Fernandes
A Fábrica de Esperança recebe investimentos
de Viviane Senna (acima) para escola de
informática (abaixo)

PARCERIAS - Foi então que surgiu a idéia de transformar os 55 mil metros quadrados da Formiplac num manancial de bênçãos para os habitantes das 16 favelas que formam o complexo de Acari, região geograficamente exduída dos benefícios sociais, na definição do jornalista Zuenir Ventura em seu livro Cidade Partida. O primeiro obstáculo a nublar o sonho do reverendo Caio Fábio foi a falta de dinheiro. A Vinde, que é mantida por doações voluntárias, não poderia bancar sozinha um projeto daquelas proporções. A solução foi partir para o sistema de parcerias.

Carlos Fernandes

A Xerox do Brasil foi a primeira empresa privada a assinar contratos com a Fábrica, investindo em escolas de treinamento técnico e oficinas profissionalizantes. Recentemente, inaugurou um projeto orçado em 60 mil dólares para treinar e capacitar adolescentes e adultos no desmonte e recuperação de máquinas copiadoras. O Instituto Ayrton Senna investirá, nos próximos três anos, cerca de 210 mil dólares na escola de informática. Atualmente funcionam três laboratórios de informática com cerca de 560 alunos. Para Viviane Senna, presidente do Instituto Ayrton Senna e irmã do piloto brasileiro morto em maio do ano passado, estes cursos são importantes porque dão oportunidade de trabalho aos adolescentes que só seriam engraxates, catadores de papel, camelôs ou até mesmo aviões do tráfico.

Outra parceira de expressão é a indústria de refrigerantes Pepsi. A idéia é simples: a Vinde fica responsável pela venda dos refrigerantes desta marca em igrejas evangélicas cadastradas e parte do lucro é repassada à Fábrica de Esperança. Dezenas de outras parcerias oferecem uma série de oficinas que vão desde cursos de sapateiro e cabeleireiro até o de teatro. Uma creche abriga 50 crianças da comunidade, que tem a terça parte de seus habitantes formada por meninos e meninas de zero a 14 anos.

Carlos Fernandes
Adolescentes trocam a ociosidade na favela por
treinamento nas oficinas profissionalizantes da Xerox

Vários segmentos do setor empresarial estão atentos aos progressos do empreendimento social da Vinde e mostram-se interessados em participar. Em reunião da Câmara de Comércio Americana para o Brasil, no Rio, em outubro, o empresário Sérgio Andrade de Carvalho, construtor de shopping centers do porte do Nova América Factory Shopping, no Rio, manifestou seu contentamento com o trabalho feito pela Fábrica de Esperança. "O mais difícil para um empresário é ter o equilíbrio entre o sonho e o poder de realização, e o reverendo Caio Fábio tem isto 'na medida cerca", elogiou o empresário engajado em obras sociais no Rio.

Motivos para comemorar o primeiro aniversário não faltam. A meta é de que 70 serviços estejam na linha de montagem da Fábrica dentro dos próximos três anos. "Se é para concretizar a esperança, as parcerias são bem-vindas", sinaliza a supervisora geral da Fábrica, Cristina Christiano. No dia 18 de dezembro, um culto em ação de graças reunirá pastores, empresários, funcionários e jornalistas nas dependências da Fábrica de Esperança. Mas a festa mesmo é dos cidadãos de Acari.

Os telefones da esperança A partir de agora todas as doações à Fábrica poderão ser abatidas no Imposto de Renda. As doações podem ser feitas através do sistema automático Disque-Esperança.

  • Disque 0900-7850-05 para doar RS 5
  • Disque 0900-7850-10 para doar RS 10
  • Disque 0900-7850-20 para doar R$ 20
Carlos Fernandes
Fernando Henrique assinou decreto
transformando a Fábrica de Esperança
em empresa de utilidade pública federal

Utilidade pública federal e estadual Júlio Cézar de Souza tem 13 anos e mora com o pai, a madrasta e mais quatro irmãos na favela Parque União, próxima a Acari. Trabalhava como ajudante de pedreiro para reforçar o orçamento doméstico, mas agora é um dos alunos do curso de informática da Fábrica de Esperança e sonha em ser digitador. "Estou tentando melhorar de vida, talvez consiga arrumar um bom emprego no futuro", diz.

A Fábrica de Esperança é um oásis na vida de milhares de famílias, sobretudo por levar a mensagem do Evangelho àqueles desfavorecidos pela sociedade. Tem feito isto seguindo um antigo, mas atualíssimo conselho de Jesus no sermão do Monte das Oliveiras: "Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Deus que está nos céus." Na área social, a Fábrica vem se tornando uma referência na batalha pela recuperação do conceito de cidadania. Além de um tribunal de pequenas causas, que já está em funcionamento, ela conta com o Centro Comunitário de Defesa da Cidadania. Só no mês de setembro, o CCDC contabilizou 6 mil atendimentos, providenciando documentos como certidões de nascimento, carteiras de identidade e certificados de óbito.

Recentemente, a Fábrica de Esperança recebeu um grande incentivo para seu sustento. No dia 23 de agosto, o presidente Fernando Henrique assinou um decreto considerando-a de utilidade pública federal. Em seguida foi a vez do governador do Rio, Marcello Alencar, sancionar projeto de lei dedarando-a entidade de utilidade pública estadual. Os atos permitem à Fábrica receber incentivos financeiros dos governos federal e estadual, além da concessão de subvenções para cobrir despesas de custeio.

Extraído Solidariedade. Revista Vinde, Rio de Janeiro, ano 1995, a. 1, ed. 2, p. 53-54, dez. 1995.

As doze 'marcelladas'

Ao atacar a Fábrica de Esperança e seus organizadores, antes mesmo da conclusão de qualquer investigação, o governador Marcello Alencar cometeu 12 falhas:

Carlos Fernandes
Marcello enganou o reverendo Caio, dizendo que não tinha nada contra a Fábrica
  1. Diz ter recebido informações sobre o uso ilícito da Fábrica de Esperança, em janeiro deste ano, mas não tomou providencias durante mais de 11 meses, acompanhando inclusive o presidente da República em visita às suas instalações;
  2. Disse ao prefeito César Maia que as crianças levam e trazem drogas desde janeiro, mas as primeiras crianças entraram na Fábrica apenas no final de maio;
  3. Disse que os titulares da Fábrica estavam construindo um projeto de milhões de dólares, usado como fachada para guardar apenas dois quilos de cocaína;
  4. Cobrou dos responsáveis pela Fábrica que dessem total garantia de que não haveria mais invasões furtivas de bandidos que vivem na favela vizinha à Fábrica, esquecendo-se que o Estado, com todo seu aparato, não tem sido capaz de coibir com eficácia as ações dos criminosos;
  5. Afirmou que os vigilantes da Fábrica obstruíram a entrada dos policiais, mas os portões da Fábrica estavam abertos e o vigilante apenas disse que iria informar o fato à administração;
  6. Declarou que os policiais invadiram a Fábrica porque sistematicamente os administradores impediam a entrada da polícia, esquecendo-se de que uma das sete entradas da Fábrica é guardada por dois policiais militares, 24 horas por dia, no Centro Comunitário de Defesa da Cidadania. A chave desse portão fica em poder do administrador daquele órgão do governo;
  7. Exigiu impecabilidade da vigilância da Fábrica de Esperança, quando os policiais do Centro de Defesa da Cidadania estavam mais próximos do local onde a droga foi encontrada, do que os vigilantes da Fábrica;
  8. Acusou os diretores da Fábrica de transigirem com os bandidos, esquecendo de que o muro construído pela Fábrica de Esperança - com 4 metros de altura por 3,50 de comprimento - é reto, ao contrário do muro construído em zigue zague pela Prefeitura do Rio, por conta de ação do tráfico de drogas. O próprio prefeito César Maia declarou em artigo publicado nos jornais que o poder público tem tido eventualmente que negociar com traficantes a construção de obras públicas;
  9. Acusou a administração da Fábrica de Esperança de tentar desvalorizar a investigação policial, ao criar uma comissão de sindicância interna, esquecendo-se de que tal iniciativa apenas denota o desconforto no qual os diretores do projeto se viram, antes as declarações precipitadas do governador de que o local era "depósito e ponto de distribuição de drogas". O governador sugeriu até que os diretores "arrumem seus culpados";
  10. Acreditou que a Fábrica de Esperança era um lugar de ilícito penal, mas ainda assim sancionou o projeto de lei transformando a Fábrica em entidade de utilidade pública estadual, em data posterior à sua conversa com o prefeito, que lhe teria feito denúncias sobre a Fábrica;
  11. Iludiu o reverendo Caio Fábio, em encontro no Palácio Guanabara, no dia 12 de julho deste ano, dizendo-lhe que não tinha nada contra o reverendo, exaltando as atividades da Fábrica, aceitando receber uma oração em seu favor e dizendo, ainda, que gostaria de visitar a entidade para conhecer seus projetos. Na verdade, já havia afumado diversas vezes, inclusive ao prefeito, que supunha haver atividades irregulares na Fábrica de Esperança;
  12. Acusou peremptoriamente a Fábrica de Esperança de ser depósito e centro de distribuição de drogas, sem saber que, no mesmo dia, durante as diligências policiais nas dependências da Fábrica, cerca de 15 policiais que participaram da operação pediram para almoçar no restaurante da instituição, comendo assim comida que pretensamente teria sido comprada com dinheiro ilícito.

Um chute na Fábrica de Esperança

Governador do Rio, Marcello Alencar, faz acusações aos responsáveis pelo maior projeto social do país

Por Carlos Fernandes


Carlos Fernandes
A passeata Reage Rio solidarizou-se com o drama vivido pela Fábrica de Esperança

Como se usasse uma boca com biqueira de metal, o governador do Estado do Rio, Marcelo Alencar chutou sem piedade a Fábrica de Esperança, o megaprojeto social da Vinde (Visão Nacional de Evangelização) e um dos símbolos do movimento Viva Rio, contra a violência e pela recuperação econômica e social do Rio. A apreensão de drogas numa área isolada da Fábrica, em Acari, no dia 23 de novembro, foi usada pelo governador, como um pretexto para atacar duramente os responsáveis pelo projeto social. Marcello lançou suspeitas sobre a idoneidade dos organizadores, afirmando estar convicto de que o local serve de fachada para depósito e distribuição de drogas. Irônico, chegou a chamar o projeto de "fábrica da desesperança".

A atitude do governador foi classificada dc "leviana, irresponsável e precipitada" pelo reverendo Caio Fábio D' Araújo Filho, idealizador do projeto, que se revelou perplexo com a reação de Marcelo Alencar. Em entrevista coletiva, no dia seguinte, Caio mostrou-se triste e afirmou que sua intenção nunca foi a de "bater de frente" com o governo do Estado. "O governador foi, no mínimo, precipitado, pois fez declarações antes de as investigações estarem conduídas", disse o reverendo. Ele desabafou, dizendo que o projeto é sério e lamentando que os traficantes possam ter escondido "essas porcarias" dentro da Fábrica. Ele admite que, por estar no meio de uma região perigosa ("aquilo é um barril de pólvora", afirmou), a Fábrica de Esperança está exposta a todos os tipos de riscos, inclusive a ação das quadrilhas da região. O fato de a apreensão ter ocorrido dias antes da passeata Reage Rio levou o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, a imaginar que tudo pode ter sido "uma armação" com a intenção de esvaziar o movimento.

Apoios - Ao contrário da imagem da santa que não pode reagir, a sociedade civil respondeu prontamente às acusações do governador. Representantes de todos os segmentos da sociedade - entre religiosos, sindicalistas, políticos e organizações não-governamentais - deram apoio ao reverendo Caio Fábio e aos diretores da Fábrica de Esperança. manifestando repúdio à intenção do governador de tentar vinculá-los ao tráfico de drogas. Quatro dias depois dos dardos do governador, mais de quinhentas pessoas participaram de ato público em apoio à Fábrica. O antropólogo Rubem César Fernandes, coordenador do movimento Viva Rio e um dos organizadores da passeata, disse que Caio Fábio "é um homem rigoroso e está acima de qualquer suspeita". A senadora Benedita da Silva (PT-RJ), acusou Marcelo Alencar de investir no caos num momento em que a sociedade se une para pedir mais segurança. Benedita considerou um absurdo suspeitar-se que o reverendo Caio Fábio, pastor evangélico há 22 anos - reconhecido internacionalmente como um sacerdote engajado em ações sociais - tenha qualquer envolvimento com o tráfico de drogas.

O sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, presidente do Ibase e símbolo nacional da luta contra a fome e a miséria, solidarizou-se com o trabalho desenvolvido pela Fábrica de Esperança, considerando que ele é realizado "em condições excepcionais e em meio à mais profunda miséria". O reverendo Caio Fábio começou a receber centenas de mensagens de apoio vindas de todo o país e os jornais publicaram cenas de solidariedade ao seu trabalho e de repúdio às declarações do governador. Numa delas. Marcelo afirmou que as organizações não-governamentais devem se livrar de "aventureiros com capa de generosidade". Os parceiros da Fábrica demonstraram total solidariedade e manifestaram claramente a intenção de manter seu apoio. Representantes da Xerox do Brasil, Golden Cross e Curso Yázigi reafirmaram sua confiança nos responsáveis pela Fábrica, e confirmaram que todos os convênios em andamento serão integralmente mantidos. Viviane Senna, que estava no Japão, telefonou para informar que vai manter seus projetos.

Boa parte da opinião pública está convencida de que o governador teve a intenção de dar o maior destaque possível ao caso, numa tentativa de enfraquecer a passeata Reage Rio que, entre outras coisas, colocaria em xeque a política de segurança do Estado, num momento em que se evidencia o recrudescimento da violência. Segundo estatísticas do Instituto Médico Legal - IML -, o número de assassinatos no Estado do Rio, de janeiro a novembro, chegou a 4.269, numa trágica média de 12 homicídios por dia. Até outubro, a Secretaria da Segurança Pública contabilizou 88 sequestros, ao mesmo tempo em que cerca de 160 crianças estão desaparecidas. Entre assaltos a bancos, roubos e furtos de carros e cargas, foram registrados mais de 33 mil, deixando clara a ineficiência do governo do Estado do Rio no controle da violência.

Providências - O reverendo Caio Fábio anunciou providências imediatas, como um levantamento completo sobre todos os funcionários da Fábrica, inclusive de seus antecedentes, na tentativa de descobrir qualquer envolvimento ou eventual conivência de algum deles com as atividades dos traficantes do complexo de favelas da região. Uma comissão de sindicância interna foi instalada. Além disso, a segurança vai ser terceirizada e ampliada. Até então, havia apenas 16 homens em três turnos, para vigiar uma área de 55 mil metros quadrados. Lembrando que é "o maior interessado em que tudo seja esclarecido", Caio Fábio recorreu ao Ministério Público para investigar minuciosamente o ocorrido. Com relação às acusações de Marcelo Alencar, o reverendo explicou que esperará a conclusão das investigações para decidir que providências tomará, mas a possibilidade de interpelar judicialmente o governador não está afastada. "Uma coisa é certa: eu não vou agir da mesma forma precipitada que o governador está agindo", afirmou. Caio Fábio estranhou ainda o fato de o governador e o prefeito terem afirmado que já tinham suspeitas a respeito das atividades da Fábrica. "Se era assim, por que eles não nos avisaram?"

Dizendo que sua função não é policialesca - "nós não perguntamos quem são os pais das crianças e jovens que se beneficiam do nosso trabalho" o reverendo criticou o governador por não controlar a entrada de drogas no Estado.

A ameaça de Marcelo Alencar, que dedarou que a Fábrica de Esperança poderia até ser fechada em consequência do episódio, foi desaprezada pelo reverendo, que lembrou que o projeto não é um órgão governamental e não pode ser desativada pela vontade do governador. Ele reafirmou sua expectativa de que o movimento Reage Rio atingiria plenamente seus objetivos. "Se alguém pensou que ia desmobilizar a manifestação, o tiro saiu pela culatra; caminhamos unidos pela paz nas ruas", disse o pastor após participar do Reage Rio, que parou a cidade no dia 28 de novembro.

Uma força de paz em território minado

Por Zuenir Ventura

Carlos Fernandes
Zuenir: apoio total à Fábrica

A experiência da Fábrica de Esperança é um projeto pioneiro. E uma força de paz no "front" da guerra. Equivale àquelas operações da Cruz Vermelha, no meio do fogo cruzado. Além de vidas, a Fábrica de Esperança também quer salvar almas. Não quer apenas retirar as pessoas da linha de frente, mas dar a elas condições de viver com o mínimo de dignidade. A fábrica combate o bom combate. Quer transformar futuros soldados dessa guerra suja em grandes cidadãos. Eu digo isso com tranquilidade e total isenção porque acompanhei o projeto da Fábrica desde o começo.

Devo ter sido um dos primeiros a descobrir que estava acontecendo ali em Acari, numa das regiões mais áridas do Rio, uma história de esforços reais em favor da paz. Sou testemunha também de que a Fábrica foi madrinha do belo casamento entre a economista Clarice Pechman, fundadora do movimento Viva Rio, e Salo Seibel, do PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais), um dos sócios da Formitec, que doou à antiga fábrica ao pastor Caio Fábio. A Fábrica é o maior monumento à paz, à reconstrução da cidade, que já foi feito. Não conheço no país outro projeto social com essas dimensões. Mas a Fábrica não é apenas um marco simbólico do Viva Rio. Se fosse só simbólico, já seria bom. Mas, melhor ainda, é uma ação concreta que supre a ausência do poder público, numa área conflagrada.

Outro dado interessante nesse projeto é a participação dos evangélicos, representados pelo pastor Caio Fábio. Antes de conhecer o trabalho dele, na Fábrica, eu tinha uma visão maniqueísta sobre os evangélicos. Para mim, os movimentos dirigidos por eles eram todos suspeitos. Ali tive uma grande revelação. Comecei a descobrir o conteúdo social do projeto. Ao escrever Cidade Partida, me desfiz de muitos estereótipos que são reproduzidos por nós mesmos da imprensa. Um deles era a participação dos evangélicos em obras sociais. A Fábrica me revela o que é uma força de paz num território minado, em pleno centro urbano do Rio de Janeiro.


Zuenir Ventura, 64 anos, é escritor e jornalista há 39 anos. Colunista e editor especial do Jornal do Brasil, contou uma parte da história da Fábrica de Esperança no livro Cidade Partida, da Companhia das Letras.



Tempos de otimismo prudente

Por Manoel Fidalgo


Chico Ferreira/ Editora Três

Vivemos um momento em que o empresariado, de um modo geral, vem encontrando muitas dificuldades devido às regras impostas pelo Plano Real. Não questiono a meta do dito plano. Porém, não me parece muito apropriado o método utilizado na administração pública, que tem levado nosso país a sérias dificuldades. Vejamos alguns pontos importantes, que precisam ser abordados para entendermos o principio, o meio e o fim desta transição econômica e financeira do Brasil.

Desde que tomamos conhecimento da intenção do atual governo de mudar a política econômica e financeira, percebemos que se tratava de um projeto arrojado que, por certo, exigiria do povo um enorme esforço, devido à real necessidade de combater o principal vírus do problema, chamado inflação - que é, sem dúvida, o elevado custo da inflacionária máquina administrativa governamental. Enquanto houvesse abertura total das. torneiras da administração pública, assistiríamos a grandes problemas, na medida em que, quanto mais aquela máquina necessitasse de recursos, maior seria a emissão de dinheiro. Esta era, sem dúvida, a grande causa da desvalorização diária de nossa moeda.

"A escassa liquidez torna cada dia mais árdua a tarefa de manter os níveis de produção e escoamento."

Outro ponto importante se refere às taxas de juros, que têm assolado as empresas no mercado brasileiro em função da escassez do próprio dinheiro no mercado. Tais taxas, cuja prática gera o famoso compulsório, tornam a moeda forte mas, por outro lado, difícil de ser adquirida. A escassa liquidez torna cada dia mais árdua a tarefa de manter os níveis de produção e escoamento. É difícil de acieditar, mas, a despeito da inflação quase zero — e mesmo da eventual deflação —, recorrer ao crédito bancário é algo assustador.

Recentemente, quando estive num banco para realizar uma operação financeira de minha empresa, fui avisado pelo gerente de que a taxa para desconto antecipado de duplicatas era de 8,5% ao mês, o que significava uma taxa efetiva de quase 10% no mesmo período. Em outra ocasião. encontramos a oferta de contrato de capital de giro pelo prazo de 60 dias com garantia de 130% em duplicatas e taxa final de 11% ao mês. Mais desesperador ainda é o cheque especial, que está fazendo um número cada vez maior de vítimas entre pessoas físicas e jurídicas devido às exorbitantes taxas de juros, entre 12% e 15%, tornando-se, sem dúvida, o maior e mais rendoso negócio para os bancos.

No entanto, nem tudo está perdido. É possível perceber uma suave reação no consumo. Acreditamos que o pior já passou e, com a aproximação das festas natalinas, haverá reaquecimento da Marcos Cruz economia. Porém, é preciso cautela. No Brasil de hoje não se permite abusos e sonhos arrojados na administração empresarial e mesmo na familiar. Precisamos entender que, se quisermos um país robusto, com uma economia forte e moeda aceitável em todo o mundo, temos que pensar no amanhã, resguardando economias para o futuro. Portanto, irmãos, sejamos firmes e constantes.


Manoel Fidalgo é empresário do setor de autopeças e pastor batista.

Humor

Carlos Fernandes

Por uma nova Reforma


Por Ricardo Gondim

Nasci num lar de católicos tipicamente nominais, daqueles que pouco vão à igreja e transitam sem muita dificuldade por centros espíritas e cartomantes. Fiz minha primeira comunhão, como a maioria das crianças brasileiras, para desincumbir a família das obrigações sociais. Nesse ambiente, familiarizei-me com uma linguagem ecumênica.

Minha infância foi cheia de medos. Vez por outra, entreouvia conversas sobre almas penadas. Naquelas noites, com certeza, perdia o sono.

Converti-me numa Igreja Presbiteriana. E que alívio. Logo habituei-me com uma linguagem totalmente nova. Os conteúdos da mensagem evangélica significaram valores profundamente libertadores para mim. Primeiro, aprendi que a salvação não depende diretamente de mim, ela aconteceu no Monte Calvário, há quase dois mil anos. Pela fé nos méritos expiatórios de Cristo, eu podia ter certeza de minha salvação. Depois, soube que o mundo dos mortos não é angustiante. O destino eterno das pessoas vai selado pela decisão de aceitar ou rejeitar o dom gratuito de Deus. Quão glorioso foi para mim viver sem o constante assédio das almas penadas do meu imaginário. Foi-me apresentada uma mensagem na qual Cristo reinava sobranceiro, gloriosamente entronizado como Senhor dos senhores. Naqueles dias de neófito, o Senhor era meu tudo, e a vida cristã, uma alegria contagiante.

Passados mais de 25 anos, a igreja mudou muito. Estarrecido, deparo-me com uma Igreja Evangélica carente de intermináveis correntes para alcançar o favor de Deus. Medrosa de maldições, essa Igreja precisa constantemente quebrar encantos. Incerta quanto ao soberano controle de Deus, nomeia paranoicamente a atuação de demônios que precisariam ser amarrados para não manipularem nossa história. Aturdido, vejo essa Igreja reelaborando a água benta da minha infância, com o nome de água fluidificada. Isso para não falar do sal grosso, dos ramos de arruda e de uma longa lista de superstições praticadas em nome da fé evangélica.

"Influenciada por uma concepção materialista, a igreja Evangélica brasileira tem se lançado numa busca desenfreada para alcançar multidões, sem se importar como"

Alguns tentam explicar esses acontecimentos como sincretismo. Diante da rápida expansão dos evangélicos e seu lamentável enfraquecimento doutrinário, a igreja teria, inconscientemente, incorporado valores da religiosidade popular. Não creio assim. Penso testemunharmos um fenômeno puramente mercadológico. A fim de alcançar as massas em um tempo mínimo, apela-se para atalhos não evangélicos. Influenciada por uma concepção materialista e enxergando no crescimento numérico um fator divino, a Igreja Evangélica tem se lançado numa busca desenfreada para alcançar as multidões, sem se importar como. Assim, princípios fundamentais da fé vão sendo deixados de lado. Importa hoje ocupar espaços físicos, mostrar-se visível. Infelizmente, em alguns momentos, essa visibilidade tem sido prejudicial.

A apropriação desses valores da religiosidade popular é desonesta. Parecemos com católicos e espíritas, não porque os admiramos, mas para cooptar seus fiéis. Esse adultério brasileiro dos princípios da fé cristã agrava o coração de Deus, gera cristãos sem conversão genuína e, pior, é antiético.

A Igreja Evangélica brasileira deve lembrar-se de onde caiu, arrepender-se e voltar à prática das primeiras obras (Apocalipse 2:5). É tempo de voltar à Bíblia. Buscar uma nova Reforma. Quando a igreja medieval naufragava no lamaçal das indulgências, Deus levantou Maninho Lutero, conclamando o povo ao Sola Scriptura. Basta de invencionice humana somente para atrair multidões. A mensagem dos nossos púlpitos deve voltar a ser }astreada pela graça. As pessoas não precisam fazer mais nada para alcançar o favor de Deus.

Deus é por nós. As forças diabólicas não nos atormentam. Cristo já derrotou a perigosa serpente. Agora é possível descansar em Seu amor. Não há mais demônios a serem amarrados, "pois tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, cravando-o na cruz. E, despojando os principados e as potestades publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz" (Colossenses 2:14-15).

Que a igreja abandone urgentemente qualquer obsessão mercadejadora da fé e volte ao caminho do discipulado. Assim, pode ser que não se impressione com superlativos numéricos e cumpra sua vocação de ser sal e luz. Soli Deo Gloriae.


Ricardo Gondim é presidente da Fraternidade Teológica Latino-americana no Brasil e pastor da Igreja Betesda em São Paulo

Os caiuás entre a cruz e o suicídio

Missionários garantem fazer mais pelos índios do que se imagina

Por Danielle Franco, de Dourados (MS)

Maria Inês Noronha
Os índios recebem assistência médica e espiritual dos missionários

Um estranho fenômeno social verificado na reserva indígena caiuá, localizada na cidade de Dourados, distante 210 quilômetros de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, pôs em cheque a presença dos missionários na região. A informação sobre o crescimento no número de suicídios entre os jovens da tribo, dada em tom de alarme por alguns jornais, veio acompanhada de uma suspeita: a de que os evangélicos estariam aculturando os índios e provocando neles um enorme sentimento de culpa depois de suas conversões ao Evangelho de Jesus Cristo. A explicação sensacionalista serve como camuflagem para o problema real. Sem dinheiro e emprego, os índios não-convertidos mergulham no alcoolismo e na depressão suicida. De origem nômade, os caiuás, agora confinados na reserva, têm dificuldades para se adaptar a uma economia voltada para o plantio e a criação de animais. Até a Funai tem se manifestado contra a presença de missionários nas tribos, a ponto de criar instruções normativas que impedem a entrada de evangélicos nas comunidades mais isoladas. Para quem vive nas reservas a realidade é outra. De acordo com o vice-capitão Narciso Daniel, que é evangélico, todos os jovens que se mataram estavam envolvidos com alcoolismo e sem emprego fixo. Na opinião dele, essa desesperança é justamente a falta de intimidade com a Palavra de Deus. "Quando o índio se converte, ele pára de beber e de fumar, se volta para a família", defende. "O Evangelho não tira a cultura do índio. Ele sabe guardar o que é bom."

O professor de ensino religioso para crianças da aldeia, Isaque de Souza, compartilha da opinião. Ele conta que já passou por esse problema. "Eu também pensei em me matar quando era mais novo. Me sentia muito mal porque, além de pobre, era índio, e a gente se sente muito discriminado por isso. Quando me converti, entendi o quanto que eu era especial para Deus. Então, resolvi estudar e ser missionário. Os índios precisam, e muito, de ser evangelizados. A mensagem do Evangelho não leva o índio ao suicídio. A ideia surge justamente pela falta dele", conclui.

Na realidade: o maior desafio dos missionários tem sido acabar com a crescente onda de mortes, proporcionando a eles uma nova opção de vida. O trabalho da Missão Caiuá, que fica ao lado da reserva, não é novo. Ela foi fundada no início do século pelo missionário americano Albert Maxwel, e há 11 anos é dirigida pelo pastor Benjamim Bernardes, da Igreja Presbiteriana do Brasil, que mora na reserva com a mulher e duas filhas.

Maria Inês Noronha
A educação é uma das armas contra o desemprego na tribo

O pastor Benjamin explica que o atendimento à tribo nas áreas de saúde, educação, cultura e, principalmente, evangelização, fez com que os índios caiuás ficassem conhecidos como "a tribo que não morreu". Isso porque quando a missão iniciou seu trabalho na reserva, a tribo era formada por quatro mil pessoas. Hoje, devido a todos os trabalhos desenvolvidos pelos missionários, o número cresceu para nove mil. Mesmo diante desses resultados, os missionários têm sido impedidos pela Funai de entrar nas reservas mais isoladas. O argumento para o impedimento é sempre o mesmo: a destruição da cultura através da evangelização.

Um exemplo de que o evangelho não destrói a cultura indígena é o trabalho desenvolvido pelo caiuá Dorival da Silva. Formado pela escola bíblica da Missão Caiuá, ele dirige cultos evangelísticos dentro da aldeia. "Seria bom se mais pessoas viessem para me ajudar na evangelização. Esse trabalho é muito importante. A conversão afasta o índio da bebida, que provoca muitas brigas nas famílias. Outro dia, um índio chegou em casa bêbado, brigou com a mulher e tocou fogo na sua casa. O índio que é crente não faz isso, porque ele sabe que não pode beber", esclarece.

Maria Inês Noronha
Família do missionário caiuá Dorival da Silva: harmonia entre o Evangelho e a cultura indigena

Funai restringe trabalhos missionários nas reservas

As relações entre as missões evangélicas e a Funai sempre foram delicadas. Mas isso se tornou mais evidente a partir dc 1994, quando o órgão publicou no Diário Oficial do dia 8 de abril duas instruções normativas, onde vários artigos restringem ou vetam ações missionárias nas reservas. Uma das decisões que mais tem preocupado as missões está na norma de instrução número 2, artigo 7, capítulo IX, que diz: "O material didático produzido pela missão/instituição religiosa deverá ser submetido ao departamento de educação e a utilização dos materiais bilíngües para veiculação de textos bíblicos nas áreas indígenas, não serão autorizados".

Trabalhando na tradução do Novo Testamento para a língua caiuá desde 1969, a antropóloga cristã americana Loraine Irene Bridgman decidiu conhecer e estudar a cultura indígena por ter a convicção de que a mensagem do Evangelho deve ser levada a todos os povos. Atualmente sem licença da Funai para entrar nas reservas, ela está morando na Missão Caiuá e, com a ajuda do índio Xisto Sanches, está traduzindo o livro de Salmos. 'Eu sei que o mundo não quer que o Evangelho chegue a nenhum lugar. Então, se as pessoas não compreendem a importância desse ministério, elas não deveriam impedir o trabalho. Não é assegurado por lei a liberdade de religião?", questiona. Em relação às críticas de que o trabalho missionário acultura os índios, Loraine é categórica: "A conversão ao cristianismo gera transformação, mas para uma vida nova. Isso não significa que você vai deixar de ser você mesmo. Eu não deixei de ser americana, portanto, o índio não deixará de ser índio", argumenta.

Atualmente, a maior preocupação da antropóloga é dar continuidade ao trabalho de tradução da Bíblia. Com 69 anos, teme não ver seu projeto terminado, principalmente depois das normas impostas pela Funai. "Estou orando para que Deus levante pessoas comprometidas com o trabalho missionário. Os povos indígenas também precisam de salvação", alerta.

Surpreso também com essa iniciativa, Carlos Terena, que atualmente trabalha no Departamento de Comunicação da Funai, desabafa: "Quando me converti, passei a ter amor próprio e a me reconhecer como um povo diferente, como Terena. índios, como vocês nos chamam. Senti uma razão maior para viver até quando losko'oviti me chamar". Sua preocupação vai mais além. "Onde está o nosso direito universal como seres humanos, criados à imagem e semelhança de Deus, com a liberdade de conhecer a verdade em nossa língua? Aceitarmos ou não, é outra questão. Ninguém tem o direito de nos restringir, patrulhar ou decidir o que é melhor para nós através de normas de gabinete. Hoje, o governo oficializa essa situação conosco. Quem sabe não é um precedente para que se faça isso com os evangélicos não-índios amanhã? Até este momento, as missão que sempre tiveram um trabalho sério, respeitado e organizado são as que estão sendo atingidas", denuncia.

Procurado pela revista para esclarecer essa determinação, o presidente da Funai, Márcio Santilli, não respondeu ao fax que foi enviado.


Os teimosos preços que sobem

Por Emílio Gargalo


Chico Ferreira/ Editora Três
Não há plano que segure os preços altos,
que afugentam a freguesia dos restaurantes

Todo mundo percebe que a maioria dos preços não tem subido desde a implantação do real. Mas alguns preços não querem ajudar e sobem de forma assustadora. Esse é o caso de cabeleireiro, restaurante, médico, engraxate, lava-rápido, estacionamento e outros que o leitor conhece bem.

Por quê? Basicamente porque há produtos facilmente substituíveis e outros que, ou não se pode substituir, ou a substituição só se dá a médio e longo prazo. Se o preço da margarina sobe, a gente compra manteiga. Se a manteiga sobe, pode-se trocá-la por geléia. E, se todos subirem ao mesmo tempo, alguém importa os três e os preços têm que baixar. Isso vale para automóveis, balas, arroz, bicicletas, em suma, qualquer produto que se possa substituir rapidamente ou se possa importar para fazer concorrência.

Para os serviços, isso é praticamente impossível no curto prazo. Como substituir o seu médico de confiança, de tantos anos, que dobrou o preço da consulta? Isto exigiria uma longa pesquisa, e pode ser que a gente abra mão de um luxo qualquer para manter aquele médico. E os restaurantes? Levaram os preços para as nuvens. Só que, com isso, tornaram o seu negócio tão rentável que muitos outros se interessarão em abrir restaurantes. Mas isso demora. Construir casa, decorar, encontrar cozinheiros, garçons, gerente etc. Talvez alguns meses entre o momento em que se percebeu que a atividade pode ser altamente lucrativa, tomar a decisão e implementar o negócio.

Porém, ao longo do tempo, outros restaurantes surgirão e aqueles primeiros terão que baixar os preços para recuperar os fregueses. Outra alternativa, no caso dos restaurantes, quando os preços sobem muito, é parar de frequentá-los. Lentamente, os fregueses vão percebendo os preços muito altoe e simplesmente reduzem ou eliminam as idas a restaurantes. Com a redução no faturarnento, os restaurantes começam a fazer promoções do tipo mulher acompanhada não paga, cardápio executivo de segunda a sexta, etc.

Portanto, há que se substituir os substituíveis e usar em escala mínima os serviços que não se pode substituir, esperando que, ao longo do tempo, voltem ao normal.

Isso é normal nos processos de estabilização de economias altamente inflacionárias, e foi observado em todos os países que lograram a estabilização.

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Emílio Gargalo é bacharel em Economia pela PUC-SP e sócio-diretor da MCM Consultores Associados S. C Ltda.

Um voto de confiança em Deus

Garotinho conta como escapou da morte e aceitou o Evangelho

Por Carlos Fernandes

Fotos de Frederico Mendes

Chico Ferreira/ Editora Três

O que poderia ter sido uma tragédia acabou trazendo salvação. Anthony Garotinho encontrou-se com Cristo após ver a morte de perto e, no leito do hospital, elegeu-o como Senhor de sua vida. No auge da campanha eleitoral para o governo do Estado do Rio, Garotinho dirigia-se para Volta Redonda (RJ), onde faria um importante comício, quando o Tempra em que viajava foi fechado na via Dutra, saiu da estrada e capotou três vezes. A violência do impacto foi tão grande que o arremessou pelo vidro traseiro do carro.

O acidente não poderia ter vindo em pior hora, pois precisamente naqueles dias - corria o mês de setembro de 1994 - o Ibope anunciava o empate técnico entre Garotinho, que concorria pelo PDT, e o candidato do PSDB, Marcello Alencar.

No hospital da Companhia Siderúrgica Nacional - para onde foi removido pelos Anjos do Asfalto, um grupo de paramédicos do Rio - foi constatada fratura múltipla do braço direito. Durante a cirurgia, que durou cinco horas, Garotinho recebeu uma placa de platina, dez parafusos e enxerto ósseo. A intervenção foi bem-sucedida, mas a situação parecia representar o fim de suas pretensões eleitoriais: "O médico me disse que eu ficaria impossibilitado de fazer campanha naquele primeiro turno, e estávamos a poucos dias da eleição. Além do braço imobilizado, eu não poderia caminhar direito pelo menos por 15 dias, porque me tiraram uma lasca do osso ilíaco para recompor o osso do braço", lembra Garotinho. "Embora entendesse que eu vivia um momento importante da minha vida, o doutor foi sincero e falou que eu deveria dar graças a Deus por estar vivo pois, pelo estado do carro, a tragédia deveria ter sido bem pior".

O calvário de Garotinho começou numa sexta-feira. Internado no hospital da CSN, ele estava completamente incapacitado. Não andava e nem tomava banho sozinho, justamente no momento mais crucial de sua vida política, com grandes chances de tornar-se governador do Rio de Janeiro. "Naqueles dias, eu estava muito feliz com o resultado das pesquisas, que me colocavam junto ao primeiro colocado", lembra. Na época, chegou-se a suspeitar de um atentado político, mas a hipótese não foi investigada. Seguiu-se um sábado angustiante, que de passou, sob efeito de analgésicos, acompanhado da mulher, Rosinha. noite, fez uma refeição leve, e dormiu.

Chico Ferreira/ Editora Três
O programa Show do Garotinho, na Rádio Tupi, é campeão de audiência

DEUS FALOU COMIGO - Foi então que aconteceu o inesperado. Por volta das três horas da madrugada de domingo, Garotinho acordou e, naquele momento, começou a ver o acidente passar na sua frente, como num filme colorido. Desperto do sono, viu todo o acidente acontecer novamente. Na hora em que ocorreu a capotagem, ele estava dando uma entrevista pelo celular, fato de que não se lembrava. "Aquela visão não era uma lembrança, pois eu não tinha percebido o acidente", afirma. A experiência foi tão intensa que Garotinho começou a chorar: "Sem que ninguém me falasse nada, caí num choro compulsivo. Chorava, chorava, chorava, e aí comecei a dizer para minha esposa que Deus estava falando comigo". Diante do espanto da companheira, relatou que estava sentindo uma coisa quente dentro de si, e sabia que era Deus falando ao seu coração. Garotinho relembra aqueles instantes com eloquência: "Eu estava sentindo uma alegria, uma coisa dentro de mim, me tocando, não sabia explicar, e continuava chorando muito".

O barulho atraiu a enfermeira, e, diante dela, Garotinho continuou afirmando que Deus falava com ele. Para espanto das duas, levantou-se do leito e caminhou sozinho até o banheiro, apoiando-se normalmente sobre a perna operada. Só então elas perceberam que não era um delírio. Totalmente lúcido e alegre, não parava de afirmar que Deus falava com ele, quando uma outra enfermeira disse que o pai dela era evangélico. "Ele é pastor? Preciso falar com um pastor", interrompeu Garotinho. Esse senhor, membro da Assembléia de Deus, foi chamado ao quarto e disse que aquilo era uma providência de Deus que, através do Espírito Santo, estava lhe mostrando que deveria lembrar-se dele, e colocá-lo acima de tudo em sua vida, até mesmo seus desejos e realizações. Ecoas palavras foram ratificadas pelo pastor Nilson Dimarzio, da Igreja Batista Central de Volta Redonda, que soube da experiência de Garotinho e foi ao hospital dizer-lhe que ele deveria ser batizado.

Chico Ferreira/ Editora Três
Garotinho recebe 30 mil cartas por mês

Nesse instante, de começou a viver um dilema: muito embora soubesse que sua experiência era real e diferente de tudo que já sentira — materialista, fora integrante do PCB e não praticava nenhuma religião —, ficou com medo de que a atitude de aceitar o batismo pudesse ser interpretada como uma tentativa de obter votos dos evangélicos. Dessa forma, resolveu esperar um momento mais apropriado para tornar pública sua fé. Depois das eleições, em que foi derrotado por uma margem de apenas 3% dos votos, passou algum tempo lendo, se preparando e procurando um ambiente para si. Conheceu o reverendo Caio Fábio que, após um período de preparação, batizou-o em 30 de julho deste ano.

O político Anthony. Garotinho acha que sua conversão deu-lhe uma visão diferente das questões que sempre o acompanharam. O fato de ter se tornado crente mostrou-lhe uma face nova da vida: "Eu sempre fui um cara combativo, envolvendo-me com lutas sociais, com vontade de fazer as coisas. Ficava angustiado porque não encontrava respostas definitivas para as lutas políticas. Continuo produtivo e atuando politicamente, mas perdi aquela angústia". Na sua opinião, os lados material e espiritual caminham em direções opostas, pois "quanto mais se avança espiritualmente, mais a gente se desprende das coisas materiais". O ex-materialista encontrou em Deus esse despojamenro.

COMPREENSIVO E HUMANO Garotinho passou a ler a Bíblia com outros olhos. Embora já conhecesse o Evangelho através das leituras diárias que fez durante anos para seu avô que não podia ler, foi somente após sua experiência com Deus que começou realmente a entendê-la "com o coração, e não somente pela leitura". Nas Escrituras, começou a descobrir a luta de um povo com o qual se identificou: "Desde o início, esse povo buscava a terra prometida, a justiça. Era um povo que queria respeito à lei e lutava pela liberdade; um povo que queria o fim da opressão e clamava por pão. A partir desse conhecimento, eu passei a ver a minha luta política como uma missão dentro de um caráter evangélico e social".

Chico Ferreira/ Editora Três
A mulher de Garotinho, Rosinha, afirma que,
depois de convertido, seu marido ficou mais humano,
compreensivo e confiante de que vale a pena viver

Aos 35 anos de idade e tendo em seu currículo um mandato de deputado estadual e a prefeitura de Campos, município do norte fluminense onde nasceu, Garotinho iniciou-se no rádio ainda bastante novo (daí a alcunha Garotinho, que incorporou ao nome). Aos 15 anos, já participava do movimento estudantil e foi eleito para a Assembléia Legislativa com 25 anos. Iniciou sua administração em Campos aos 27, e depois foi secretário de estado no governo Brizola. Segundo diz, sua trajetória foi como um meteoro, "fazia 300 mil coisas ao mesmo tempo". Sua esposa confirma que ele era muito agitado e "se atirava nas coisas de qualquer jeito", mas que depois que se converteu passou a ter um objetivo maior em sua vida, que o faz pensar e agir com mais equilíbrio. Rosinha acrescenta que Garotinho continua tendo as mesmas atividades de antes. "mas acreditando mais, com mais certeza de que a vida vai dar certo e de que vale a pena viver". Casada há 14 anos, ela diz que agora tem um marido mais compreensivo e humano. Garotinho está freqüentando a Comunidade Evangélica da Zona Sul, e, sempre que pode. realiza cultos domésticos.

Chico Ferreira/ Editora Três

O quase governador Anthony Garotinho vive em uma ampla casa numa sossegada rua do bairro do Cosme Velho, zona sul do Rio, cercada de verde por todos os lados. No térreo da Casa funcionam suas empresas, que fazem distribuição de produtos, edição de livros, jornais e publicidade, além de cuidar do seu programa Show do Garotinho, que vai ao ar pela Rádio Tupi. O programa é campeão de audiência no seu horário, atingindo, de acordo com as pesquisas, cerca de 400 mil ouvintes por minuto. Segundo Garotinho, o programa recebe cerca de 30 mil canas por mês. Os números elevados também estão presentes em sua vida pessoal: São sete filhos, sendo três adotivos. Garotinho está sempre cercado de pessoas, sejam empregados ou colaboradores. No entanto, apesar do espaço. não tem animais de estimação: "Só crio gente", diz, rindo.

E como ele avalia o governo de Marcello Alencar. que o derrotou no segundo turno? "Segundo penso, é muito mais fácil destruir do que construir. Ele venceu a eleição com o discurso de destruir o que havia sido feito no governo anteriorm como os Cieps e a Universidade do Norte Fluminense", dispara. Embora ressalte que torce, como cidadão do Rio de Janeiro, para que o atual governo acerte. E afirma, convicto: "Eu não preciso do fracasso dele para ser governador amanhã", sinalizando claramente que pretende ocupar o Palácio Guanabara a partir de 1999.

Para quem começou tão cedo na política, esperar mais três anos não deve ser tão difícil.



Visão Nacional


Vicom inaugura novas franquias

O sistema de franquias facilita a montagem de lojas da rede Vinde

Chico Ferreira/ Editora Três

As As cidades de Recife (PE) e Campos (RJ) ficaram mais abençoadas em outubro. A Vinde Comunicações inaugurou uma livraria Vinde em cada metrópole, através do sistema de franquias. Agora são onze lojas espalhadas pelo Brasil, e não vai ficar por aí. Está prevista para breve a inaguração de mais duas livrarias, em João Pessoa (PB) e Ribeirão Preto (SP). Atualmente, há mais de 80 pessoas interessadas em participar do sistema. A Vinde Comunicações oferece toda a assessoria nas áreas de Marketing, compra e venda, finanças e montagem da loja. Se você pretende se cadastrar ou quer mais informações, ligue para (021) 625-6852 é fale com Elivânia Lima.

Evangélicos da Globo dão show de bênçãos

Chico Ferreira/ Editora Três

Cerca de dois mil funcionários da Rede Globo de Televisão se reuniram no dia 11 de outubro na Comunidade Evangélica da Zona Sul, no Flamengo, Rio, para o 2° Encontro dos Evangélicos da emissora. O ator Felipe Folgosi, convertido há cinco anos, apresentou o evento, que contou com a participação dos cantores Josué Rodrigues, João Marcos, Nill - ex-integrante do grupo Dominó -, Ane, Aline Barros e Grupo Hagios. Um dos destaques foi o testemunho da apresentadora Mara Maravilha, ao relatar sua recente experiência com Cristo. Houve apresentação de um filme sobre o trabalho dos funcionários da Globo na Favela do Cantagalo e de um coral de crianças da comunidade. O pregador foi o reverendo Caio Fábio D'Araújo Filho, presidente da Associação Evangélica Brasileira.

Jimmy Swaggart retorna ao Maracanã

Chico Ferreira/ Editora Três
Swaggart veio o convite do Assembléia
de Deus de Madureira - Rio de Janeiro

Depois de oito anos, Jimmy Swaggart voltou ao estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, onde realizou, no dia 4 de novembro, a cruzada Brasil: ainda há esperança. Foi a terceira vinda ao Brasil do evangelista americano. Ao contrário de 1987, quando cerca de 80 mil pessoas foram ao estádio para ver e ouvir pessoalmente Swaggart - então no auge da fama como televangelista -, desta vez o estádio não recebeu sequer a metade desse público. A cruzada teve início por volta das 16h com a apresentação de cantores evangélicos, como Denise Cerqueira, Shirley Carvalhaes e Mattos Nascimento, e de um coral de cinco mil vozes, formado por integrantes da Assembléia de Deus, além da palavra de saudação de algumas lideranças evangélicas - incluindo o pastor Manuel Ferreira, responsável pela realização da cruzada. A programação, extensa e cansativa, fez com que o pastor Jimmy Swaggart iniciasse a mensagem às 19h30, quando muitas pessoas já tinham ido embora.

Feira do Livro Evangélico faz sucesso no Rio

Chico Ferreira/ Editora Três
Feira da Abec, escritores premiados

Pela primeira vez no Rio de Janeiro, a 5a. Feira Nacional do Livro Evangélico foi realizada em outubro, no Maracanãzinho. Com a presença de várias editoras cristãs, a feira teve entrega de prêmios, palestras, shows, autógrafos, lançamentos nos campos literário e fonográfico, além de artigos alternativos.

O pastor Júlio Andrade Ferreira, 83 anos, foi premiado pela Associação Brasileira dos Editores Cristãos (Abec) como a Personalidade Literária de 1995. Nascido em Minas Gerais, o escritor dirigiu vários institutos cristãos e é conhecido como o historiador da Igreja Presbiteriana no Brasil. Sua principal obra é Conheça sua Bíblia, editada em espanhol.

A Trindade e o amor na teologia de Ricardo de São Victor

Por Ricardo Barbosa de Souza

Carlos Fernandes

Trindade, embora ocupe lugar de estaque e importância na doutrina cristã, encontra pouca ou quase nenhuma relevância para a experiência cristã. Para a grande maioria dos cristãos, a Trindade não tem praticamente nada a dizer sobre o dia-a-dia da vida. Na verdade, ela só interessa aos teólogos e filósofos que se deliciam com a especulação de temas absolutamente irrelevantes para o cotidiano da experiência humana. No entanto, a Trindade revela não apenas a natureza do Deus cristão, mas também seu caráter. A partir da Trindade é que podemos concluir que o Deus que a Bíblia revela é, essencialmente, um Deus relacional. Ao revelar-se como Pai, Filho e Espírito Santo, Deus mostra não apenas suas ações na história da salvação do homem como também revela sua natureza afetiva, fraterna e relacional. Deus é uma amizade eterna, onde o Pai, o Filho e o Espírito Santo gozam da mais intensa e perfeita comunhão de amor e reciprocidade.

Um dos pensadores da história da igreja, que refletiu e trouxe uma grande contribuição ao desenvolvimento do aspecto relacional da Trindade, foi Ricardo de São Victor (? -1173). Ele explorou o amor humano através de uma análise psicológica das relações interpessoais e conduiu que a pessoa é mais humana e mais próxima de Deus quando transcende a si mesma em amor por outra pessoa. Fundamentalmente, para ele, a experiência humana de amor tem suas raízes no mistério da Trindade. Para Ricardo, não há nada mais perfeito do que a caridade (caridade como expressão concreta de amor para com o próximo). Portanto, se Deus possui a plenitude de tudo que é bom e perfeito, ele possui a plenitude da caridade. Se Deus é a perfeição do amor, o homem, sendo criado conforme a imagem de Deus, deve refletir esta perfeição ao máximo possível. Crescer na experiência do amor e da caridade é crescer em direção à imagem de Deus e tornar-se mais unido a ele. É baseado nesta experiência de amor compartilhado que Ricardo conclui que não pode haver uma só pessoa em Deus, pois o exercício do amor exige mais do que uma pessoa. Onde existe apenas uma pessoa, não existe caridade. Daí, sua conclusão lógica de que, se Deus é amor, não pode existir solitariamente, não pode ser um Deus uno.

Ricardo reconhece a necessidade de haver mais do que uma pessoa em Deus. Para ele, um Deus que não tem alguém com igual dignidade com quem possa compartilhar plenamente seu amor não pode ser um Deus plenamente realizado. Ele se expressa assim: "Temos aprendido que, naquele supremo e totalmente perfeito bem, existe a plenitude e a perfeição de toda a bondade. No entanto, onde existe a plenitude de toda a bondade, não pode faltar a caridade. Porque nada é melhor do que a caridade. No entanto, ninguém pode dizer que tem caridade baseado apenas no amor que tem para consigo. Torna-se necessário que o amor seja direcionado para uma outra pessoa para que seja caridade. Por isso, onde não existe a pluralidade de pessoas não pode existir a caridade. Mas você pode dizer que, mesmo que houvesse uma só pessoa na Divindade, ainda assim ele teria caridade para com a sua criação. De fato, o Senhor tem. Mas certamente ele não poderia expressar a caridade suprema para com a pessoa criada porque, se Ele amasse supremamenre alguém que não pudesse ser supremamente amado, a caridade seria imperfeita".

"Crescer na experiência da caridade e crescer em direção à imagem de Deus e tornar-se mais unido a ele."

Para Ricardo de São Victor, Deus é amor porque subsiste numa pluralidade de pessoas. Mesmo antes que houvesse mundo criado, Deus já existia como um Deus de amor. As relações de amizade e reciprocidade existem desde toda a eternidade em Deus. Ao nos criar segundo sua imagem e semelhança, Deus nos cria para amar e ser amados. Ele afirma que, a partir da Trindade, "não há nada mais glorioso, nada mais magnificente, do que desejar não ter nada que não possa ser compartilhado". Para ele, o significado da pessoa humana só pode ser compreendido a partir das relações de amizade e amor que construímos.

Aqui já podemos perceber a relevância deste tema para a vida. Para o homem moderno, o significado de ser pessoa, de ser alguém, está intimamente relacionado com as realizações profissionais e suas conquistas sociais. O homem é o que é por causa daquilo que possui. Se não possuirmos aquilo que a sociedade reconhece como essencial para a vida, não somos ninguém. No pensamento de Ricardo de São Victor, baseado na natureza trinitária de Deus, o homem encontra sua identidade pessoal nas relações de amizade e amor que constrói com Deus e seu semelhante. Jesus, ao definir qual é o maior de todos os mandamentos, disse que é "amar a Deus de todo o coração e alma, e ao próximo como a si mesmo". A natureza fundamental da experiência espiritual cristã é a amizade que nasce do encontro com o Deus de amor.

A Trindade nos livra do egoísmo e da vida autocentrada para uma experiência de amizade e amor com Deus e o próximo. E, a partir dela, nos encontramos como pessoas, não nas conquistas profissionais e sociais, mas nas relações de afeto e comunhão. O grande desafio da espiritualidade cristã é o de encontrar na Trindade os Fundamentos para nossa experiência de amor e amizade.

Gostaria de terminar citando C. S. Lewis: "Não existe investimento seguro. Amar é ser vulnerável. Ame qualquer coisa e seu coração irá certamente ser espremido e, possivelmente, partido. Se quiser ter a ceteza de mantê-lo intato, não deve dá-lo a ninguém, nem mesmo a um animal. Evite todos os envolvimentos, feche-o com segurança no esquife ou no caixão do seu egoísmo. Mas nesse esquife - seguro, sombrio, imóvel, sufocante - ele irá mudar. Não será quebrado, mas se tornará inquebrável, impenetrável, irredimível. O único lugar fora do céu onde você pode manter-se perfeitamente seguro contra todos os perigos e perturbações do amor é o inferno".


Ricardo Barbosa de Souza é pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasília (DF).

Boa Leitura

Carlos Fernandes

A Graça de Deus X O Mito do Super-Homem
Caio Fábio D'Araújo Filho
Editora: Vinde Comunicações
59 páginas
3a. Edição - 1995

Vivendo debaixo da graça de Deus, o cristão está livre de decepções pessoais ou dificuldades financeiras? As dores e os sofrimentos que nos sobrevêm são frutos de pecado? A conversão ao cristianismo nos dá poderes sobrenaturais para destruir todos os nossos problemas? A partir das experiências vividas pelo apóstolo Paulo, o autor oferece uma perspectiva lúcida sobre essas e outras questões, mostrando que a plenitude da graça de Deus pode ser experimentada na concretude da nossa humanidade. Este livro é intenso e profundo na abordagem de questões comportamentais e psicológicas em relação à vivência diária da fé. Premiado na 5a. Feira do Livro Evangélico, na Categoria Vida Cristã. À venda nas livrarias evangélicas e na Livraria Curió.

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Carlos Fernandes

Café com Deus
Ruben Pirola Filho
Editora: Vida
106 páginas
3a. Edição - 1995

Café com Deus é um guia devocional para pessoas que não dispõem de muito tempo, sendo um verdadeiro fast food espiritual. De leitura rápida, nem por isso é desprovido de conteúdo. Rubinho - como assina o autor - é professor de história em quadrinhos e designer gráfico da Universidade Federal de Uberlândia (MG). Sua obra reflete seu compromisso cristão, carregado de um bom humor que confronta o leitor consigo mesmo, fazendo-o parar e pensar, através de uma identificação com situações corriqueiras da vida diária e com os questionamentos básicos da fé cristã. Ganhador do prêmio ABEC, este é o primeiro título de um autor que promete. À venda nas livrarias evangélicas.

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Carlos Fernandes

Paredes do meu Coração
Bruce e Barbara Thompson
Editora: Betânia
224 páginas
1a. Edição - 1994

Mais um título premiado, Paredes do meu Coração vem atender a uma necessidade primordial do homem e da mulher do nosso século, percebida quando o ser humano levanta paredes de autodefesa em tomo do coração, no sentido de reduzir as possibilidades de ser ferido novamente. A leitura é simples e agradável, repleta de aplicações práticas, criando uma interação emocional, com a finalidade de conduzir a um diagnóstico do problema. As sugestões apresentadas ajudam o leitor a derrubar suas paredes, auxiliando-o a lidar com os traumas, frustrações e a insegurança provocada por esta prisão interior. Os autores sugerem também como reconstruir de maneira sadia estes muros necessários ao ajuste emocional, baseados nos prumos de Deus, a fim de que cada um possa seguir nos caminhos que conduzem à firmeza e à estabilidade. À venda nas livrarias evangélicas.

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Carlos Fernandes

A Revolta das Canetas
Mauro Clark
Editora: Mundo Cristão
124 páginas
1a. Edição - 1994

Mauro Clark foi premiado como autor revelação em 1994 pelo título A Revolta das Canetas. Nesta obra, ele usa os fatos do seu cotidiano familiar e social para mostrar que a fé na existência de um Deus vivo e presente não carece de argumentos apologéticos, mas de um simples abrir de olhos para as coisas simples da vida. Valendo-se da fantasia que confere vida às canetas, o livro aborda fatos reais, com aplicações espirituais. Uma gaveta cheia de canetas, a compra de um carro, uma partida de pingue-pongue, o corpo sonolento de uma menina e, de repente, Deus se faz presente. A Revolta das Canetas é um livro que abre a mente e o coração do leitor para que uma revolução espiritual possa acontecerem sua vida. Mauro Clark é engenheiro civil e escreve a coluna semanal Falando ao Coração, no jornal Diário do Nordeste, em Fortaleza.

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Deus é juiz, mas será que apita o jogo?

Atletas de Cristo enfrentam o dilema de orar ou não pela vitória em campo

Por Carlos Fernandes

Após a final da Copa, nos Estados Unidos os jogadores da Seleção Brasileira se reuniram
no meio do campo, num só espírito, e agradeceram a Deus a vitória contra a Itália

Quando o juiz apita e a bola começa a rolar, são 11 contra 11, certo? Nem sempre. No futebol, assim como em tantas outras atividades, cada um leva consigo a sua fé, a sua superstição, a sua esperança. Ninguém quer entrar em campo sozinho. Cada um procura urna fininha extra. Já se disse até que se macumba ganhasse jogo, o campeonato baiano terminaria sempre empatado. Exageros à parte, a verdade é que, quando o assunto é futebol, cada um se garante como pode. Tem jogador que se benze, outros beijam medalhinha, alguns acendem velas e até mesmo aqueles mais céticos de vez em quando se pegam com alguma coisa, digamos, sobrenatural. Todos os caminhos levam ao gol; é o vale-tudo pela vitória.

Mas quando o jogador é servo do Senhor, como é que fica? É lícito orar a Deus, pedindo a vitória para seu time ou Ele não se envolve em jogo? A bola é igual para todos ou procura mais os pés de quem busca ao Senhor? Na campanha do tetra, os Atletas de Cristo que integravam a seleção brasileira usaram e abusaram da oração na decisão contra a Itália. Quem não se lembra do Jorginho clamando a Deus no grande círculo durante a disputa de pênaltis? Ou do gesto histórico de Taffarel apontando para o alto depois que Roberto Baggio, budista, deu o título ao Brasil, chutando sua cobrança para fora?

A verdade é que os crentes, quando entram em campo, não dispensam a oração. Sérgio Manoel, ponta-esquerda do Botafogo, convertido há dois anos, diz que a concentração não é completa se Deus não estiver atuando, e que até mesmo no intervalo dos jogos já ouviu sua voz. Quanto a orar pedindo a vitória, ele assegura que só ora para que "seja feita a vontade de Deus". O lateral Cássio, do Fluminense, diz que, se uma vitória vier a glorificar o nome de Jesus, ele a concede. Apesar de seu time não ter sido considerado um dos favoritos ao título do atual campeonato brasileiro, venceu o primeiro turno e já está nas semifinais. Cássio confessa: "No fundo do coração, pedi a Deus que a classificação viesse para nós". E lá vai o Flu disputar o título.

Fábio, Cássio, Sérgio Manuel, pastor Zick e Tinho
participam da reunião dos Atletas de Cristo

Embora os jogadores cristãos sejam um pouco reticentes em admitir que oram a Deus para ganhar jogos, alguns acham que têm o direito de clamar pela vitória. Ivan, ex-zagueiro do Vasco, que também atuou pelo Santa Cruz e pelo Náutico de Recife, já orou dessa maneira. E relata o caso de uma semifinal entre Vasco e Botafogo, que naquela época contava com Baltazar, servo do Senhor como ele: "A imprensa divulgou o jogo como o confronto entre o artilheiro e o zagueiro de Deus", lembra: E nessa situação, quem foi abençoado com a vitória? "Não sei o motivo, mas dessa vez Deus atendeu a minha oração e o Vasco venceu por 2 a 1". Opinião diferente tem Amauri Knevitz, que durante 15 anos atuou como zagueiro do Inter-RS, Atlético-PR, Vitória-BA e outros clubes. Para ele, o atleta cristão não tem o direito de pedir a vitória. Por isso nunca orou assim. Ele acredita na dedicação do atleta, na sua preparação adequada, e somente depois de atendidas essas necessidades é licito rogar a Deus, mas "para que Ele aja segundo o seu propósito". Knevitz dá uma meia trava no atleta que apela para a oração: "Deus é amor, e pode abençoar determinadas situações, mas nem sempre o que pedimos é da sua vontade".

Pedir que a vontade de Deus seja feita parece ser a oração que todo jogador crente faz antes de pisar o gramado. Mas, por trás desse jargão evangélico, se esconde o desejo de cada coração: a vitória de seu time.

E há quem ore, pedindo que Deus afaste a bola de si: o goleiro. Afinal, não é fácil ocupar a ingrata posição que o folclore do futebol consagrou como aquela onde nem grama nasce. É preciso orar com um olho fechado e o outro aberto. E rogar para que na sua rede não caiam peixes. Trata-se da verdadeira antítese de Pedro. O goleiro Fábio Mala, do América do Rio, não sabe até que ponto é cerro ou errado pedir a vitória em oração, e prefere orar para que, independente do resultado, não saia de campo frustrado. No caso de confronto com um irmão em Cristo, Fábio acredita que nesse caso Deus abençoa os dois, mas dá a vitória àquele que der mais glória e honra ao Seu nome. Contudo, reconhece que já saiu de campo frustrado com Deus, após um jogo perdido devido a uma falha sua. "Mais tarde, o Senhor me fez entender que precisava mexer comigo para mostrar certas coisas, pois eu estava muito sapato alto, precisava cair um pouquinho". Essa é uma prova de que, Fábio (Américo do Rio) oro só para não ficar Frustrado além de mulas, Deus também pode usar frangos para falar aos seus servos.

Fábio (América do Rio) ora só para
não ficar frustado

Vinícius, do Bangu, goleiro convertido há quatro anos, ora para que seja bem-sucedido e não haja contusões, além de que - adivinhe - seja feita a vontade de Deus, é claro! Para ele, Jesus, além de mestre, também pode ser técnico: em uma excursão ao México, foi colocado no banco e não vacilou - rogou que Deus fizesse justiça e ele entrasse em campo. Não deu outra: entrou no segundo tempo, seu time ainda virou o jogo e saiu com a vitória!

Para Alex Dias Ribeiro, diretor executivo do grupo Atletas de Cristo, Deus é capaz de intervir no resultado de uma partida para influir na história de seus filhos, mas ressalta que os critérios pertencem a Ele. "'Deus não é tolo de entrar em um resultado por uma questão fútil". comenta. F. acrescenta, bem-humorado: "O atleta cristão não deve orar para vencer, pois se Deus é por nós, quem será contra nós? Seria até covardia!"

Afinal, a oração ganha jogo ou não? Não sabemos se Deus de vez em quando calça chuteiras e dá uma força aos seus filhos dentro das quatro linhas. Mas em uma coisa todos eles concordam: é muito melhor entrar em campo com Ele.



A noite do embaixador

Al Green encanta a plateia brasileira com sua música e espiritualidade

Por Benilton Maia

Fotos de Frederico Mendes

Carismático, Al Green mostrou
um repertório variado na
apresentação do Free Jazz

Na noite de 17 de outubro de 1995, abertura da décima versão do Free Jazz Festival, o palco do Metropolitan, no Rio, maior casa de shows do Brasil, se transformou em altar. Durante pouco mais de uma hora, o pastor, cantor e compositor americano Al Green mostrou ao público que boa música se aprende na escola... dominical. Alternando baladas, souls e gospels, o ministro-artista encantou a plateia com seu carisma e testemunho de fé. É a primeira vez que Green - ou, como gosta de ser chamado, reverendo - se apresentou no Brasil. Sua participação era uma das mais aguardadas para esta edição do festival, que acabou se rendendo ao pop. Mas, como todo bom cantor negro norte-americano, ele tem suas raízes no gospel.

Aos nove anos, Albert Greene (seu nome verdadeiro) já excursionava com o pai, o baixista Robert Greene, cristão conservador, integrando os Green Brothers. Pensando que tudo o que lhe atraía estava fora da igreja e era proibido por ela, decidiu formar o grupo Al Green & The Creacions, mudado depois para Al Green & The Sou1 Mates. Na época de sua primeira gravação, a canção Back up traia (1967), alcançou o Top 5 das paradas de R&B (rythm'n'blues). Empolgado com o sucesso, excursionou de Chicago a Bacon Rouge, apresentando-se em pequenas casas noturnas. Nessas andanças conheceu Willie Mitchell, em 1969. O amigo passou a produzir suas novas gravações e a compor em parceria algumas canções que se tornariam clássicas, como Tired of being alam, de 1971. Depois de vários discos de ouro entre 1971 e 1974, Green passa a ser chamado embaixador do amor por interpretar canções que pregam o romantismo, entre das Let's say together - regravada em 93 pelo grupo de hip-hop cristão ETW -,I'm still in love with you e Look what you've done for me.

Durante o show, o cantor e pastor
norte-americano falou várias vezes
do Evangelho

No apogeu da fama, porém, ele repensa seu relacionamento com Deus. Há quem diga que a queda que quase lhe custou a vida também contribuiu para a decisão de dedicar-se totalmente à música evangélica. O primeiro álbum desta nova e inesperada fase é The Lord will make my way, sucesso de crítica e vencedor de um prêmio Grammy em 1982. Nesta época, ele já havia se tornado pastor do Full Gospel Tabernacle (Tabernáculo do Evangelho Pleno) em Memphis, Tenessee. Em 1985, sai He is the light, marcando o retorno da parceria com Mitchell. Um sucesso. Em 1987, lança Soul Survivor pela A&M Records, repetindo mais uma vez o sucesso. É deste álbum a música Everything is gonna be allright.

Em 1992 , Green grava pela gravadora evangélica Word o disco Love is Reality, em que acrescenta mais R&B ao seu trabalho marcado por um balanço moderno aliado ao seu sofisticado gospel tradicional. Além dos sucessos como cantor cristão, o reverendo também trabalha junto ao mercado secular, e seu nome tem figurado em diversos créditos de filmes. Ele compôs, ao lado de Annie Lennox, o hit Put a little love in your heart, tema do filme Os fantasmas se divertem. Fez temas também para Corina, uma babá perfeita e Um tira da pesada 3.

Green quer hoje compartilhar sua mensagem de amor além dos portões da igreja em Memphis. Ele canta para a mulher amada e para Deus com o mesmo fervor. Ano passado foi lançado no Brasil (e ignorado pelas rádios) o álbum Don't look back, produzido por Arthur Baker e Fine Young Canibais. Quem garimpa e encontra algum exemplar deste CD não se arrepende pelo esforço. Al Green acaba de gravar Your heart is in your hand, produzido por Narada Michael Walden e lançado este mês nos EUA.

Crítica / Al Green **

Por Omar de Souza

Quem foi ao Metropolitan na noite de 17 de outubro de 1995 para assistir a um show do artista Al Green saiu satisfeito. Aqueles, porém, que pretendiam ouvir o pastor Al Green voltaram para casa com uma suave sensação de quero mais. Não que o cantor profissional inibisse o reverendo. Pelo contrário, os dois conviviam no palco com muita harmonia. Os nomes Deus e Jesus foram mencionados inúmeras vezes, do início ao fim da apresentação. Mas faltou mais daquilo que Green sabe fazer de melhor: interpretar, do fundo da alma, souls e gospels genuínos. O repertório, evidentemente preparado para agradar os fás do cantor, evidenciou tanto os sucessos dos anos 70 que suas melhores canções - as de adoração e louvor - ficaram em segundo plano. Aliás, era também nas músicas religiosas que a competente banda brilhava mais.

O que faltou de gospel, o reverendo compensou com carisma e estilo cênico. Sem abusar de seus famosos agudos em falsete, ele preencheu todos os espaços da casa de espetáculos projetando a potente voz, quase dispensando o microfone. As caminhadas entre as mesas da plateia também serviram para envolver todo o público no balanço de sua música. Resta a curiosidade: será que os cultos no Full Gospel Tabenacle são tão bons e animados quanto o show de Green?


• ruim; * regular; ** bom; *** ótimo

A conciliação entre púlpito e palco

4 Perguntas Al Green

O senhor grava canções românticas e evangélicas com diferentes ritmos e gêneros. Há algum tipo de diferenciação entre a música religiosa e a popular?

Sim, há uma diferença muito grande entre música gospel e música popular ou profana. Em ambas são abordados dois tipos de amor bem distintos. Uma coisa é falar sobre o amor de um rapaz por uma garota, tipo "te amo, baby, quero te beijar e abraçar", e outra é falar do amor entre o Criador e o homem. Contudo, rodo tipo de amor vem do Criador. Há quinze anos atrás, eu não poderia fazer esta afirmação porque eu ainda não tinha racionalizado isso no começo de minha dedicação a Cristo. Mas hoje posso gravar e falar sobre o amor em suas diferentes formas. Ambas as formas de amor nos são dadas pelo Criador, apesar de serem distintas. Eu me considero uma espécie de (gesticula como se abrisse parênteses) embaixador do amor. E isso não é apenas um aspecto de minha vida, mas algo que norteia todo o meu viver. Eu gostaria que esse maravilhoso amor de Deus tomasse conta do mundo todo. Então, eu quero falar desse amor.

"Deus quer que todos conheçam seu amor.
Por isso, me sustento nas posições onde
posso compartilhar, de alguma formo, esse
amor commuitas pessoas."

Seu repertório é composto apenas de gospel music?

Não, meu show consiste de músicas como Let's say together, Call me, Love is Reality, Amazing grace, enfim, as músicas que contêm todos os elementos que falam das coisas que eu penso e acredito. O show é longo, por isso posso apresentar um número grande e variado de músicas.

Como o senhor concilia a vida de pastor com a de artista?

Consigo conciliar as duas coisas porque Deus é amor. Ele quer que todos conheçam este amor, por isso me sustenta nessas posições onde posso, de alguma forma, compartilhar seu amor com muitas pessoas. Críticas sempre existirão, seja por um motivo ou outro. Certamente gravo para diferentes segmentos musicais. Porém, em última análise, todo tipo de amor vem do Criador, certo? Então, eu canto sobre todo tipo de amor que nos foi dado por Deus. E, apesar das críticas, eu sei que este amor de Deus me ajuda a superar todo tipo de barreira. O amor sempre prevalecerá.

Voltando no tempo, qual foi sua motivação para deixar os Green Brothers e seguir sua carreira?

Fui expulso do grupo por meu pai (risos). Ele me surpreendeu mais de uma vez ouvindo músicas que não eram bem-vindas em minha casa, como Jack Wilson, James Brown, Wilson Piccket. Então, me expulsou de casa. Depois disso, eu me associei a três músicos que tocavam musica pop e passei a seguir por um bom tempo nesse caminho somente.



Coluna da Georgiana Guinle


Garota-propaganda do Evangelho

Maria Inês Noronha
Neide Aparecida fez a cabeça no jantar da Adhonep

Ela sempre sentiu o cheiro do sucesso incensar o altar de sua vida. Ganhou mais de 50 prêmios que a consagraram como a mais popular garota-propaganda da TV brasileira. Quem não se lembra do famoso bordão "Perucas Lady, tá?", enquanto a bela Neide Aparecida se desmanchava em olhares de diva, ondulando cada palavra com seus loopings capilares? Mas foi Jesus quem fez, de fato, a cabeça de Neide, e imprimiu um novo lay-out à sua alma. Este doce e inusitado encontro foi num jantar da Adhonep (Associação dos Homens de Negócios do Evangelho Pleno), entidade que reúne executivos e empresários cristãos. "Nunca vou esquecer. A gente chega lá como um pássaro de bico quebrado e, de repente, vem aquela revoada de colibris nos envolvendo com suas asas de amor." Neide chegou a ter umas experiências religiosas fazendo promessas e ajoelhando para a quase xará, Maria Aparecida - Cidinha, para os íntimos. Mas agora, recém-batizada com o Espírito Santo, ela não só conhece a cruz de Cristo como o Cristo da cruz.


Globo 1

Frederico Mendes
Felipe Folgosi comandou
o encontro

Estampando uma camiseta com o slogan "Globo e você. Com Jesus Cristo, tudo a ver", o ator Felipe Folgosi desempenhou um dos papéis mais importantes da sua carreira: o de mestre de cerimônias do Segundo Encontro dos Funcionários Evangélicos da TV Globo, dia 11 de outubro, no Rio. Como bom cristão, Felipe atendeu prontamente ao convite dos coordenadores do evento, chegou cedo, transitou tranquilamente entre os convidados e mostrou que, quando é para falar do amor de Cristo, o texto está na ponta da língua e no fundo do coração. Ao final do culto, Felipe -um dos galãs da novela das oito, Explode Coração - comentou sorridente "Foi tudo uma bênção."


Globo 2

Frederico Mendes
Mara falou de Jesus no
evento da Globo

Surpresa mesmo foi ver a cantora e apresentadora Mara Maravilha falan-do de sua experiência com o Pai no encontro de funcionários da Globo. A baianinha, que gravou recentemente a famosa -canção em que o rei Roberto Carlos procura se dirigir ao verdadeiro Rei, contou que foi abordada por uma missionária da Fundação Renascer, em São Paulo. Desde então, reconheceu que precisava mudar. "Eu estava falando com Jesus, mas de costas pra ele", disse Mara, que ficou - me perdoem o trocadilho - maravilhada com a alegria do ambiente e lamentou ter que sair mais cedo, antes de ouvir a mensagem do reverendo Caio Fábio.

A verdadeira libertação

Frederico Mendes
Hugo Boff se aproximou do Evangelho lendo o livro de um padre

O Holy Ghost atua de formas fantásticas. Até a tradução de um livro pode levar à salvação em Cristo Assim aconteceu com o professor Hugo Boff irmão do ex-frei Leonardo Boff. Há cerca de 12 anos ele começou a traduzir o livro Beber no Próprio Poço, do padre peruano Gustavo Gutierrez, baseado nos princípios da Teologia da Libertação. O professor, que até então não praticava nenhuma religião, foi levado a conhecer a Bíblia através de citações do livro, e logo a leitura da Palavra, levou-o à conversão. Boff, de 45 anos, leciona Economia na Fundacão Getúlio Vargas e é secretário e professor da Escola Bíblica Dominical da Igreja Batista de Botafogo. Sua experiência comprova que, realmente, A Palavra liberta!

Refrigério sob o calor do secador

Frederico Mendes
Rita Barella sentiu o poder de
Deus num salão de cabeleireiro

Calor na cabeça, refrigério na alma. Foi debaixo de um secador de cabelos que Rita Barefla, 38 anos, proprietária da cadeia de lojas Mr. Kid, recebeu o incessante orvalhar do Espírito Santo. Sua alma se deleitou num fluir incontrolável de paz e alegria. "Pude perceber uma fronteira no meu espírito, separando a água física da água espiritual, podendo distingui-la do calor do secador e da umidade do creme. Foi uma sensação gloriosa."

Até então, a empresária só tinha incursionado pela créme de la créme do esoterismo desnatado. Muitas vezes, no quarto, presenciou fogs espirituais demoníacos. Chegava a enxergar espíritos malignos que tinham uma aparência de quem jamais seria top model da Revlon. No meio da crise, Rita testemunhou o poder de Deus em reuniões na sua casa, quando o Espírito Santo falou que ia fazer um resgate total na sua vida. "O processo continuou, a luta gerou Mesmo no deserto, a alegria sobrenatural do Senhor sempre me acompanhou." Mais uma surpresa para quem gosta de kirchenerizar a ação de Deus. Jesus, até no secador, secou a dor arrebatadora de uma vida preciosa.

SHEKINADAS

Farta distribuição

Mais uma vez assistimos ao toma-lá-dá-cá que já virou rotina cm Brasília. Interessado em aprovar seus projetos, o governo distribuiu cargos para parlamentares e vantagens para os agro-deputados endividados. Vale tudo para conseguir as famigeradas reformas da Constituição. Ou seriam deformas?

Jesus na praia

Frederico Mendes

O prefeito do Rio, Cesar Maia, não sabe o que quer. Já anunciou tantas atrações para a praia na virada do ano que parece até que o reveillon dura uma semana. Já se falou com Beatles, os três tenores, o Prince, Zeffirelli Montserrat Caballet. Bem que ele podia chamar Jesus Cristo e deixar os crentes ocuparem o espaço para evangelizar nos postos, como faziam todos os anos antes dele assumir a prefeitura.

Ar Efeito

Ano que vem tem eleições para prefeito e vereador. Prepare-se para ver a sua igreja ser invadida pelos candidatos evangélicos que, depois de eleitos, nunca mais dão as caras, como se tivessem sido arrebatados. Nem o céu é o limite para eles. A gente só volta a saber dessa turma depois de quatro anos - isso quando eles não se metem em alguma maracutaia e saem nos jornais envergonhando o Evangelho. Abre o olho, irmão.



Revista Vinde - Edição 3

--- Reage Fábrica Pastor Jimmy Swaggart Epistolas do Leitor Eles não gostam de oposição Os "ro...