quarta-feira, 3 de janeiro de 1996

O prato que mudou a História

Jacó garantiu sua bênção em troca das lentilhas

Por Ester Roisenberg

Fotos: Frederico Mendes

Esaú vendeu sua primogenitura ao irmão Jacó, por um prato

É difícil acreditar que, um dia, há milhares de anos, o neto de Abraão, Esaú, venderia sua primogenitura ao irmão gêmeo, Jacó, por um prato de lentilhas, ainda que saboroso. Naquela época, ser o filho mais velho dava vários direitos. Era imenso o desejo de Jacó de receber a bênção de seu pai Isaque. Em Gênesis, capítulo 25, versículos 29 a 34, são narrados os detalhes dessa troca.

"Jacó tinha feito um guisado, quando Esaú chegou do campo muito cansado. Disse Esaú a Jacó: Deixa-me, peço-te, comer desse guisado vermelho, porque estou muito cansado. Por isso, se chamou Edom. Disse Jacó: Vende-me primeiro o teu direito de primogenitura. Respondeu Esaú: Estou a ponto de morrer, logo, para que me servirá o direito de primogenitura? Então disse Jacó: Jura-me primeiro. Ele jurou, e vendeu o seu direito de primogenitura a Jacó. Jacó deu a Esaú pão e o guisado de lentilhas. Ele comeu e bebeu, e então se levantou e saiu. Assim, desprezou Esaú o seu direito de primogenitura."

"E Isaque abençoou a Jacó dizendo: Sirvam-te os povos, e nações se curvem a de lentilhas ti. Sê senhor de teus irmãos, e os filhos de tua mãe se encurvem a ti. Malditos sejam os que te amaldiçoarem, e benditos sejam os que te abençoarem" (Gênesis 27:29).

A palavia lentilha é mencionada em outros textos da Bíblia, todos do Antigo Testamento: 2 Samuel 17:28 e 23:11; Ezequiel 4:9. E quem saboreia um delicioso prato à base de lentilhas como o que ensinamos nesta página pode ter uma idéia do dilema que se passou na mente - e, principalmente, no estômago - do esfomeado Esaú. Apesar de não constar da tradição culinária brasileira, é uma ótima opção para um cardápio original. Só não podemos esquecer que ele preferiu a satisfação de seus desejos imediatos em detrimento de bênçãos futuras, das quais abriu mão a um baixo preço.

Como fazer Lentilha Bendita

Ingredientes

1 pacote (1/2 kg) de lentilhas
4 dentes de alho
1 cebola média
cheiro verde
1 folha de louro
300g de carne-seca
1 cenoura
pimenta do reino (opcional)
sal a gosto

Modo de preparar

Coloque o pacote de lentilhas de molho em água fria de véspera. No dia seguinte, ponha a lentilha para cozinhar com a folha de louro, até ficar bem mole. Em outra panela. Faça um refogado com gordura, cebola picada e cheiro verde. Ponha nele as lentilhas cozidas. Junte mais um pouco de água e sal e deixe ficar em fogo fraco. Deixe a carne-seca de molho na água para retirar o excesso de sal e jogue a água fora. Cozinhe a carne-seca à parte, numa panela de pressão. por 20 minutos. Um pouco antes de servir, junte as lentilhas e deixe ferver um pouco para tomar gosto. Para engrossar.o caldo, amasse uma concha de lentilhas, passe-as na peneira e misture ao restante, sem aproveitar as cascas. Decore com uma cenoura levemente cozida, cortada em rodelas.

Petra no meio do caminho

Desorganização demais e público de menos não diminui delírio dos fãs do conjunto americano

Por Benilton Maia

Fotos de Pauty Araujo

Não foi bem o que se esperava. O show gospel mais aguardado do ano simplesmente não emplacou. Não mais que duas mil pessoas estiveram na Apoteose, no Rio de Janeiro, assistindo à apresentação do Petra no dia 9 de dezembro de 1995, num show marcado por muita desorganização. Programado para começar às 16h, os portões só foram abertos depois das 17h e esperou-se mais de quatro horas pelo início da apresentação. A galera deveria curtir as bandas Complexo J, Oficina G-3 e Fruto Sagrado antes do Petra, mas o grupo não deixou ninguém cantar na frente deles. Vaias e protestos se sucederam até o início do show. Quando os meninos de Nashville entraram no palco, pediram desculpas pelo atraso, e fizeram a galera delirar.

Havia fãs de todos os gostos e lugares. Uns 40 jovens vieram de Vitória (ES), trazidos por Valmir Lopes, da Karis Comunicações. Outros quatro fãs encararam 830 quilômetros de Curitiba ao Rio, sem direito a hotel. Quatro irmãos de Cabo Frio formam um fã clube particular. Mas a atração na platéia ficou por conta de Amarildo Esteves, de 22 anos, que veio de Petrópolis com 30 pessoas e fez questão de trazer um Mickey de pelúcia. Convertido há 16 anos, Amarildo conheceu o Petra há dez anos. "Eu tenho uma raridade que poucos possuem, o primeiro disco do Petra", conta, sem esconder seu orgulho. Ele diz também que as pessoas só entendem um grupo de rock evangélico quando conhecem de perto.

Show do Petra: quatro horas de espera sem curtir as bandas nacionais

No show, o Petra não deixou a desejar. Não faltou animação e a galera vibrou com sucessos novos e antigos da banda, que falavam do poder da oração, da amizade, do amor do cristão por Deus, entre outros temas. No final, o vocalista John falou do amor de Jesus Cristo especificamente aos jovens que ainda não conheciam a salvação. "Não sou um pregador", disse, "sou um músico que um dia encontrou Jesus. Essa geração já teve muita coisa roubada, mas o amor de Deus não será roubado de vocês". No apelo, dezenas de jovens levantaram as mãos e oraram com o vocalista.

Crítica / Petra * * *

Por Benilton Maia

A idade da banda - 23 anos - só serve para lhe conferir uma qualidade apurada, sem o peso do tempo. No show, que começou bastante atrasado, o Petra mostrou ao vivo porque se mantém na liderança do gênero: surpreendendo os fãs a cada novo trabalho, reinventa sua fórmula de sucesso. Tudo na performance da banda funcionou. Os músicos executaram muito bem cada canção; os backing vocais estavam afinados e de um modo especialmente harmonioso. O magnetismo e o carisma do grupo seguraram a empolgação da pequena multidão de pouco mais de dois mil privilegiados.

O repertório, que deveria apenas promover o último trabalho (o CD No Doubt está um arraso!), acabou sendo alterado, para delírio dos que esperavam ouvir antigos sucessos. Era impossível não se emocionar e não se mexer com a interpretação de John Schillit, e sua voz bela e inconfundível, aliada à unção poderosa do Espírito Santo, o que diferencia o Petra das bandas de rock seculares. Quase duas horas depois o show termina e John ora pelos jovens que decidiram abrir o 'coração para Jesus. Ele fala do amor e do propósito de Deus em nos salvar por seu filho Jesus.

Ao final, um gostinho de "quero mais" paira sobre a platéia. Quem foi para ver o Petra de perto não se decepcionou. Foi demais!

• ruim; * regular; ** bom; *** ótimo

Oficina de vidas


Os irreverentes rapazes do Oficina G-3 deveriam abrir o primeiro show do Petra no Brasil

Por Benilton Maia

Fotos Divulgação
Os irreverentes rapazes do Oficina G-3 deveriam abrir o primeiro show do Petra no Brasil

Oficina G-3 é visto com reserva pela ala conservadora evangélica. Fora do palco, porém, os roqueiros de Cristo são gente simpática, com uma mensagem no coração e que não se limita a fazer shows. Eles também se preocupam com o social, como prova a doação ao Renascer-Copan (obra assistencial da Fundação Renascer a menores de rua de São Paulo) dos direitos autorais do último álbum da banda - Nada é tão novo, nada é tão velho.

Duka, baixista na banda há um ano, revela que, apesar de ser filho de pastor, não estava muito interessado em compromisso com Deus, mas logo percebeu nos integrantes da banda um amor muito grande por Jesus e pelas pessoas que não o conhecem como Senhor e Salvador pessoal. "No início, entrar para o Oficina G-3 parecia apenas estar em uma banda de rock. Hoje compreendo que é um trabalho de restauração de vidas, de levar a Palavra de Deus aos que estão carentes dela", reconhece.

Júnior diz que, para viver como músico cristão, a pessoa tem que ser artista. Músico profissional, dá aulas particulares para manter a família. Lembra os custos de equipamento, transportes, estadas, sem contar com o dinheiro que pagam aos estúdios de gravação. Waltão ressalta a visão ministerial da banda, que não topa tudo por dinheiro. Diz que não abre mão de fazer um trabalho de evangelização pordivergências de ordem financeira.

O que alopra geral no palco, aprontando mil, pasmem, é pastor. Manga, o vocalista líder da banda, é um dos pastores da igreja Renascer em Cristo, em São Paulo. Ele se preocupa com os descaminhos da juventude evangélica. "Hoje temos uma juventude livre de jugo de usos e costumes, valorizada e que tem voz, mas que está escorregando para o caminho da libertinagem. Jesus nos chamou à liberdade. Podemos ser autênticos e ter personalidade. Podemos usar cabelo comprido, bermudas, camisetas e até brinco, se nos sentimos bem. Porém, isso nada tem a ver com o compromisso com Cristo. Quer você decida andar com um visual bem comportado ou moderninho, o importante é ter o coração rendido to-talmente a Cristo e a Seu Senhorio", declara. O Oficina G-3, que em dezembro estava agendado para abrir o show do Petra em sua primeira visita ao Brasil, (veja página 45), é hoje um dos melhores grupos de rebite metal nacional.

Projeto Eterno leva fé no heavy metal


Fotos Divulgação
PE: a banda de garagem que deu certo prepara-se para lançar seu disco

O mais curioso de todos os trabalhos da Comunidade S8 é o chamado "galpão", no bairro de São Gonçalo, em Niterói. A partir deste inusitado trabalho evangelístico junto a jovens e adolescentes arredios à igreja convencional surgiu o Projeto Eterno. Com guitarra, baixo e bateria, a banda detona o mais puro rock'n'roll. O PE tem sido convidado para participar de vários eventos ao lado de bandas de heavy metal secular. Nestas oportunidades eles podem, através do testemunho pessoal, postura, estilo de vida e pensamento, passar a mensagem de Jesus. Esta banda de rock alternativo já está tomando providências para lançar um disco. Curiosamente, eles são mais populares entre as bandas de garagem e entre os roqueiros do que entre a juventude evangélica da região.


VOCÊ É O JUIZ

A partir de agora você poderá eleger os melhores. Na revista VINDE, o seu voto será levado a sério e, daqui a três meses, divulgaremos o resultado desta eleição em que a sua opinião é o mais importante. Para participar, basta copiar os itens abaixo, escrever ao lado os melhores candidatos de cada categoria, colocar em um envelope e enviar para: Revista VINDE/Coluna VM Show - Caixa postal 100.084, CEP 24.001-970 - Niterói, RJ.

  1. Melhor cantor nacional
  2. Melhor cantor internacional
  3. Melhor cantora nacional
  4. Melhor cantora internacional
  5. Melhor banda de rock nacional
  6. Melhor banda de rock internacional
  7. Melhor banda pop nacional
  8. Melhor banda pop internacional
  9. Banda revelação nacional
  10. Banda revelação internacional
  11. Melhor disco pop nacional
  12. Melhor disco pop internacional
  13. Melhor disco rock nacional
  14. Melhor disco rock internacional
  15. Melhor música pop nacional
  16. Melhor música pop internacional
  17. Melhor música de louvor e adoração (nacional/versão)
  18. Melhor show do ano
  19. Banda de melhor performance ao vivo (nacional)
  20. Dois melhores videoclipes internacionais

DROPS


Fotos Divulgação

Wanda Sá há muito acalenta o sonho de gravar um disco em que possa expressar toda a sua fé em Jesus. Repertório para isso ela já possui. São músicas que inspiram e encantam. Para os amantes da música popular brasileira, certamente será um presente e tanto. Wanda participou do movimento Bossa Nova ao lado de grandes nomes da MPB. O projeto se chama Jesus Mania, que em breve vai deslanchar.

Wes King, Michael W. Smith, Clay Crosse e os principais artistas da Reunion/RCA estão em um mesmo CD lançado há dois meses pela Reunion Records. Trata-se de uma coletânea dos últimos hits desse selo. Pura beleza digital.

Catedral realizou um show superlegal para os fás cariocas no RioSampa em novembro, no lançamento do mais novo álbum. A casa ficou lotada, confirmando o grande público que elege a banda como aquela que está entre as melhores do Rio. Para quem curte o som do Catedral, é só ficar atento, porque o último álbum logo chega às lojas.


A arte da comunhão

Artista plástico descobre em sua obra um instrumento do Espirito Santo

Por Vilmar Madruga

Vai longe o tempo em que a imagem do artista estava ligada à daquele sujeito esquisicão, de hábitos e temperamentos singulares a diferenciá-lo dos humildes mortais. Não menos distante está a ideia romântica do pintor de rua, boina de lado, tendo no fundó a Torre Eiffel ou a Catedral de Notre Dame. A velocidade dos meios de comunicação, a interatividade via Internet e a própria perplexidade do homem diante do momento histórico em que vive vieram alterar o conceito do que seja produzir arte em nossos dias, assim como a postura de quem a produz e consome.

Está mais dificil entender ou levar arte para casa hoje. Ela não quer mais ser um produto para combinar com o sofá, ou com o tom da madeira dos móveis da sala. Estas questões passaram a me interessar desde que, depois de uma noite inteira de embate com uma grande tela, experimentei um enorme vazio após sua conclusão. Senti que qualquer pessoa com uma habilidade média e um certo domínio técnico poderia realizar tão bem ou melhor a obra que acabara de produzir. Faltava um sopro para que ela fosse algo realmente importante, senão para mudar alguém, pelo menos para mudar a mim mesmo.

Ao contrário da maioria das outras vezes, saí do estúdio experimentando um grande desconforto. Só mais tarde entendi que Deus havia preparado aquela noite para me falar profundamente. Desde então, não há nada no meu trabalho que não passe antes pela vontade do Pai. A arte adquiriu um novo significado para mim.

Por quatro anos coordenei as oficinas de arte do Instituto Penal Vieira Ferreira Netto, em Niterói onde, através da arte, pude ver o Espírito Santo ganhar espaço naquelas vidas amarguradas e aparentemente sem saída. Foram reunidos mais de 100 trabalhos produzidos pelos detentos na mostra A Cor do Cárcere, no Museu Histórico do Rio de Janeiro.

Meu trabalho também cresceria na direção de um simbolismo cristão. É daquela época uma caixa de vidro preta forrada de espelhos, com areia no fundo, onde repousam cinco pães de cerâmica. Doei a peça para a Vinde e fiquei feliz com a interatividade que o reverendo Caio Fábio propunha àqueles que a encontrassem em seu gabinete, quando perguntavam o que significavam aqueles cinco pãezinhos dentro de uma caixa de espelhos. O pastor pedia que o interlocutor se pusesse de joelhos para ver a obra. Sob o efeito dos espelhos, os pães pareciam se multiplicar infinitamente sobre um deserto. O reverendo Caio, então, realçava o conceito da obra: "Para ver milagres é preciso estar de joelhos".

Num outro trabalho desta época, uma mancha de sangue escorre sobre duas telas totarnente brancas, onde se pode ler, apenas no relevo da tinta, a passagem de Isaías 61. Foi maravilhoso tornar explícita, na minha pintura, a revolução conceitual que Deus começava a fazer na minha vida. Finalmente, o vazio é preenchido pelo Espírito do Senhor Deus, pregando boas novas, proclamando aos cativos a verdadeira liberdade. Aquela que homem nenhum pode dar ou tirar.

Atualmente estou trabalhando a questão do sacrifício. Numa de minhas telas, uma grande área é coberta de barro vermelho, numa alusão à criação e ao sangue derramado na cruz. No canto esquerdo, uma tela totalmente branca ostenta uma coroa impregnada da ferrugem deixada por um punhado de pregos. Meu trabalho tem crescido dentro do tempo e da estratégia que Deus tem para a minha vida. Depois de desejar, durante muito tempo, um atelier onde eu pudesse negociar minha produção, livre da ganância e do autoritarismo do mercado artístico, vejo-me há três anos em minha própria galeria de arte, em Búzios, na badalada Rua das Pedras. Ali, de minha porta, posso ler escrito na fachada da simpática igrejinha da Assembléia de Deus logo em frente: "Eu sou a Porta".


Vilmar Madruga é artista plástico e diretor da Galeria de Arte da Universidade Federal Fluminense.

Tráfico de influência via satélite

O embaixador Júlio César dos Santos e o comandante José Afonso Assunção: suspeitos de maracutaia no caso Sivam

Num desses vôos que o trabalho me obriga, a uns 10 mil metros do chão, fiquei entre a visão divina e a pequenez humana sobre imagens de coisas como grampos telefônicos, tráfico de influência via satélite, a ambiciosa empreitada de proteger a Amazônia, ditos e desmentidos políticos, enfim, histórias de bastidores que, por questões de segurança nacional e garantias democráticas, ninguém revela. Vista do alto, a rotina que ocupa os homens parece um ponto na visão global do universo. A opinião pública não parece muito interessada na questão do Sivam. O tema não mexe no dia-a-dia do cidadão comum: são um bilhão e meio de dólares, fortuna que vive na estratosfera da utopia. As histórias que envolvem o Sivam não cabem na vida de detalhes de nossa gente.

No entanto, é prato cheio para a agitação política. Quem é inocente, mas não parece, luta para convencer. Quem tem culpa faz malabarismos para posar de santo. E aí, tudo fica vulnerável. Até uma conversa fiada ao telefone pode ser o estopim de um grande incêndio. Relatórios técnicos são manuseados e discutidos. Todos tratam como feijão com arroz o que a Aeronáutica classifica tridimensional.

Se ninguém domina o assunto, qual é o parâmetro para julgar? O critério é aleatório. O que é pior: comprar porcaria por um preço menor ou pagar mais caro por um equipamento moderno e eficiente? E se for verdade que o mais caro é roubo? Desse jeito, o santuário ecológico a ser vigiado e sondado vira um terreno minado. É o negócio da China, não só pelo valor, mas por tratar da biodiversidade dos segredos que despertam o interesse do mundo inteiro. E aí? O Sivam é importante? Pode ser entregue para estrangeiros? Quem, no Brasil, poderia fazer o serviço? O setor da alta tecnologia não tem muito mercado no país. Quem arriscou anda mal das pernas.

Está aí um presidente com insônia, uma corrida insana da imprensa à cata de furos. Um monte de aliados, ora em dúvida, ora enleados em nebulosas versões sobre a conversa bruta com a voz do presidente e seus auxiliares. Ninguém mostrou a fita com a gravação inteira da escuta telefônica, mas os boatos de fontes fidedignas tratam, entre outras coisas, de namoricos presidenciais com gente da própria corte. O fantasma que atravessou o fosso do palácio e agora passeia pela Esplanada e pelo Congresso é a dúvida. Ninguém tem certeza de nada, nem o presidente. O bom senso manda decepar cabeças, suspender processos, agir rápido para barrar as desconfianças e a obscuridade amazônica de tratos e contratos. Só não se sabe ao certo como deter a espécie de ectoplasma político - o desconhecido. Seja qual for o fim desse enredo, os responsáveis pela verdadeira história devem estar rindo das conjecturas.

Tem um detalhe: do alto, onde até a Amazônia parece um pingo no planeta, o radar de Deus capta a desordem, a corrupção, a injustiça, seja lá o que for.

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Délis Ortiz é jornalista, repórter de Política da Rede Globo de Televisão e membro da Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasília.

Os santos do pau oco

Vídeo revela que, de evangélica, a Igreja Universal
só tem o povo

Por Carlos Fernandes *

Os bispos Macedo, Gonçalves e Von Helde, e o deputado Laprovita protagonizam as cenas do vídeo secreto da cúpula da Universal

No século 18, um expediente utilizado para ludibriar a fiscalização portuguesa e contrabandear ouro era escondê-lo em imagens sacras de madeira. Daí o surgimento da expressão santos do pau oco, comparação ideal para representar a cúpula da Igreja Universal do Reino de Deus, embora tenha sido rejeitada pelo próprio Edir Macedo. O vídeo divulgado às vésperas do Natal pelo pastor dissidente Carlos Magno de Miranda, descontados os exageros da mídia, serviu para evidenciar o buraco negro de idolatria ao dinheiro e arrogância dos líderes da denominação, ocultado pelo discurso pasteurizado dos cultos. Flagrados com a mão na massa pela câmera indiscreta — numa das sequências, comportam-se como hienas em volta de uma pilha de dinheiro —, os pastores e bispos da Universal resolveram adotar a desfaçatez como antídoto aos efeitos causados pelas imagens que chocaram o Brasil, envergonhando a comunidade evangélica do país.

"MONTAGEM" — Macedo não nega a autenticidade das cenas. Ao público interno, porém, os pastores da Universal alegam que o vídeo foi montado. Macedo, porém, ressalta que os protagonistas eram jovens e imaturos na época. "Eu tinha até cabelo", ironizou o bispo. Filmadas há cerca de seis anos por Magno — que rompeu com a IURD em 1991 — as imagens mostram alguns líderes da igreja em momentos de lazer em Angra dos Reis (RJ) e num hotel de Israel, além de mostrá-los dançando em uma vigília ao ar livre. As cenas mais fortes mostram Macedo, de camiseta, ensinando táticas agressivas de arrecadação de dinheiro nas igrejas. Referindo-se aos frequentadores da Universal, Macedo brada na fita: "Se quiser ajudar, amém. Se não quiser, Deus vai mandar outra pessoa para ajudar, amém! Se quiser ajudar, amém; se não quiser, que se dane. Ou dá, ou desce!", concluiu.

"Poucas vezes a prática religiosa se afastou tanto da Bíblia para se aproximar tanto do Código Penal" Editorial do Jornal do Brasil (27.12.95)

Segundo as denúncias do pastor Carlos Magno, o bispo Macedo não é apenas bom de táticas de arrecadação. Magno apresentou fitas gravadas com telefonemas dados por Macedo, nos quais ele incentiva a mulher do pastor dissidente a abandoná-lo. Exatamente como ocorreu com o pastor corrupto Dom Mariel, interpretado por Edson Celulari, na polêmica minissérie Decadência, exibida em setembro do ano passado. A arte imitou a vida ou a Rede Globo já dispunha de informações sobre o telefonema de Macedo?

Em outro take, o bispo aparece rodeado por outros pastores após um culto na IURD de Nova York, contando uma pilha de dólares arrecadados. Focalizado pela câmera, Macedo sorri faz uma careta grotesca enquanto manipula o dinheiro. O mesmo cinismo que demonstraram na fita ao se referirem aos membros da igreja voltou a ser exibido na tentativa de justificar o injustificável. O líder máximo da IURD enche a boca ao afirmar que não tem motivo nenhum para retratação. "Pedir perdão por que? De uma coisa que não existe mais, brincadeiras que aconteceram há dez anos e que já foram lavadas com o sangue de Jesus?", indagou Macedo em tom arrogante, em entrevista dada à rádio FM 105, controlada pela igreja. Procurando minimizar as imagens explícitas, Edir Macedo invoca os vilões de praxe — a Globo e o diabo, os inimigos da Universal — em sua velha cantilena de perseguido pelo sistema, ao assegurar que não está envergonhado com as notícias "que estão saindo por aí". "Se tivemos algumas falhas", prossegue Macedo, "nós a tivemos diante de Deus, mas já está resolvido, este débito foi pago há muito tempo".

O bispo Edir Macedo, numa careta nada
sagrada, conta nos fundos da congregação
de Nova York os dólares que ensina seus
pastores a arrecadar nos cultos da igreja

O vídeo foi ostensivamente exibido pela Rede Globo em seus telejornais. Numa. aparente tentativa de liquidar a Universal, sua velha desafeta, a emissora da família Marinho cometeu alguns exageros, como dizer que os pastores dançavam ao som de um forró nordestino — na verdade, a música que os embalava era do Rebanhão, um conjunto evangélico. Além disso, o passeio de lancha e caiaque em Angra, assim como as brincadeiras na praia, representam momentos de descontração que seria de um rigor espartano censurar. Outra cena, interpretada pela Globo como em flagrante de promiscuidade mostra o bispo Honorilton Gonçalves (apresentador do programa 25a. Hora, exibido pela Rede Record) sendo acariciado por trás, ao mesmo tempo em que ameaça arriar as calças. Se não é promíscua, a cena é ao menos inadequada para um sacerdote.

AS CONSEQÜÊNCIAS — Além do horror da opinião pública, Macedo e seus comandados podem colher frutos mais amargos da exposição via satélite das vísceras da Universal. O procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, afirmou que o bispo poderá ser enquadrado por crime de estelionato e que a igreja sofrerá uma devassa jamais vista. O procurador Antonio Carlos Biscaia anunciou que iria solicitar ao Ministério Público uma investigação sobre as atividades da IURD. O corregedor-geral da Câmara dos Deputados, Beto Mansur, prometeu analisar o envolvimento de deputados com eventuais irregularidades cometidas pela igreja ou seus líderes. Um deles, Laprovita Vieira, aparece no vídeo sendo entrevistado pelo bispo Gonçalves, que em tom de brincadeira pergunta como o parlamentar adquiriu uma indústria em Duque de Caxias: "O seu Vieira, foi pelo Caixa Um ou pelo Caixa Dois?".

A Universal elegeu seis deputados federais em 1994, entre eles Laprovita — no segundo mandato — uma espécie de administrador dos negócios da igreja, agora ameaçado de ser cassado por falta de decoro. Além disso, a Secretaria da Receita Federal vai levantar informações sobre as declarações do imposto de renda de Edir Macedo, da cúpula da Universal e da Rede Record, de propriedade da igreja. Por outro lado, como consequência imediata das revelações da fita, vários membros da igreja estão dispostos a reaver os bens doados à IURD, inclusive através da Justiça.

PROFECIA — Entre os evangélicos, o episódio causou mal-estar, mas poucos líderes se manifestaram. O presidente da Associação Evangélica Brasileira (AEVB), reverendo Caio Fábio D'Araújo Filho, foi sucinto: "As cenas falam por si mesmas; é um espetáculo grotesco e deprimente; a fita mostra a violação de princípios cristãos e fere frontalmente o evangelho". O presidente da União das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil, pastor Paulo Leite, declarou-se "triste com o lamentável episódio". Ele diz que muitos evangélicos já esperavam por isso devido à ênfase dada pela Universal ao dinheiro, "sempre pedindo e pedindo".

O presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, reverendo Guilhermino Cunha, disse que vê com profunda perplexidade os acontecimentos que envolveram a Igreja Universal. Para ele, "os fatos falam por si e sofrerão os julgamentos de Deus e da opinião pública." Já o pastor Enéas Tognini, um dos líderes da Convenção Batista Nacional, afirmou que é preciso analisar melhor o fato, mas que não viu nada demais, alegando que "a fita já tem dez anos". O pastor Tubo Barros, presidente da Convenção Fraternal das Assembléias de Deus do Rio de Janeiro, preferiu o silêncio: "Não quero dizer nada, nem contra nem a favor".

Todos estes acontecimentos acabaram conferindo um tom profético ao pronunciamento da Associação Evangélica Brasileira, divulgado em setembro do ano passado, no qual a entidade criticava as práticas da Universal como sendo contrárias à legítima fé evangélica, além de constituírem objeto de frequentes constrangimentos e vergonha para o povo evangélico como um todo. A AEVB conseguiu, ao menos, isolar a Universal das outras igrejas evangélicas. O pastor Carlos Magno, estopim de todo o escândalo, afirmou à imprensa que tem ainda outras denúncias sobre a Igreja Universal do Reino de Deus, e que pretende apresentá-las à Polícia Federal. A crise está aberta.

* Colaboraram Adriane Lopes e Marcelo Dutra

Magno: 'Esquema PC favoreceu Macedo'


O pastor dissidente Carlos Magno promete
fazer novas e contundentes denúncias
contra o grupo de Macedo

A Igreja Universal contou com a participação do esquema PC de tráfico de influência na aquisição da Rede Record, em 1990. A revelação foi feita à revista VINDE pelo pastor Carlos Magno de Miranda, dissidente da igreja de Edir Macedo e principal estopim do escândalo trazido à tona em reportagem exclusiva da revista IstoÉ e, depois pela rede Globo. Segundo Carlos Magno, o ex-presidente Fernando Collor, afastado do poder por acusação de corrupção, em 1992, determinou a PC Farias que intercedesse pessoalmente junto aos antigos proprietários da Rede Record — Silvio Santos e Paulo Machado de Carvalho Filho — , para facilitar a aquisição daquela emissora pela IURD. O pagamento dos 45 milhões de dólares — preço da emissora — foi facilitado mediante a garantia, por parte de PC, de que Collor era sócio da Universal na transação. O empenho do presidente em beneficiar a Universal é justificável: Magno relatou que, durante a campanha eleitoral de 1989, o bispo Macedo fez um acordo com o então candidato Collor, pelo qual se comprometia a induzir o povo da Universal a votar no caçador de marajás em troca de favores do governo federal. Todo fiel da Universal lembra que, durante os cultos daquela época, Lula era chamado de diabo pelos pastores da igreja.

Em entrevista ao repórter Marcelo Dutra, Magno garantiu que não revelou o conteúdo das fitas anteriormente porque "não houve interesse da imprensa em divulgá-las". Ele assegurou ainda que a Rede Globo não lhe ofereceu nada em troca da divulgação da fita e que sua única motivação é "revelar a verdade". Em 1990, um inquérito foi aberto na Polícia Federal para apurar se Macedo era estelionatário, com base nas denúncias de Magno. Contudo, Magno alega que não pôde prosseguir devido a ameaças da cúpula da Universal dois dias antes da acareação. Desde então, Magno garante que "vinha aguardando o interesse de alguém" para retomar o assunto.



A hora da autocrítica

Por Ariovaldo Ramos

Grotesco, humilhante, vergonhoso! Foram expressões como estas que vieram aos lábios de muitos ao assistirem as cenas que a Rede Globo levou ao ar, no Jornal Nacional, sobre a IURD (Igreja Universal do Reino de Deus). É triste ver o Evangelho misturado com aquilo que vimos e ouvimos.

Diante desse quadro, creio que há algumas coisas que o povo evangélico deve esperar e instar para que aconteçam: primeiro, que a IURD venha a público explicar-se e/ou pedir perdão; segundo, que a IURD faça autocrítica, repense sua teologia e metodologia e mude; terceiro, que as acusações de envolvimento com o narcotráfico e sonegação sejam criteriosa e desapaixonadamente investigadas pelas autoridades competentes, de modo a estabelecer a verdade dos fatos.

Em contrapartida, há outras coisas a que o povo evangélico não pode assistir passivamente: primeiro, tentativas de pura perseguição religiosa, como a esboçada pelo vereador Miguel Colassuono (presidente da Câmara Municipal de São Paulo), ao declarar, segundo a Folha de São Paulo, que poderia emitir decretos que levassem ao fechamento dos templos da IURD e/ou cancelar a isenção do IPTU para os mesmos; segundo, a tentativa de alguns setores da mídia de julgar a IURD — como declarou a AEVB em seu manifesto, "a mídia não tem o direito de arbitrar sobre a fé de ninguém"; terceiro, a tentativa de enquadrar como crime de estelionato o fato de os pastores da IURD desafiarem os seus fiéis a demonstrar sua fé através das contribuições — apesar de não concordarmos nem com sua teologia nem com sua metolologia, temos que admitir que esta questão é teológica e não criminal. O Estado não tem competência para arbitrar sobre isto.

Finalmente, temos que, a exemplo do que vi o pastor Ary Velloso (Igreja Batista do Morumbi) fazer no domingo posterior à divulgação da fita de vídeo, orar pelos líderes da IURD e pelos seus fiéis: para que estes não percam a fé e aqueles tenham seus olhos abertos e vejam que pastor tem que ter postura e que a pregação e a contextualização têm limites teológicos e éticos. E assim, mudem para o bem da causa evangélica, para a saúde de seu povoe para a glória de Jesus.

Pastor Ariovaldo Ramos, formado em Teologia pela Faculdde, Metodista Livre, é diretor editorial de VINDE

Propaganda da revista em 1996.

Bad Flamengo, campeão às avessas

"Sou um bad técnico e só quero saber de bad boys no meu time. Atletas de Cristo no Flamengo, só fora do campo!"
(Washington Rodrigues, técnico do Bad Fla)

Por Alex Dias Ribeiro

Romário e Edmundo: bad boys tumultuaram o ambiente do Flamengo

Bad boys ele queria. Bad boys ele conseguiu. Bad relacionamentos e bad resultados. De repente, meu querido time de infância virou o maior antro dos malvados do futebol e dos vexames dentro e fora de campo. Um dia, cheguei em casa cansado e liguei a TV. Não pude acreditar no que vi: meu Flazão estava jogando certinho e goleando o Velez Sarsfield, campeão do mundo, em Uberlândia. Sentei na poltrona e curti de montão. Finalmente, o ataque dos sonhos parecia ter-se entrosado com o resto do time.

A noite tinha tudo para ser a delícia da nação rubronegra até que o bad boy Edmundo, o Animal, resolveu dar um tapinha na cara de um argentino. Pra quê? O cara era bad de verdade e devolveu um tapão e um socão na cara de Edmundo, que desmaiou na hora. De repente, baixou o espírito de Bruce Lee no bad amigo Romário. O baixinho virou ninja e aplicou uma voadora de filme de kung-fu no pescoço do argentino machão. Aí o pau quebrou geral. Enquanto todo o mundo trocava sopapos em campo, Edmundo se fingia de morto ou talvez estivesse mesmo morto de medo de apanhar mais. Empolgado com a atuação de seus bad pupilos, o bad técnico saiu de campo cantando de galo: "Se fosse preciso, nós baixaríamos o pau a noite inteira!"

QUEM PLANTA VENTO COLHE TEMPESTADE Morto de inveja da influência positiva dos Atletas de Cristo no futebol brasileiro, o Supertraira resolveu bagunçar o coreto do esporte, invertendo todos os valores e conceitos de certo e errado, bem e mal, vitória e derrota.

Começou pela imprensa, enchendo a bola dos bad boys e criando um novo tipo de herói: o herói vilão ou anti-herói. Já que o negócio agora é ser malvado, a torcida respondeu fazendo a sua parte, com grandes quebra-paus e 17 mortos em dois anos.

O próximo passo foi montar o bati time, justamente o maior time de massa do país, só para provar que o crime compensa. Socos e pontapés no vestiário, encrencas dentro e fora de campo, indisciplina, mau comportamento e péssimos resultados.

O bad Flamengo é a inversão total de tudo o que você possa imaginar. O Supertraira fez um trabalho tão bem feito, que conseguiu transformar o time dos sonhos no pior time do Brasil! O povo já anda dizendo que a diferença entre o bad Fla e o salário mínimo é que, com o mínimo, você ganha, ganha e não compra nada. O bad Fla compra, compra e não ganha nada.

PREJUÍZOS - Depois de rir um bocado da piada acima, caí na real, engatei uma primeira no meu cérebro e comecei a pensar na ridícula situação: Romário e Edmundo pegaram um gancho de dois jogos. O bad Flamengo obteve apenas duas vitórias em dez jogos. E eu, torcedor do Flamengo, estou rindo de quê? Saquei que, se a coisa continuar assim, o Supertraira ainda vai acabar convencendo a todo mundo de que perder é muito melhor do que vencer, assim como ele já convenceu a muitos de que ser mau é melhor do que ser bom, que a morte é melhor do que a vida e o inferno, melhor do que o céu. Quando o Rei justo reinar sobre a terra, a mídia não mais chamará o mal de bem e o bem de mal, as trevas de luz e a luz de trevas, o amargo de doce e o doce de amargo. E muito menos se dirá que um sem-vergonha é uma pessoa de valor, nem que o malandro merece respeito (Isaías 5:15 e 32:5, na Bíblia na linguagem de hoje).

Nós, que jogamos no time de Cristo, somos os representantes do Rei Jesus e temos que exercer nosso dom de discernimento todos os dias, para não nos deixarmos enganar pelos valores trocados deste mundo. Não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação das vossas mentes, para que experimenteis a boa e perfeita vontade de Deus (Romanos 12:2).



Alex Dias Ribeiro é diretor executivo nacional dos Atletas de Cristo.

Revista Vinde - Edição 3

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