sexta-feira, 1 de março de 1996

Real vale mais que dólar?

Por Emilio Gargalo


Renato BittencourVArtware

O brasileiro vive uma situação curiosa e inédita ao ver que um dólar vale menos do que um real, esta moeda mágica, e pergunta-se como isto é possível, durável, razoável. Claro que é! Mas, veja bem, isto não significa que o real seja mais forte do que o dólar. Da mesma forma, com um único peso argentino pode-se comprar 1,5 mil libras italianas, sem que isto signifique que a moeda de nosso vizinho seja mais forte que a moeda do país de Pavarotti.

Vamos por partes (à moda de Jack, o estripadar): lembre-se de que um real é a nova versão dos antigos 2.750 cruzeiros reais. Que, por sua vez, já eram uma versão melhorada de 2.750.000 cruzeiros. Ou, 2.750.000.000 de cruzados. E assim sucessivamente. Ou seja, fizemos várias cirurgias plásticas na moeda nacional ao longo dos anos, mudando a forma de representá-la. O grande mérito do real está no fato de não se ter deteriorado ao longo do tempo, isto é, não perdeu valor em relação às outras moedas e, principalmente, manteve seu poder de compra dentro do Brasil. Isso porque o governo vem controlando a emissão de moeda e mantendo sob controle os seus próprios gastos. Emitir dinheiro sem controle faz com que ele perca o valor.

Quando alguém, brasileiro ou estrangeiro, troca seus dólares, seus ienes, seus pesos etc. por reais, não o faz porque um dólar corresponde a noventa e sete centavos de real. Faz porque gosta da rentabilidade do real, garantida pelos juros altos, e porque aposta na sua estabilidade, pelo menos a médio prazo.

Por isso, não se assuste se a relação vier a se inverter, isto é, se um dólar passar a comprar mais do que um real. O Brasil não tem um compromisso forte da relação um por um como, por exemplo, a Argentina, que fixou em lei esta paridade. O real poderá ser lentamente desvalorizado, se isto for necessário para manter nossas exportações. O investidor se assusta, na verdade, quando uma moeda se deteriora muito rapidamente, como acontecia com nossos cruzeiros e cruzados, ou se a rentabilidade for muito baixa, ou ainda se as reservas do pais forem baixas, indicando que ele pode vir a não receber o dinheiro investido.

Só para completar a história, já que citamos a Argentina, lembre-se de que na Ultima cirurgia da moeda feita por lá, quando transformaram os austrais em pesos, o valor da moeda foi dividido por 10 mil. Mas, diferentemente do Brasil, a paridade é um peso para um dólar. E é lei.


Emílio Gargalo é bacharel em Economia pela PUC-SP e sócio-diretor da MCM Consultores Associados S. C. Ltda.


Extraído Moeda e Mercado. Revista Vinde, Rio de Janeiro, ano 1996, a. 1, ed. 5, p. 24, mar. 1996.

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